DIREITO E POLÍTICA

Jogo de xadrez

Carlos Augusto Vieira da Costa

Os punhos cerrados e o braço erguido sobre a cabeça. Foi desta forma que André Vargas, Vice-presidente da Câmara Federal, recepcionou o Ministro Joaquim Barbosa na solenidade de abertura do ano legislativo de 2014.
A oposição prontamente reagiu, alegando quebra de decoro parlamentar e ameaçando com a abertura de um processo disciplinar contra Vargas. Para quem não lembra, foi com esse mesmo gesto que Zé Dirceu e Genuíno se apresentaram à imprensa no momento de suas prisões. Barbosa, por sua vez, se fez de rogado e disse não ter percebido.
Mas será que de fato Vargas atentou contra o decoro parlamentar? Certamente haverá opiniões para todos os gostos, até porque estamos em ano eleitoral, mas a rigor parece que a oposição, nesse caso, pecou pela banalização.
O gesto repetido por Vargas simboliza união, força e resistência, e não tem em si qualquer significado ofensivo, mesmo que saibamos que a intenção era provocar o relator do mensalão.
Além disso, Barbosa, mesmo ocupando o cargo de Presidente do STF, não é incontestável nem possui qualquer tipo de imunidade social, podendo, portanto, ser provocado ou questionado dentro dos limites da urbanidade e civilidade.
Vale também lembrar que o próprio Barbosa não serve de exemplo de ponderação, já tendo protagonizado outros episódios polêmicos, como na vez que acusou um colega de toga de gangsterismo, ou quando mandou um repórter chafurdar no lixo. E esse tipo de conduta naturalmente acaba nivelando o debate por baixo.
Porém, acima de qualquer argumento, e independentemente de qualquer circunstância, a verdade é que a nossa Constituição Federal garante a todos, brasileiros ou estrangeiros residentes em nosso país, o direito à livre expressão do pensamento.

Portanto, se Vargas quer saudar seus companheiros com os punhos cerrados, não há nada que o proíba de fazê-lo. Quanto à eventual provocação, faz parte do jogo democrático, e serve para posicionar as peças no jogo de xadrez do poder.

Carlos Augusto Vieira da Costa Procurador do Município de Curitiba

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SABER DIREITO

Destino, dinheiro e direitos

Roberto Victor Pereira Ribeiro

O relato que farei agora é um desses famigerados casos de ciladas do destino, situações que chegam a verdadeiras pérolas da ironia.
Stieg Larsson era um jornalista sueco de reputação mediana e que vivia sonhando com uma vida melhor em termos financeiros. Para aplacar um pouco as amarguras de não ter nascido abastado, Larsson se dedicava, nas horas vagas de labor, a escrever romances policiais. 
Estava encerrando os originais de uma trilogia denominada Millenium quando, subindo os degraus de uma escada no edifício do jornal que trabalhava, aos 50 anos de idade, teve um infarto fulminante que lhe ceifou a vida. 
Após sua morte, uma editora se interessou em publicar a supracitada coleção de obras e até os dias hodiernos já atingiu a marca de US$ 30 milhões arrecadados com as vendas de exemplares. O pobre Stieg não teve o direito de usufruir ou celebrar sua fama e sua conta bancária. 
Iniciou-se, então, uma batalha judicial para saber quem ficaria com a herança do jornalista best-seller. Três entraram com ação na justiça sueca para pleitear seus direitos: a companheira de Stieg, seu genitor e seu irmão. 
Logo de início, a prima facie, devemos dizer que a companheira não possui direito algum assistido pela legislação sueca. Para a mesma obter sucesso em seu pleito deve se enquadrar em duas situações alternativas: ser casada civilmente ou ser mencionada em testamento. Eva Gabrielsson, não preenche nenhuma das duas situações.
Indignada, mesmo assim, a arquiteta ingressou em juízo. 
Em plagas brasileiras, a Constituição de 1988 acoberta com seu manto soberano os direitos de companheiros. No Brasil o companheiro(a) faz jus ao direito de herdar parte do que foi adquirido durante a constância da união. 
Se o casal teve filhos, o companheiro(a) supérstite possuirá direito a uma parte igual a que cabe a prole. Se os filhos forem apenas do de cujus, a companheira fica com a metade do que caberá a cada um dos filhos. Não existindo descendência, a companheira dividirá a herança com os demais herdeiros, tendo direito à terça parte. 
O irmão só herda se não houver nenhum outro herdeiro da linha reta ascendente ou descendente. 
Entretanto, se Eva morasse no Brasil e este caso fosse regido por nossas leis, seria necessário a mesma entrar com ação declaratória de união estável, requerendo, assim, que a união seja reconhecida a fim de garantir seus direitos sucessórios. 
Pois bem, os cidadãos brasileiros em situação de união estável possuem reconhecimento, fato que não ocorre em outros países, até mesmo se um desses é a Suécia tão evoluída culturalmente.

*O autor é advogado do Ribeiro Advocacia & Advogados Associados e escritor da Academia Brasileira de Direito

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A CONDUTA E O DIREITO PENAL

A Troca: Pizzolato x Battisti

* Jônatas Pirkiel

Diante da prisão do ex-diretor do Banco do Brasil, no caso mensalão, que fugiu para a Itália e tinha a esperança de lá não voltar em razão da sua dupla cidadania,vota-se a discutir a possibilidade de sua extradição e a expectativa de que o governo italiano age da mesma forma que agiu o brasileiro quando negou a extradição do também ex-condenado Cesare Battisti.
Pode até parecer que são situações distintas, porque no caso do condenado brasileiro, ele seria beneficiado pela dupla cidadania, também pela falta de acordo de extradição. O fato é que este caso será apreciado pela Jusitiça italiana, caso haja o pedido de extradição, agravado pelo fato de que o ex-presidente do Banco do Brasil também cometeu crime à luz da legislação italiana ao usar passaporte adulterado de seu irmão.
Penso até que o governo italiano deverá respeitar a decisão da Justiça daquele país, considerando que no caso de Battisti o Supremo Tribunal Federal foi, de certa forma, favorável à extradição, deixando para que o governo brasileiro decidisse e decidiu: o ex-condenado, Cesare Battisti, vive tranquilamente no Brasil. Desta forma, se a Justiça italiana decidir pela extradição, certamente esta ocorrerá.
Tanto no caso de Battisti como no de Pizzolato, o que se deve considerar é a soberania dos julgamentos, quando feito por países democráticos e que respeitam os acordos internacionais de respeito à dignidade humana. Infelizmente, quando se transformam decisões judiciais em instrumento de demonstração de ideologia ou protecionismo desta ou daquela cidadania, as coisas ficam à margem do que se poderia chamar justiça.
Como de resto, este assunto deverá ser pauta da imprensa nacional até que outro de melhor repercussão não ocorra. Talvez até tomando mais espaço do que a discussão da situação carcerária nacional, a falta de água, os apagões e a violência que cresce assustadoramente em nosso país, incentivada pela impunidade e pelos exemplos dados pela classe política.
Porém, no caso Pizzolato, a Justiça Italiana deverá agir contra a impunidade como sempre agiu, autorizando a extradição, que somente será pedida pelo governo em face da repercussão que o caso tem…

* O autor é advogado criminalista (Jô[email protected])

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ESPAÇO LIVRE

O direito de regresso do empregador por danos causados pelo empregado

*Edson Fernando Hauagge

Em dezembro de 2013, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) reconheceu o direito de uma empresa em buscar ser ressarcida por dano causado por um empregado durante execução dos deveres decorrentes do contrato de trabalho. A matéria, apesar de não ser nova, não é muito conhecida no ambiente empresarial.
No caso julgado pelo TST no fim do ano passado, uma ex-empregada havia ajuizado uma reclamatória trabalhista postulando pagamento de indenização por dano moral em razão de ter sofrido agressões físicas e verbais de um colega de trabalho. A empresa foi condenada ao pagamento de indenização em valor equivalente a R$ 70 mil.
A empresa, então, ajuizou ação contra o empregado que agrediu física e verbalmente a sua colega e o TST reconheceu que este profissional deve indenizar o empregador pelo prejuízo que causou em razão de seu comportamento ilícito.
São muito comuns os processos trabalhistas envolvendo pedido de pagamento de indenização por dano moral em decorrência de tratamento inadequado por parte de colegas de trabalho ou superiores hierárquicos. Contudo, são absolutamente incomuns as ações das empresas em busca de ressarcimento em caso de serem condenadas ao pagamento de dano moral por condutas irregulares de seus empregados. E isto é possível. É o que se costuma denominar de exercício de direito de regresso.
Uma das causas do chamado assédio moral parece estar no fato de que os assediadores imaginam que somente a empresa responde por eventuais indenizações postuladas pelos empregados assediados. Esquecem-se os assediadores que também eles podem responder pessoalmente pelos valores destas indenizações quando a empresa exerce o seu direito de regresso.
É de se notar, contudo, que a empresa, para poder buscar o ressarcimento integral do prejuízo causado pela conduta ilícita do seu empregado, deve poder demonstrar que coibiu o ato irregular, punindo o empregado responsável quando teve ciência do fato ocorrido. Nos casos em que esta punição não ocorre, a tendência é a de que se entenda que a empresa perdoou tacitamente o empregado assediador ou agressor. É fundamental, portanto, que a empresa, uma vez ciente sobre o comportamento desregrado de um de seus empregados, reaja de forma imediata e firme no sentido de punir este desvio de conduta. 
Se é verdade que o empregador é responsável pelos prejuízos causados pelos seus empregados na execução do contrato de trabalho (art. 932, III do Código Civil), também é verdade que pode a empresa buscar ressarcimento por ter arcado com a indenização destes prejuízos causados a outros empregados ou a terceiros (art. 934 do Código Civil).
Por fim, é de se registrar que além de ter que ressarcir o empregador pelo prejuízo causado, o assediador, dependendo do tipo de conduta que gerou o direito à indenização do empregado ofendido, ainda pode responder criminalmente por ter praticado crime contra a honra (injúria, difamação ou calúnia).

* O autor é advogado, graduado em Direito pela Faculdade de Direito de Curitiba e Mestre em Direito pela Universidade Federal do Paraná. Ele integra o Departamento Trabalhista do escritório Andersen Ballão Advocacia desde 2002.

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DESTAQUE

Empresa obtém decisão inovadora para compensar crédito com as parcelas do Refis

O Tribunal Regional Federal da 4.° Região (TRF4) confirmou no dia 29 de janeiro a decisão que favorecia uma empresa do ramo de transporte a compensar crédito tributário para quitar parcelas do Refis da Crise. A sentença havia sido proferida em novembro de 2012. Na época a empresa teve reconhecido, pela Receita Federal, crédito tributário diante de pagamentos de tributos, mas foi negado o uso dos valores para quitar parcelas vencidas e que iriam vencer do Refis da Crise. Nós impetramos o pedido demonstrando que cabe ao contribuinte escolher em face de qual débito tributário utilizará seu crédito e tivemos reconhecido integralmente o nosso pedido, comenta o advogado do caso, Cezar Augusto Cordeiro Machado, da Sociedade de Advogados Alceu Machado, Sperb & Bonat Cordeiro.
Machado ressalta que, durante a ação, a resposta da Receita Federal era que o contribuinte não possuía prerrogativa de escolher em qual débito o crédito seria utilizado e que o uso de crédito para compensação está restrita às normas da Receita Federal. Mas, com a decisão, conseguimos reconhecer judicialmente o direito de a empresa compensar administrativamente seu crédito com parcelas vencidas e vincendas do Refis, não ficando obrigada a utilizá-lo, apenas, para abater do valor consolidado, explica.
Para o advogado, esta decisão é inovadora, pois desobriga a empresa de compensar créditos tributários apenas do valor total (consolidado) dos débitos parcelados. A empresa vinha arcando mensalmente com um valor muito alto de tributos. Porém, em determinado período enfrentou dificuldades para quitá-los e entrou em atraso, conta. 

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DIREITO SUMULAR

Súmula nº 422 do TST — Não se conhece de recurso para o TST, pela ausência do requisito de admissibilidade inscrito no art. 514, II, do CPC, quando as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que fora proposta.

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PAINEL JURÍDICO

Regressiva
Uma empresa terá de pagar os valores gastos pelo INSS com um trabalhador que lesionou a coluna em acidente de trabalho. A decisão é do juiz federal da Vara Única da Subseção de Paracatu – SP. Para o juiz, o valor que a empresa recolhe para o seguro de acidente de trabalho é para financiar aposentadorias especiais, e não acidentes causados por culpa do empregador.

Idade
O limite de 24 anos de idade para candidatos a um curso de ingresso nas Forças Armadas não viola direito constitucional. A decisão é da Justiça Federal em Sergipe.

Saúde
Servidor público federal pode pedir remoção para outra cidade, independentemente do interesse da Administração Pública, por motivo de doença sua ou da de seu cônjuge ou dependente que conste no seu registro funcional. O entendimento é da 4ª Turma do TRF da 4ª Região.

Tributo
Já está nas livrarias a sétima edição do livro Direito Processual Tributário Brasileiro (Administrativo e Judicial), do advogado James Marins, sócio do Marins Bertoldi Advogados Associados. Lançado pela editora Dialética, o livro com mais de 900 páginas é referência entre profissionais de todo o país teve sua 1ª edição lançada em 2001.

Gratuita
A assistência judiciária gratuita limita-se às custas processuais, e não alcança o depósito recursal, que é utilizado para garantir a execução. O entendimento é da1ª Turma do TST.

Convênio
O Núcleo de Prática Jurídica da Faculdade Estácio Curitiba firmou parceria com a Defensoria Pública do Estado. Assinado pelo diretor da Estácio, James Prestes, e pela Defensora Geral do Estado, Josiane Fruet Bettini Lupion, o novo convênio vai aproximar os alunos do curso de Direito da realidade de trabalho que encontrarão.

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LIVRO DA SEMANA

Fruto da tese de doutorado apresentada por Paulo Antonio Fernandes Campilongo à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Processo Penal e Processo Administrativo Tributário – Correlação entre fato e decisão, lançamento da Editora Saraiva, procura confrontar o processo penal e o processo administrativo tributário a fim de verificar a possibilidade de importação de princípios de um ramo do direito a outro. O problema ganha feições concretas em normas jurídicas que prescrevem penas privativas de liberdade e também a constituição de crédito de natureza tributária.

Paulo Antonio Fernandes Campilongo —Processo Penal e Processo Administrativo Tributário – Correlação entre fato e decisão — Editora Saraiva, São Paulo 2014

 

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COORDENAÇÃO: RONEY RODRIGUES PEREIRA
[email protected]