DIREITO E POLÍTICA
Enquanto há vida, há esperança
*Carlos Augusto Vieira da Costa Na quinta-feira passada a Justiça do estado de São Paulo condenou Pedro Henrique Torrecillas, Rui Noronha Sacramento e Mariano Fiore Junior à pena de 17 anos e seis meses de reclusão pelo assassinato de 4 pessoas. Num país com mais de 40.000 homicídios por ano, não seria nada extraordinário, não fosse pelo fato dos 3 condenados serem médicos e terem provocado a morte de seus pacientes no centro cirúrgico do hospital da Faculdade de Medicina de Taubaté, depois de retirar os rins das vítimas para transplantes privados, a um custo de R$ 35.000,00 por órgão. Duas semanas atrás a Polícia Federal desbaratou um esquema de importação de material hospitalar potencialmente contaminado (roupas de cama), que era comercializado no mercado varejista de Alagoas e Pernambuco. Há ainda a suspeita de que parte deste material também tenha sido utilizado na confecção de roupas e vendido para outros estados da federação. Tecnicamente trata-se de lixo hospitalar, cuja destinação deveria ser os aterros sanitários especializados na destruição das peças, pelos riscos que representam para a saúde. Que tipo de paralelo poderíamos estabelecer entre estes dois casos e a corrupção clássica que dissemina em nosso meio político? Agentes públicos corruptos, juntamente com seus corruptores, quando agem, lesam o erário público, e apenas por via indireta atingem a sociedade, a partir dos efeitos negativos que a ausência dos recurso surrupiados provocam sobre a população. Já os médicos de Taubaté e os importadores das Alagoas agem com mais perversidade, pois suas ações têm um efeito direto sobre suas vítimas, seja provocando sua morte, seja expondo a riscos de contaminação hospitalar, com o agravante de que se utilizam da confiança alheia para perpetrar seus crimes. Ou seja, trata-se de um desvio de conduta ainda mais grave que a corrupção. Há muito tempo, mais precisamente 195 anos antes de Cristo, um intelectual romano chamado Publio Terêncio cunhou a frase: sou um homem, e nada do que é humano de causa estranheza. E esta deve ser a pedra de toque de qualquer política de combate à corrupção, ou seja, a percepção de que a maldade e o oportunismo são características que estão gravadas no DNA do ser humano, e por isso irão necessariamente se manifestar em um percentual de indivíduos. Portanto, não faz mais sentido a preservação da idéia ingênua de que apenas românticas manifestações coletivas de reprovação social serão capazes de dissuadir a escrotidão. Volto aqui ao ponto final da crônica passada: quem tem que ser colocado contra a parede são os agentes do Estado responsáveis por coibir a corrupção, e não os corruptos, pois estes, mesmo sem saber, estão moralmente justificados pela sua condição humana. E para aqueles que já desanimaram, vale lembrar outra famosa frase de Terêncio: enquanto há vida, há esperança.
* Carlos Augusto Vieira da Costa Procurador do Município de Curitiba
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Exigência abusiva *Roberto Victor Pereira Ribeiro
A Constituição Federal da República Federativa do Brasil celebrada em 1988 traz em seus dispositivos 37 a 41 os requisitos exigidos para que o cidadão brasileiro submeta-se a concursos públicos e, por fim, garantir a tão sonhada estabilidade. São requisitos obrigatórios em todos os certames públicos que disponibilizam vaga em cargo, função ou emprego público, são eles: nacionalidade brasileira, direitos políticos em exercício regular, estar em dia com as obrigações eleitorais e militares (no caso dos homens), escolaridade de acordo com o cargo pleiteado, idade mínima de 18 (essa idade pode ser relativizada sendo o mínimo exigido de 16 anos) e, em alguns casos, por conta do exercício do cargo poderá haver limite máximo, como exemplo a idade de 30 anos para se submeter a concursos para soldado da Polícia Militar, ser apto psicologicamente e fisicamente. Ocorre que de uns tempos para cá, alguns editais trazem novos requisitos, sendo alguns deles considerados ilegais e abusivos, conforme trataremos neste artigo. Em determinados editais (regras do concurso) há a exigência de que o candidato não tenha seu nome inserido nos cadastros de proteção ao crédito, sob pena de não tomar posse, caso venha a ser aprovado por meio do concurso. Exigem, para tanto, que o candidato anexe ao formulário de inscrição definitiva uma certidão negativa de débitos. Essa prática lesa frontalmente os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, igualdade e, analisando atentamente, também o princípio da presunção de inocência. Como bem expressou a colega Gislaine Barbosa Não compete ao Poder Público na admissão de um candidato questionar critérios referentes à dívida, pois existem ações apropriadas para isto, sendo que muitas vezes os nomes das pessoas são negativados por erro, desleixo, ensejando diversas ações de danos morais contra a prática abusiva. Por isso, é bom asseverar que nem toda informação que alega negativização no nome do candidato é fidedignamente verdadeira. Mesmo que haja a comprovação da legitimidade da inserção do nome em cadastros desse porte, não afasta a presunção de inocência do candidato, uma vez que ele pode encontrar-se discutindo esse débito nas vias judiciais e, por fim, sair vitorioso, conseguindo provar que a cobrança era indevida. Destarte, você, candidato, que se sente lesado com tal prática procure imediatamente um advogado ou a Defensoria Pública para que seu direito seja zelado e protegido.
* O autor é advogado do Ribeiro Advocacia & Advogados Associados e escritor da Academia Brasileira de Direito
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A CONDUTA E O DIREITO PENAL
Começam os trabalhos de reforma do Código Penal * Jônatas Pirkiel
No último dia 18, foi instalado no Sendo Federal a Comissão de Juristas que irá discutir e apresentar o projeto de reforma do Código Penal. Código de 1.940 que vem sendo, ao longo dos tempos, emendado, e que agora terá uma nova redação. Presidirá a Comissão o Ministro do STJ, Gilson Dipp, que terá a participação da também Ministra Maria Thereza de Assis Moura. O Paraná estará representado pela participação do professor René Ariel Dotti, cuja Comissão terá a presença de vários outros especialistas do Direito Penal, dentre eles: Antonio Nabor Areias Bulhões, Emanuel Messias de Oliveira Cacho, Gamil Föppel El Hireche, José Muiños Piñeiro Filho (desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro), Juliana Garcia Belloque, Luiza Nagib Eluf, Marcelo André de Azevedo, Marcelo Leal Lima Oliveira, Marcelo Leonardo, Técio Lins e Silva e Luiz Carlos Gonçalves, que será o relator. Segundo Gilson Dipp: Quanto mais os tipos penais estiveram no código, e menos nas leis especiais, mais fácil será aplicar as penas e construir uma sociedade mais justa. Entende o ministro que haverá uma tendência de valorização das penas alternativas e de retirada de condutas que atualmente não são mais penalmente relevantes e que podem ser tratadas com penalidades administrativas, civis e tributárias. Temos que selecionar quais os bens jurídicos que merecem a efetiva proteção do direito penal e vamos discutir tudo o que for necessário, sem qualquer ranço de preconceito ou de algo premeditado. A comissão terá 180 dias para concluir a minuta do projeto de lei, prazo que poderá ser prorrogado. O que a sociedade espera é que a reforma do código, na esteira das medidas já discutidas e propostas pelo Conselho Nacional de Justiça, seja moderno, humanizado, eficiente e que seus conceitos estejam dentro da realidade da sociedade brasileira, com suas particularidades e tradições sócio-culturais.
* O autor é advogado criminal (jonataspirkiel@terra.com.br)
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ESPAÇO LIVRE Mais proteção aos prematuros
*Christian Schramm Jorge
A Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal emitiu parecer conclusivo e favorável sobre o projeto de Lei n° 241/2010, de autoria da ex-Senadora Marisa Serrano (atual Conselheira do Tribunal de Contas do Estado do Mato Grosso do Sul). Pelo projeto, que ainda depende de aprovação da Câmara dos Deputados, será acrescido o artigo 71-B a Lei 8.213/91 (Plano de Benefícios da Previdência Social), ampliando o prazo do salário-maternidade para as mães dos chamados prematuros extremos. Apesar de o projeto não definir o que seja um prematuro extremo, deixando esta definição ao futuro regulamento, há em sua justificativa a sinalização como sendo aquelas crianças nascidas com exigências redobradas de cuidados e sem condições mínimas para deixar o ambiente hospitalar. A mãe segurada fará jus ao pagamento do auxílio-maternidade e, após o término deste, continuará a receber o benefício de forma diferenciada, até o momento em que o bebê receba alta hospitalar e tenha condições de receber os cuidados diretamente dos familiares. Tudo isto será devidamente definido e regulamentado após a efetiva aprovação da Lei, mas já é um norte para o legislador. Outro aspecto importante diz respeito ao valor do benefício. O auxílio-maternidade equivale ao mesmo valor da remuneração da mãe no mês do afastamento, não sofrendo as limitações do teto dos benefícios da Previdência Social. O auxílio previsto neste projeto de Lei, por outro lado, estará limitado ao teto do salário de contribuição, que hoje é de R$ 3.691,74. Assim, por exemplo, se a mãe possui remuneração de R$ 5.000,00 no mês do afastamento, receberá os mesmos R$ 5.000,00 durante o período do auxílio-maternidade e, sendo necessário prorrogar o afastamento pelo bebê prematuro ainda necessitar de internação hospitalar, passará a receber o teto do salário de contribuição, ou seja, R$ 3.691,74. Caso a mãe possua remuneração inferior ao teto (R$ 2.000,00, por exemplo), não sofrerá, a princípio, redução no valor do beneficio caso supere o período do auxílio-maternidade. É importante lembrar que hoje o auxílio-maternidade é de 120 dias, ampliado para 180 dias nos casos de opção da mãe e o empregador ser cadastrado no programa empresa cidadã, bem como nos casos de servidores públicos cuja carreira já possua legislação neste sentido. Este projeto de Lei é, sem dúvida, extremamente benéfico às famílias que sofrem com todo o zelo e dedicação que são necessários aos cuidados dos bebês prematuros. Atualmente, as mães de prematuros têm que retornar ao trabalho ao término do período de licença-maternidade, sem poder permanecer ao lado de seus filhos neste momento tão delicado. Não são raras as situações nas quais a mãe acaba pedindo a rescisão de seu contrato de trabalho para poder dedicar-se ao filho, deixando de contar com sua remuneração em um período em que as despesas tendem a ser altas. Com a aprovação no Senado, as futuras mães venceram uma primeira etapa, mas o projeto de Lei ainda segue todo o trâmite legislativo, com suas várias votações, culminando na sanção final da presidente e publicação no Diário Oficial da União. Se aprovado, o projeto dependerá de uma regulamentação que observe todos os detalhes e requisitos que o caso merece, sob pena de criar entraves burocráticos que impedirão o acesso das mães ao benefício, fugindo a finalidade inicial da Lei.
* O autor é advogado associado do Marins Bertoldi Advogados Associados de Curitiba.
* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * A Saúde precisa da CPMF?
*Vladimir Polízio júnior
Recentemente o STF (Supremo Tribunal Federal) julgou ser possível uma sentença condenando um município a tratar de todo o seu esgoto antes de despejá-lo no rio, pois isso não representaria, ao contrário do entendimento do Tribunal de Justiça e do STJ (Superior Tribunal de Justiça), uma interferência do judiciário sobre o poder executivo. Há alguns anos isso seria impensável. Atualmente, contudo, diversos juízes, e sobretudo o STF, tem adotado uma conduta mais ativa com relação à passividade do poder público em cumprir com obrigações que deveriam ser efetivadas desde 1988, quando nossa atual Constituição passou a existir. E esse ativismo judicial é a garantia de que os direitos fundamentais, se não assegurados por falta de vontade política do administrador público, podem ser conseguidos pelo judiciário. No caso mencionado, o fundamento foi o art. 225 da Constituição, que diz: Todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Lógico que com vontade política seria mais fácil encontrar a solução, principalmente com relação à saúde. Mas isso não depende de mais um imposto. Duvido que, por exemplo, se houvesse uma consulta popular com a opção de aumentar a quantidade de vereadores ou de que o SUS adotasse os mesmos prazos estabelecidos pela Agência Nacional de Saúde para os planos privados (quaisquer exames, procedimentos e consultas em até 21 dias), a vitória da segunda alternativa não seria quase que por unanimidade. Num país como o nosso, é no mínimo imoral aumentar a quantidade de vereadores. E é aí que entra a vontade política, onde infelizmente muitos administradores perdem uma chance histórica de deixar um legado, porque é fácil fazer tudo quando se tem dinheiro de sobra, mas isso muda quando se precisa priorizar o que se fazer com pouco dinheiro: a solução mais fácil, aumentar impostos, nem sempre é a mais inteligente. A saúde é considerada pela Constituição direito de todos e dever do Estado. A inércia do Poder Público em oferecer à população uma saúde pública nesses termos só fomenta a contribuição do judiciário em efetivar esse direito essencial, e ainda que não exista um grande culpado pelo caos da saúde pública, todos os administradores que se sucedem desde 1988 tem uma parcela de responsabilidade. Algo precisa ser feito, e urgente, pois as únicas vozes em defesa do SUS são de pessoas que tem plano de saúde privado.
* O autor é defensor público (vladimirpolizio@gmail.com)
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PAINEL JURÍDICO
Demissão Sociedade de economia mista, posteriormente privatizada, pode dispensar funcionário sem justa causa, mesmo que ele tenha sido admitido por meio de concurso público. O entendimento é da 8ª Turma do TST.
Prisão A fuga do réu e o não atendimento a chamados judiciais justificam prisão cautelar durante processo penal. O entendimento é da 6ª Turma do STJ.
E-mail O TJ de São Paulo criou a citação por e-mail, mesmo que os autos não estejam inteiramente digitalizados. Ficam de fora os processos criminais e de atos infracionais. Para poder ser citado eletronicamente os interessados devem assinar termo de adesão de convênio.
Seminário A primeira edição do seminário Ítalo-Brasileiro em Inovações Regulatórias em Direitos fundamentais, Desenvolvimento e Sustentabilidade será realizada em Curitiba, de 25 a 28 de outubro. A UniBrasil será a anfitriã do evento que receberá grupos de várias instituições de ensino. Serão diversas palestras, reuniões de pesquisa e workshops de discussões. As atividades acontecerão na UniBrasil a partir do dia 26 e o credenciamento inicia no mesmo dia às 17h. Informações pelo fone (41) 3361-4315 ou pelo e-mail contato@seminarioitalo brasileiro.com.br
Minicursos Começa hoje e vai até quarta-feira, a Semana Acadêmica FESP, evento realizado na Faculdade de Educação Superior do Paraná. Na programação estão previstas apresentações de palestras, debates além de minicursos gratuitos com temas sobre informática, finanças, economia, direito, administração, comércio exterior e ciências contábeis.Informações e inscrições gratuitas no site www.fesppr.br
Doação Os advogados Alceu Machado Filho e André Luiz Bonat Cordeiro formalizaram a doação para a UFPR de 300 exemplares do livro Atualidades de Direito Empresarial, que será lançado dia 27/10 em comemoração aos 35 anos da Sociedade de Advogados Alceu Machado, Sperb & Bonat Cordeiro. O Objetivo é que a Universidade comercialize os exemplares do livro e arrecade fundos para ajudar na revitalização do auditório histórico do curso de Direito da UFPR.
Conferência O jornalista Juca Kfouri aceitou o convite do presidente nacional da OAB, Ophir Cavalcante, e virá a Curitiba para participar da XXI Conferência Nacional dos Advogados, de 20 a 24 de novembro. Juca conduzirá o Bate-Papo Cultural da Conferência no dia 22, das 18h30 às 19h30.
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DIREITO SUMULAR Súmula n. 701 do STF – No mandado de segurança impetrado pelo Ministério Público contra decisão proferida em processo penal, é obrigatória a citação do réu como litisconsorte passivo.
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LIVROS DA SEMANA
Quem tem a última palavra sobre o significado da Constituição Brasileira? Este livro problematiza e questiona a própria pergunta da qual parte este debate. Constata que, na política, a última palavra costuma ser, e poderá ser, provisória. Procura avaliar como as teorias do diálogo institucional podem orientar as reações legislativas às decisões do STF e vice-versa. A separação de poderes, assim, mais do que um equilíbrio de forças, passa a ser vista também como um arranjo no qual instituições argumentam umas com as outras. Conrado Hübner Mendes — Direito Fundamentais, Separação de Poderes e Deliberação – Série Produção Científica — Editora Saraiva, 2011 * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * *
Esse texto de Zagrebelsky, que agora se oferece aos leitores da comunidade lusófona, reveste-se da maior importância para o aprimoramento da nossa cultura política e jurídica, e isso menos pela invocação do sacrifício crucial do Nazareno – de permanente atualidade e relevante interesse para a Cristandade – do que pela reconvocação para o debate, sempre necessário, sobre essência da democracia, num contexto em que pluralismo ético e cultural, como direito a diferentes visões de mundo ou distintos modos de vida, tem como efeito perverso a contraditória proclamação de que a única verdade é que tudo é relativo, tanto no espaço público quanto no âmbito das relações privadas, numa postura tão nociva à preservação da sociedade que todo ato de autoridade, por mais singelo que seja, é percebido como a imposição de valores não compartilhados, e o próprio conceito de sociedade parece não se ajustar a essa nova realidade. Gustavo Zagrebelsky — A Crucificação e a Democracia — Editora Saraiva, 2011
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COORDENAÇÃO: RONEY RODRIGUES PEREIRA roney@jornaldoestado.com.br
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