O governo de Israel formalizou nesta quinta-feira, 27, o acordo para exploração de gás em parceria com o Líbano no Mediterrâneo e sinalizou a restauração das relações militares com o governo da Turquia. Os movimentos ocorrem às vésperas de uma nova eleição em Israel, na qual o ex-premiê Binyamin Netanyahu, que é opositor ao acordo com Beirute, lidera as pesquisas.

Líbano e Israel assinaram cópias do acordo de fronteira marítima mediado pelos Estados Unidos e as entregaram à ONU na cidade costeira de Naqoura, no sul do Líbano. As assinaturas ocorrem após meses de negociações indiretas mediadas por Amos Hochstein, o enviado dos EUA para assuntos de energia, e marca um grande avanço nas relações entre as duas nações, que estão formalmente em guerra desde a criação de Israel em 1948.

Ambos os países reivindicam cerca de 860 km² do Mar Mediterrâneo que abrigam campos de gás natural. O Líbano espera que a demarcação das fronteiras marítimas abra caminho para a exploração de gás para ajudar a tirá-lo de sua crise econômica, que mergulhou três quartos de sua população na pobreza. Israel espera que o acordo reduza o risco de guerra com o grupo militante libanês Hezbollah, apoiado pelo Irã.

O acordo foi assinado pelo premiê israelense, Yair Lapid, que caminha para o fim do seu mandato, e pelo presidente libanês, Michel Aoun. Os documentos preveem deixar sob controle de Israel o campo de Karish e conceder ao Líbano o campo de gás de Qana, mais ao nordeste. Uma parte desta última reserva ultrapassará, no entanto, a linha de fronteira entre os dois países e, desta maneira, Israel ficará com parte do lucro de exploração, segundo o acordo.

O primeiro-ministro israelense disse que o acordo é um reconhecimento, de fato, de Israel por parte do Líbano. Já o presidente Aoun, aliado do Hezbollah, ressaltou que o texto não tem qualquer dimensão política.

“Esta é uma conquista política. Não é todo o dia que um Estado inimigo reconhece o Estado de Israel em um acordo escrito, e isto acontece diante de toda comunidade internacional”, celebrou Lapid. Em um tuíte, o presidente Aoun respondeu que se trata de um acordo puramente técnico, sem qualquer dimensão política, ou “consequências que contradigam a política externa do Líbano”.

O Líbano não quer que sua delegação tenha qualquer contato oficial com a de Israel, por isso exigiu a realização da cerimônia em duas salas separadas.

Como resultado prático, o chefe do Hezbollah libanês, Hassan Nasrallah, anunciou hoje o fim da mobilização militar excepcional do grupo contra Israel. Nasrallah, que chegou a afirmar que atacaria Israel em caso de exploração do campo de gás de Karish sem um acordo prévio, afirmou que o tratado limítrofe representa uma grande vitória para o Líbano. “Nossa missão está concluída”, disse ele, acrescentando que o acordo “não é um tratado internacional nem um reconhecimento de Israel”.

O presidente dos EUA, Joe Biden, em uma declaração publicada nesta quinta, disse que o acordo atende aos interesses do Líbano e de Israel. “Este acordo nos leva um passo mais perto de realizar uma visão para um Oriente Médio mais seguro, integrado e próspero, trazendo benefícios para todos os povos da região”, diz o comunicado.

As tensões aumentaram brevemente entre o Líbano e Israel no verão passado, depois que Israel começou a perfurar o campo de gás Karish enquanto as negociações aconteciam. Antes do acordo, o Líbano considerava a área disputada, enquanto Israel disse que fazia parte de sua zona econômica exclusiva reconhecida pela ONU.

No mesmo dia, o ministro da Defesa de Israel, Benny Gantz, sinalizou uma possível retomada dos laços de defesa com a Turquia, enquanto os dois países buscam normalizar seu relacionamento. Gantz disse, após uma reunião com seu colega turco Hulusi Akar na capital turca Ancara, que instruiu sua equipe a iniciar os procedimentos necessários para retomar as relações de trabalho.

“Não é segredo que nossos laços enfrentaram desafios”, disse Gantz, que se tornou o primeiro alto oficial de defesa de seu país a visitar a Turquia em mais de uma década. “Avançando, devemos adotar uma abordagem estável e positiva em nossas relações – mantendo um diálogo aberto”, disse ele.

Turquia e Israel já foram aliados regionais próximos com amplos laços de defesa, mas o relacionamento tornou-se cada vez mais tenso sob o governo do presidente turco Recep Tayyip Erdogan. O líder turco tem sido um crítico aberto das políticas de Israel em relação aos palestinos, enquanto Israel se opõe aos laços da Turquia com o grupo militante palestino Hamas, que governa a Faixa de Gaza.

As relações se romperam em 2010, depois que as forças israelenses invadiram uma frota com destino a Gaza que transportava ajuda humanitária para palestinos que romperam um bloqueio israelense. O incidente resultou na morte de nove ativistas turcos, e os países retiraram seus respectivos embaixadores.

Após uma tentativa de consertar os laços, a Turquia chamou novamente seu embaixador em 2018, depois que os Estados Unidos transferiram sua embaixada em Israel para Jerusalém. As relações começaram a derreter após a saída do ex-primeiro-ministro israelense Binyamin Netanyahu.

O presidente israelense Isaac Herzog fez uma visita de Estado à Turquia em março, seguido pelo primeiro-ministro Yair Lapid – que era ministro das Relações Exteriores na época – em junho. No mês passado, Erdogan e Lapid se encontraram à margem da Assembleia Geral da ONU em Nova York. A Turquia e Israel concordaram recentemente em renomear seus respectivos embaixadores.

Turquia e Israel já foram parceiros de defesa próximos. Os pactos de defesa assinados em meados da década de 1990 permitiram que os pilotos da força aérea israelense treinassem no espaço aéreo da Turquia. Israel atualizou tanques e jatos militares turcos e forneceu drones e outros equipamentos de alta tecnologia. Os países ainda compartilham vários interesses estratégicos, incluindo conter o Irã.

Eleições em Israel

Os acordos de fronteira e a reaproximação com a Turquia ocorrem a poucos dias das eleições para o Knesset, o Parlamento israelense, que opõe o atual premiê com o ex-líder Netanyahu. Esse será o quinto pleito de Israel em três anos.

As votações de 1º de novembro podem trazer de volta “Bibi” Netanyahu, depois que uma enorme coalizão com direita, esquerda, centro e partidos árabes foi formada na eleição anterior para tirá-lo do poder.

Netanyahu, que assumiu o papel de líder da oposição após a derrota, é contrário ao acordo com o Líbano e defendia que a proposta teria que ser voltada pelo Parlamento ou em referendo. Mas este mês o Supremo Tribunal do país rejeitou as apelações de apoio parlamentar, abrindo caminho para a assinatura do acordo.

As últimas pesquisas apontam a vantagem do Likud de Netanyahu com 31 das 120 cadeiras no Knesset, contra 24 para o Yesh Atid, do atual primeiro-ministro Lapid, e 14 para o Sionismo Religioso (extrema direita) de Itamar Ben Gvir e Bezalel Smotrich, algo inédito.

Desde o início da campanha, Netanyahu afirmou que queria reunir os 61 assentos (mínimo para maioria) para formar um “governo de direita” que agrupasse os votos das formações ultraortodoxas e da extrema direita. Com esses partidos, o Likud estaria perto de alcançar a maioria, segundo as pesquisas. (COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS)