O Governo Federal tem tomado muitas medidas que aparentam significar melhorias para segmentos específicos da sociedade brasileira, mas, analisando, mais a fundo, vemos alguns equívocos e até uma certa dosagem de demagogia, dentro de uma lógica bastante pragmática. A questão das cotas raciais pode parecer, num primeiro momento, um avanço social, por dar oportunidades de acesso ao ensino superior aos negros, que historicamente estiveram submetidos a trezentos anos de escravidão e ainda hoje a maioria se encontra em condições sociais precárias. Ao garantir, por lei, que as Universidades assegurem uma cota de vagas aos negros, estaríamos vivenciando, de fato, um processo de maior democratização social.


À primeira vista, o argumento defendido pelos que propuseram as cotas raciais, dá a impressão de tratar-se de uma medida de promoção da justiça social, mas não é; pois a democracia pressupõe oportunidades iguais para todos, e quando o governo favorece um segmento (seja social, cultural, religioso, empresarial ou racial), está dando privilégio e não oferecendo oportunidades iguais, abrindo assim precedentes para que outros grupos que se sintam injustiçados façam reivindicações que o Estado não terá como atender. Por exemplo: a comunidade indígena no Brasil também poderá pleitear a sua cota, com os mesmos argumentos utilizados atualmente em relação às cotas raciais, os orientais ou hindus também, os árabes e judeus, etc. E então? E mais ainda: hoje os privilégios são por conta da questão racial (sempre utilizada por governos demagógicos e de índole autoritária, que recorre aos sentimentalismos para obter a adesão popular). E amanhã este ou outro governo poderá estabelecer as cotas com outros critérios, beneficiando outras minorias ou grupos que se sentem injustiçados.


O critério fundamental para evitar equívocos numa sociedade que realmente queira vivenciar uma autêntica experiência democrática é o de criar meios para assegurar oportunidades iguais para todos. Este é o desafio. O governo existe para atender todos os grupos e garantir os direitos sociais para toda a população. Para isso os governantes são eleitos. Deve-se buscar, portanto, fazer com que, na prática, a lei dê oportunidades iguais de educação, trabalho, saúde, moradia, etc., para todos os cidadãos. É claro que não é uma tarefa fácil e ainda não encontramos a fórmula adequada para isso, pois herdamos dos sistemas sócio-políticos do passado, muitas imperfeições. Cabe à geração atual melhorar o sistema vigente, evitando o que historicamente não deu certo, e buscar medidas novas dentro do bom senso, da coerência e do respeito à pessoa humana como um todo. Os governos devem ter em vista o bem da pessoa humana, e não do grupo a, b ou c.


Outro aspecto relevante nesta reflexão é que as oportunidades iguais devem ser viabilizadas a partir da base da sociedade, dos mais pobres. Erradicar a miséria e o analfabetismo, as condições sub-humanas de vida, em todos os aspectos, isso sim deve ser o empenho dos governantes. Quando tivermos uma sociedade em que todos tenham acesso a uma alimentação adequada, a uma educação de base com qualidade, aos serviços de Saúde e oportunidades de trabalho digno, então teremos assegurado a justiça social que tanto almejamos.


 


VALMOR BOLAN – Doutor em Sociologia.


Reitor da Universidade Guarulhos – UNG


Vice-Presidente do CRUB (Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras)


Diretor Geral da Faculdade Editora Nacional – FAENAC


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