A suavidade do semblante e a voz calma enganam quem não espera força e vigor em Letícia Sabatella. A atriz, que completou 41 anos em 8 de março e há mais de 20 é uma figura conhecida do telespectador, carrega com o mesmo empenho seus papéis da ficção e de ativista ambiental. São comuns as reuniões com autoridades, as discussões sobre direitos humanos e indígenas. Essa temática, mais especificamente a da tribo Krahô, do Tocantins, a encantou. Sua primeira aventura como diretora de cinema, o documentário Hotxuá, em cartaz, causou pouco alarde, nada comparado ao glamour de seu próximo trabalho na TV, como uma apaixonada de Niterói na série da Globo As Brasileiras.
Nascida em Belo Horizonte, ela morou em Curitiba dos 4 aos 20 anos. A atriz, aliás, gosta de expor sua persona politizada, mas prefere preservar sua vida privada na penumbra. Ela foi casada durante 12 anos com o ator Ângelo Antônio, 47, que conheceu durante as gravações da novela O Dono do Mundo (1991) e com quem tem uma filha, Clara, de 18 anos. Em 2009, engatou um namoro com o também ator André Gonçalves, de 36 anos, que chegou ao fim no ano passado. Mas nada a tira do caminho de suas lutas pessoais.

Agência Estado — Como surgiu a ideia de retratar, em documentário, uma tribo?
Letícia Sabatella —
Conheci a aldeia em 1996, com um grupo de teatro. Na época, os índios estavam tentando divulgar a cultura deles. Por volta de 2000, eles me pediram ajuda e chamei o Gringo (Cardia, cenógrafo e codiretor de seu filme). Decidimos focar no Hotxuá (nome dado ao membro da aldeia escolhido para alegrá-la, como um palhaço). Essa figura abobalhada que materializa a positividade da tribo.

Agência Estado — O que encantou nesse universo?
Letícia Sabatella —
Eles têm uma visão positiva das coisas. A tribo é conhecida pelas outras aldeias por ser um povo que ri muito. Fiz duas visitas à aldeia. A primeira, em 1996, foi uma imersão mesmo, de usar roupas deles e participar dos rituais, do nascimento de uma criança ao enterro de um ancião. A segunda vez, no ano passado, foi uma guerrilha, de dormir duas horas por noite para registrar tudo.

Agência Estado — Você discute direitos humanos e código florestal. Já recebeu ameaças?
Letícia Sabatella —
Recebi, de veículos de imprensa inclusive, que publicaram mentiras em meu nome. Para mim, é uma grande ameaça. Mas, com o tempo, a gente vai aprendendo a escolher as causas e as lutas.

Agência Estado — Você considera a classe artística engajada politicamente?
Letícia Sabatella —
Acho que hoje isso é comum. Antes, era ordem vigente que ator precisava ser apolítico. Para se dar bem na vida, não podia ser político. A tendência é ter consciência de que não ser político é também política. Para mim, sempre foi algo espontâneo. Minha mãe professora e meu pai engenheiro sempre foram de muita iniciativa no dia a dia. E a questão ambiental também veio de conviver muito com a natureza e com eles.

Agência Estado — Isso vem da sua criação, então?

Letícia Sabatella — Fui criada no Paraná, e lá eu ia muito para fazendas, casa de vó. Tenho essa saudade da terra, da natureza. Mas, de qualquer forma, tenho isso no Rio. Lá, tenho um sítio em Cachoeira de Macacu e ajudei a formar uma associação de agricultores orgânicos. Agora, não estou mais tocando o projeto, mas dei formação, cursos de orgânico, até eu fiz a aula. No sítio, a gente planta e vende tudo.

Agência Estado — Agora esse conceito de consumir orgânicos é modismo, não?
Letícia Sabatella —
Pois é. Na época, uns oito anos atrás, tive essa ideia de fazer uma cadeia sustentável completa, de produzir e vender direto para os restaurantes e, assim, todo mundo sair ganhando e sem patrão lucrando. Ainda não funciona totalmente, mas ajudou muita gente da região a se capacitar, se valorizar.

Agência Estado — Você tem uma filha adolescente. Como é a Clara em relação a isso?

Letícia Sabatella — Ela entende mais do que eu. É bem enturmada com as coisas.

Agência Estado — Aliás, quando ela nasceu prematura, você e o Ângelo (Antônio) moraram no hospital por meses. Como foi esse período?

Letícia Sabatella — Foi intenso. Criamos vínculos com pessoas muito queridas até hoje. Uma verdadeira família se formou ali dentro. A Clara teve um período de recuperação em que aconteceram grandes milagres e grandes ações amorosas em torno da gente. O que posso sentir por esse período é muita gratidão. Hoje, a Clara é uma moça linda, talentosa, que gosta de música e já tem um caminho lindo.

Agência Estado — Você briga por várias causas, mas é sempre muito serena ao falar. Sempre teve esse jeito?

Letícia Sabatella — Na verdade, luto pelo que acredito. Sobre ser assim, sou bem lunar, cíclica no humor e tenho meus períodos de TPM. Ah, ator é meio assim, sabe, de emoções à flor da pele. No meu caso, isso reflete muito em determinados trabalhos. Tenho muita sensibilidade e reviravoltas por isso. Mas tenho mesmo um fundo muito calmo.

Agência Estado — Como começou na vida artística?

Letícia Sabatella — Fazendo balé aos 8 anos, teatro aos 14 e, aos 17, comecei a cantar em corais e bandas. Nesta mesma época, comecei a fazer teatro amador. Fui fazer uns testes, o Emílio Di Biasi (ator e diretor) me conheceu numa peça e me chamou para um teste. O (diretor) Luiz Fernando Carvalho me viu e comecei na TV.

Agência Estado — Direto na Globo?

Letícia Sabatella — Foi. Fiz um especial, Os Homens Querem Paz. Depois, em 91, fiz minha primeira novela, O Dono do Mundo, como a prostituta Taís. Era do Gilberto Braga e direção de Daniel Filho. Digo que eles me obrigaram a fazer TV. E já são mais de 20 anos de carreira e cerca de dez novelas.

Agência Estado — Seu último papel na TV foi Yvone, a vilã de Caminho das Índias (2009). Gosta de papéis assim?

Letícia Sabatella — É, ela era uma vilã difícil, pois era e não era. Era leve e falsa, dissimulada. Uma 171. Gosto bastante de fazer personagens bem diferentes de mim.

Agência Estado — Quais personagens marcaram mais você?

Letícia Sabatella — Nossa, tantas. É que, justamente por elas serem diferentes, cada uma marcou de um jeito. A Taís, de O Dono do Mundo, a Latifa, de O Clone. Várias….

Agência Estado — Agora, em As Brasileiras, sua personagem é uma mulher que sofre por amor, vive presa ao marido. Já passou por isso na vida real?
Letícia Sabatella — Tudo em As Brasileiras é superlativado. Sou eu elevada à enésima potência.

Agência Estado — Inspirou-se em alguém para criar a personagem?
Letícia Sabatella — Em pessoas, especificamente, não, mas em perfis bipolares.

– Você sempre foi apontada pela mídia como uma mulher madura. Isso desde muito jovem. A que se deve esta imagem?

Letícia Sabatella — É porque faço meu trabalho com muito prazer, mas também com muita seriedade.

– Você já afirmou ser espiritualista. Segue alguma religião?
Letícia Sabatella — A minha espiritualidade não é romântica. É bem pé no chão, está preocupada com justiça social, qualidade de vida e está ligada à paz de espírito, que vem de uma conduta ética, de um olhar amoroso. Gosto de alguns gestos simbólicos. Respeito quando isso existe em todas as religiões, quando é acompanhado de um silêncio interno, de um encontro consigo mesmo e de uma escuta muito pessoal de qual caminho seguir. É assim que vejo a espiritualidade.

– Aos 40 anos, você tem uma beleza natural. Gosta de se cuidar?

– Sim e, para isso, só preciso de uma rotina. Mas, infelizmente, nem sempre é possível. Mas gosto de me alimentar bem e estar perto da natureza.