Imagine estar andando em uma movimentada avenida de Brasília quando, de repente, um gato gigante começa a andar entre os prédios. Numa praça em outro lugar do País, cogumelos vermelhos e gigantes ocupam o espaço entre fontes e bancos, despertando a curiosidade dos pedestres. As situações, que poderiam ser frutos de uma alucinação coletiva, aconteceram de verdade, graças a projeções criadas a partir do ‘video mapping’. A técnica, que permite criar ambientes interativos no meio da cidade, tem despertado o interesse de artistas brasileiros, atraídos pela união entre arte e tecnologia.

A intervenção artística, que enche os olhos de quem a presencia, esconde um processo de criação complexo. Não é mera projeção de imagem, como se pode imaginar num primeiro momento: antes de desenvolver a animação, o artista vai a campo estudar a superfície irregular para recriá-la em 3D. Com base nesse “mapa”, ele deixa a imaginação fluir. A projeção é ajustada à superfície, respeitando limitações físicas. No final, ainda é preciso definir como os elementos vão reagir ao comportamento das pessoas.

Um dos projetos de video mapping mais interessantes realizados no País recentemente é o da artista manauense Lina Lopes, que mantém o Estúdio LILO, em São Paulo. Em setembro do ano passado, ela recriou o quarto da pintora mexicana Frida Kahlo durante uma exposição. O trabalho demorou um longo tempo para sair do papel: ela mapeou a sala e precisou adaptar fotos antigas do quarto da artista plástica. O resultado foi uma animação projetada por 12 equipamentos. “As pessoas se viam dentro do quarto dela. Não dava para imaginar que tudo ali era apenas uma projeção”, diz a artista.

Apesar de a técnica ter ganhado força no Brasil nos últimos anos, as projeções em superfícies irregulares começaram no século 18. Um dos primeiros a se aventurar foi o belga Étienne-Gaspard Robert, que projetava imagens em fumaça – como no filme O Mágico de Oz, por exemplo. A técnica fez sucesso na época e levou ao movimento Phantasmagoria. No entanto, com o advento do cinema no século 20, esse tipo de projeção perdeu espaço.

“O video mapping ressurgiu apenas na virada do século 21”, explica o designer digital e professor da técnica, Mateus Knelsen. “Mas só tomou força, de fato, no final dos anos 2000.”

Hoje, o video mapping é amplamente difundido em todo o mundo. Em Genebra, na Suíça, é realizado um festival focado em produções feitas a partir da técnica e, em vários países, festivais de luzes usam as projeções como suas principais atrações.


Rápida

Queremos criar cenas mágicas nas cidades

Ao conversar com profissionais especializados em vídeo mapping, a maior parte deles têm uma característica em comum: à frente da ambição pela fama e dinheiro está o desejo de difundir a técnica e tornar as projeções interativas parte do cotidiano dos brasileiros.

É o caso dos paulistanos Ygor Marotta e Cecília Soloaga, que formam a dupla VJ Suave. Eles entraram no ramo de projeção em 2009, logo que a técnica de video mapping se tornou popular no País. No início, os dois desenvolviam projetos artísticos – como curtas de animação – e os exibiam em projeções pela cidade. A produção, porém, logo começou a tomar outra forma.

“Comecei a ver que, além dos curtas, poderia levar os grafites que eu fazia para onde eu quisesse, por meio da projeção”, conta Cecília. Eles começaram a fazer intervenções a partir do mapeamento de edifícios e outros elementos da arquitetura de grandes cidades.

A dupla, porém, ainda não estava satisfeita. “A gente queria levar a projeção para todos os lugares possíveis”, afirma Marotta. “Queríamos usar o espaço inteiro da cidade e não uma única fachada.”

Essa ideia deu origem ao projeto que acabou por se tornar a marca registrada do VJ Suave: eles adaptaram um triciclo com equipamentos que permitem fazer projeções em qualquer lugar. O veículo, que ganhou luzes decorativas, foi batizado de “suaveciclo”.


Tudo começou em 2009

No Brasil, as projeções interativas só chegaram ao País por volta de 2009, quando o VJ Spetto resolveu fazer instalações na cidade, como a recriação da rotina de São Paulo na fachada do antigo prédio da loja de departamento Mappin. “Foi uma experimentação”, conta Spetto. “Resolvi testar a projeção, que eu já fazia, em arquiteturas.”

Embora atraia cada vez mais entusiastas, quem aposta no video mapping ainda enfrenta dificuldades no Brasil, principalmente relacionadas à viabilidade financeira dos projetos. Os projetores utilizados pelos artistas, por exemplo, chegam a custar US$ 250 mil cada – há projeções interativas que exigem o uso de até 20 equipamentos. O alto valor limita os projetos independentes.
“Não dá para viver só disso”, afirma Ygor Marotta, integrante da dupla VJ Suave. “A base do nosso trabalho é o amor.”