DIREITO E POLÍTICA
Mais realista do que o Rei
*Carlos Augusto Vieira da Costa
No dia 3 de novembro último foi publicada decisão da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal que declarou ser crime dirigir com concentração de álcool igual ou superior a 6 decigramas por litro de ar expelido pelos pulmões. Trata-se, é bem verdade, de uma decisão individual, que vale apenas para as partes envolvidas no processo, e não condiciona as demais instâncias judiciais. O Governo Federal, porém, acabou de selar acordo com as oposições no legislativo para aprovar projeto de lei que prevê expressamente a criminalização do ato de dirigir embriagado, a fim de não dar mais margem a divergências de interpretação. O projeto de lei prevê inclusive a utilização de prova testemunhal e indiciária, tais como hálito etílico, olhos vermelhos e equilíbrio trôpego, para aqueles que se recusarem a fazer o teste do bafômetro. A intenção do Estado parece ser nobre. Afinal, são mais de 40 mil mortes por ano causadas por acidentes de trânsito, em grande parte provocadas por motoristas alcoolizados, sem contar o número de feridos com mutilações ou lesões permanentes. Some-se aos efeitos desta tragédia as conseqüências econômicas e financeiras, representadas pela carga sobre o SUS e a Previdência Social, com o pagamento de pensões e aposentadorias por invalidez. Portanto, não dá para simplesmente embarcar no velho discurso liberal e sair em defesa das liberdades individuais, pois ignorar as estatísticas neste caso seria mais do que leviandade. A questão, entretanto, parece estar na evidente falta de legitimidade do Estado brasileiro de pretender punir cidadãos de bem pelo simples ato de tomarem 3 ou 4 chopinhos inocentes, enquanto gente muito mais nefasta, que saqueia rotineiramente o erário em bilhões por ano, segue livre e fagueira, e não é presa nem com certidão de culpa reconhecida em cartório. Além disto, a medida (tolerância zero) representa uma total desconsideração de uma velha tradição bastante arraigada em nossa cultura popular, do chopinho amigo do final do expediente, que embala a formação de laços afetivos e representa uma reconhecida forma de descompressão emocional. Assim, por mais que seja verdade que o melhor e não dirigir depois de beber, há que se ter alguma tolerância do Estado com o livre arbítrio, até porque há uma diferença evidente entre cidadãos responsáveis e criminosos eventuais que enchem a cara. Portanto, não dá para o governo ser mais realista do que o rei, até porque o brasileiro é cordial, mas cinismo tem limite.
Carlos Augusto Vieira da Costa Procurador do Município de Curitiba
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Salário complessivo *Roberto Victor Pereira Ribeiro
Hodiernamente, não são poucos os que aceitam trabalhar em condições inferiores àquelas asseguradas pela nossa Constituição Federal. Existem inúmeros relatos de pessoas que laboram em empresas sem que nunca tenha sido formalizada a assinatura de sua carteira de trabalho e previdência social – CTPS. Com esta falha, o empregado é lesado frontalmente em direitos e garantias funcionais tão bem zeladas pela Constituição e pela Consolidação das Leis do Trabalho. O assunto-chave desse artigo é esclarecer à sociedade o que vem a ser o termo: Salário Complessivo. Pois bem, salário complessivo é aquele pagamento efetuado pelo empregador sem discriminar as parcelas que o obreiro faz jus. Exemplo: o cidadão recebe “x” de horas extras, “y” de adicional noturno, “z” de salário e “w” de gratificação por atividade, entretanto quando o mesmo recebe o pagamento, não obtém a contraprestação do empregador em discriminar um a um os direitos que estão sendo pagos pela a atividade exercida. Em suma, por fim, o trabalhador receber a quantia “x”, que é o total, sem saber as parcelas de cada direito. Assim, muitos empregados não possuem controle se seus direitos estão sendo respeitados. Por exemplo, se ele fez durante o mês 10 horas extras, não terá como saber se realmente recebeu por esse trabalho extraordinário. Se por um lado isso é prejudicial ao empregado, entendemos que também é para o empregador que além de cometer um ilícito trabalhista, fica totalmente vulnerável para provar que pagou com correção todos os serviços que lhe foram prestados com os direitos garantidos. Quando não se firma um recibo com discriminações de parcelas, fica temerária a defesa do empregador na Justiça do Trabalho. Destarte, chamamos a atenção para empregadores e empregados para não cair no conto do “salário complessivo”, pois não há benefício algum para nenhuma das duas partes. Ademais, o Tribunal Superior do Trabalho se posicionou na súmula 91 com a seguinte redação: “Cláusula Contratual – Salário Complessivo – Direitos Legais ou Contratuais – Nula é a cláusula contratual que fixa determinada importância ou percentagem para atender englobadamente vários direitos legais ou contratuais do trabalhador. E ainda no precedente normativo 93: “Dissídio coletivo. Salário. O pagamento do salário será feito mediante recibo, fornecendo-se cópia ao empregado, com a identificação da empresa, e do qual constarão a remuneração, com a discriminação das parcelas, a quantia líquida paga, os dias trabalhados ou o total da produção, as horas extras e os descontos efetuados”.
* O autor é advogado do Ribeiro Advocacia & Advogados Associados e escritor da Academia Brasileira de Direito
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A CONDUTA E O DIREITO PENAL
HC para discutir suspenção de habilitação * Jônatas Pirkiel
Recente decisão do Superior Tribunal de Justiça, amplia a previsão constitucional do Habeas Corpus, até então remeti heróico cpa coibir abuso contra a liberdade de locomoção. Agora pode também ser usado para discutir a suspensão da habilitação, quando se trata de questionar aspectos relativos à pena de suspensão ao direito de dirigir. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) entende que, “…se a imposição se deu cumulativamente com pena privativa de liberdade, é cabível. A Sexta Turma julgou habeas corpus impetrado em favor de motorista responsável pela morte de duas crianças. Segundo o processo, ele trafegava em alta velocidade, avançou o sinal vermelho e atropelou as crianças sobre faixa de pedestre. Em primeiro grau, o motorista foi condenado à pena de três anos e quatro meses de detenção, em regime inicial aberto, substituída por duas restritivas de direitos. O motorista teve o direito de dirigir suspenso por um ano – pela prática de homicídio culposo (sem intenção de matar) na direção de veículo automotor – e sua pena aumentada em um quarto – em razão de o crime ter sido cometido sobre a faixa de pedestre e por duas vezes (concurso formal). Ao considerar o fato de que as vítimas eram duas crianças, o juiz aplicou em sua decisão a agravante de pena estabelecida no artigo 61, inciso II, alínea h, do Código Penal, que se refere ao crime cometido contra criança, maior de 60 anos, enfermo ou mulher grávida. Levada a questão ao O Tribunal de Justiça do Paraná, este deu parcial provimento à apelação para excluir a agravante de crime cometido contra criança, por considerar que a agravante aplicada pelo juiz não é cabível em casos de crimes sem intenção de matar. “…No habeas corpus impetrado no STJ, a defesa alegou ilegalidade na majoração da pena em um quarto, pelo concurso formal, considerando que deveria ser fixada em um sexto. Disse, ainda, que o tempo de suspensão do direito de dirigir deveria ser proporcional ao tempo da pena privativa de liberdade. Por fim, a defesa pediu a anulação da decisão do tribunal estadual ou o ajuste da pena aplicada. O ministro Sebastião Reis Júnior, relator do habeas corpus, observou o entendimento pacificado no STJ no sentido de que o acréscimo decorrente do concurso formal deve levar em consideração o número de crimes cometidos. O ministro considerou que, sendo dois crimes praticados em concurso, a majoração da pena em um quarto foi exagerada. Com isso, decidiu reduzir o aumento da pena à fração de um sexto, ficando em três anos, um mês e dez dias de detenção…” Para a felicidade da defesa do impetrante, “…o relator constatou em precedentes da Corte que o habeas corpus é apto para questionar a suspensão da habilitação, desde que aplicada cumulativamente com a pena privativa de liberdade e desde que ambas as penalidades sejam proporcionais. Apesar de admitir o habeas corpus para essa finalidade, o ministro manteve o que foi decidido em primeiro e em segundo grau quanto à fixação da suspensão da habilitação por um ano. “Entendo que a fixação da pena de suspensão da habilitação pelo período de um ano está devidamente fundamentada, pois a prática delitiva gerou duas vítimas fatais, bem como é proporcional à duração da pena privativa de liberdade estabelecida”, afirmou Reis…” São as curiosidades do nosso Superior Tribunal de Justiça!
* O autor é advogado na área criminal (jonataspirkiel@terra.com.br)
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ESPAÇO LIVRE A nova realidade digital
* Marcelo Augusto de Araújo Campelo
O mundo está mudando. Com a realidade virtual, existirá outra esfera das vidas na web, a intimidade diminuiu ou acabou. As recentes invasões aos sites ou portais da Sony e da Nintendo comprovam quanto estão frágeis os sistemas e os dados de todos, sendo que nestes estão dados econômicos. E quando se menciona invasão a sites governamentais, que dados estão sendo procurados? E quando há o cruzamento dos dados dos sites como a Sony e a Receita Federal? Para aqueles que temem pode ser alvo de chantagem. Será? Para aqueles que acreditam que apenas os portadores de cartão de crédito internacional seriam prejudicados com os crimes virtuais, ledo engano, pois basta se cadastrar em qualquer site ou loja que possua um serviço virtual propiciador de um canal de invasão que os dados de qualquer um podem estar expostos ao mundo inteiro. Recentemente, foram invadidos os sites governamentais do Brasil. Presidência da República, Receita Federal e Petrobras. Semana passada ficou fora do ar o site do IBGE e mensagens contra a Presidente da República e o Prefeito de São Paulo foram publicadas. Todas as invasões acima foram noticiadas, e quantas outras não foram? Será que existe esta possibilidade? Provavelmente sim, pois as consequências são muito graves para que o grande público saiba sem ser convidado, quando já foram prejudicados. As relações estão mudando e os operadores do direito terão que se adaptar rapidamente à nova realidade, pois complexas questões jurídicas advirão desta nova problemática. Os crimes virtuais são investigados de maneira diversa à tradicional. Quebras de sigilos terão que ser solicitadas à justiça no início da investigação e esta terá que o fazer de forma justificada e segura para que não se viole os direitos constitucionais individuais tão arduamente conseguidos e consagrados no sistema constitucional brasileiro. Ainda, a garantia de um processo terá que ser respeitada, mesmo que na fase inquisitorial, dentro dos parâmetros da ampla defesa, para impossibilitar uma nulidade posterior, que culminaria em impunidade para a sociedade. Geralmente, empresas são responsáveis pelo controle, guarda e disponibilidade dos bancos de dados. Como se dá a responsabilidade pela invasão? Quem repara os prejudicados? A cadeia de danos seria quase que imensurável, pois no caso da Sony em que números de cartões de crédito foram amealhados e utilizados em fraudes, a mensuração e reparação são complexas e os contratos de prestação de serviços de guarda de dados devem prever tais responsabilidades. No caso de sites governamentais, o site da Receita Federal seria o mais preocupante em termos de dados, posto que nem os servidores podem ter acesso sem autorização sob pena de processo administrativo, pode-se imaginar dados de profundo sigilo em poder de cyberpiratas mal intencionados. Uma revolução está acontecendo silenciosamente e todos devem estar preparados para se defender, pois além de uma nova forma de problemas haverá uma nova forma de tratativa pelo judiciário, Ministério Público e demais operadores do direito.
* O autor é graduado em Direito pela PUC, pós-graduado em direito público pelo IBEJ, especialista em direito do trabalho e processual do trabalho pela LEX, e pós-graduado em direito tributário e processual tributário pela Unicenp.
* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * DOUTRINA “Pode haver também a inversão do ônus financeiro da prova, entendido como o custeio da produção da prova, o qual não se identifica com o ônus da prova. Pode ocorrer que o ônus de provar determinado fato aferido por meio de prova técnica recaia sobre uma parte, que tenha insuficiência financeira para subsidiar seus custos. O juiz, sempre em busca da melhor instrução possível para a formação do seu conhecimento, pode determinar que a prova seja produzida à custa da outra parte. Ou seja, o ônus da prova continua sendo da parte economicamente insuficiente, havendo a inversão do ônus financeiro da produção da prova”. Trecho do livro Coisa Julgada Coletiva, de Camilo Zufelato, coordenado por Cássio Scarpinela Bueno, página 348. São Paulo: Saraiva, 2011.
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TÁ NA LEI Lei n. 12.403, de 4 de maio de 2011 Art. 323. Não será concedida fiança: I – nos crimes de racismo; II – nos crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e nos definidos como crimes hediondos; III – nos crimes cometidos por grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático; IV – (revogado); V – (revogado).” (NR) Art. 324. Não será, igualmente, concedida fiança: I – aos que, no mesmo processo, tiverem quebrado fiança anteriormente concedida ou infringido, sem motivo justo, qualquer das obrigações a que se referem os arts. 327 e 328 deste Código; II – em caso de prisão civil ou militar; III – (revogado); IV – quando presentes os motivos que autorizam a decretação da prisão preventiva (art. 312). Esta Lei alterou o CPP na parte relativa à prisão processual, fiança, liberdade provisória e demais medidas cautelares.
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PAINEL JURÍDICO
Gratificação A ministra Cármen Lúcia, do STF, concedeu liminar para suspender decisão do Conselho Nacional do Ministério Público que impedia o pagamento de gratificação aos procuradores de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. A ministra enfatizou que “a natureza estritamente administrativa do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público não os autoriza a exercer o controle de constitucionalidade de leis”.
Vínculo Um Banco teve que reconhecer um trabalhador terceirizado como seu empregado efetivo, pois ele exercia, sob subordinação direta da instituição bancária, as mesmas funções desempenhadas por outros funcionários. A decisão é da 6ª Turma do TST.
Maconha O Plenário do STF confirmou a decisão que libera Marcha da Maconha – reunião de pessoas favoráveis à descriminalização da droga. Para o STF, os direitos constitucionais de reunião e de livre expressão do pensamento garantem as manifestações.
Sabbath Uma liminar da 3ª Vara Federal em Bauru garantiu a um aluno adventista o direito de não ter aulas aos sábados.
Direito Imobiliário Angelo Volpi Neto e Maicon Guedes serão os coordenadores do curso de Pós-graduação em Direito Imobiliário na Universidade Positivo. Voltado para advogados, bacharéis em Direito, funcionários de serviços notariais e registrais, executivos de construtoras e demais profissionais do ramo imobiliário, o curso terá carga horária de 420 h, com aulas nas segundas e quartas-feiras, das 19h às 22h30 min ou nos Sábados, das 8h30min às 12h e das 13h30min às 17h. Informações pelo fone (41) 3317-3093 e pelo e-mail pos-graduacao @up.com.br
Bipolar A 3ª Turma do TRF da 4ª Região determinou que o SUS forneça medicamento a um paciente do Paraná que é portador de transtorno bipolar.
“Inacreditável” A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) emitiu nota de repúdio à proposta defendida pela corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, de que os magistrados devem ter férias de 30 dias e não de 60. Para a entidade, a posição da corregedora a respeito das férias é “inacreditável”.
Incompatível As atividades exercidas por assessores jurídicos do MP não são compatíveis incompatíveis com o exercício da advocacia. O entendimento é da 1ª Turma do STJ.
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DIREITO SUMULAR Súmula n. 707 do STF — Constitui nulidade a falta de intimação do denunciado para oferecer contra-razões ao recurso interposto da rejeição da denúncia, não a suprindo a nomeação do defensor dativo.
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LIVROS DA SEMANA
A obra faz aprofundada análise sobre o mandado de segurança (regido agora pela Lei n. 12.016/2009), fornecendo ao leitor bases teóricas e práticas sobre o tema, bem como comentários aos artigos do novo texto legislativo e a mais recente jurisprudência disponível, além de apresentar o PLS n. 222/2010, futuro desdobramento deste que é um dos mais requisitados institutos jurídicos do direito processual civil nacional.
Gregório Assagra de Almeida, Mirna Cianci e Rita Quartieri — Mandado de Segurança — Editora Saraiva, São Paulo 2011
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COORDENAÇÃO: RONEY RODRIGUES PEREIRA roney@jornaldoestado.com.br
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