SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Além das questões que praticamente monopolizaram o debate sobre o tema pela possibilidade de impacto nas atividades da Operação Lava Jato, o projeto de lei do abuso de autoridade também caracteriza como crime uma série de práticas que extrapolam o “colarinho branco”.
“Assim como em todas as questões penais, a maior incidência desta lei será sobre as pessoas mais pobres”, afirma o defensor público Antonio Maffezoli, que preside a Anadep, associação nacional da categoria. Para entrar em vigor, o projeto ainda tem de ser aprovado na Câmara.
O texto define como crime, por exemplo, práticas pelas quais policiais têm sido acusados em decorrência de investigações, como a alteração de cenas de crime para “eximir-se de responsabilidade ou responsabilizar criminalmente alguém”. A pena é de um a quatro anos de prisão.
Também fica definida como crime a ação de uma autoridade que permite que presos, investigados ou vítimas -sem consentimento ou a partir de ameaça- sejam fotografados ou filmados e expostos a “vexame ou à execração pública”. A prática pode resultar em prisão de seis meses a dois anos.
Outra ação caracterizada como crime é a de obrigar um preso a usar algemas ou outro instrumento que restrinja movimentos de braços e pernas, quando “manifestamente não houver resistência à prisão, ameaça de fuga ou risco à integridade física”.
FISCALIZAÇÃO
Para Maffezoli, o projeto tem o mérito de descrever melhor as condutas que são caracterizadas como crime. “Qualquer tipo penal aberto dá margem para má interpretação e para abuso”, diz.
O texto, no entanto, não deve resultar em mais punições se não houver um aprimoramento nos mecanismos de controle e fiscalização das autoridades -com a criação, por exemplo, de ouvidorias com participação externa- argumenta o defensor.
“Todas as condutas já são proibidas. A questão não é ter lei com penas maiores e tipos mais bem descritos. É questão de aplicação da lei”, diz.
Ele cita como exemplo a “prisão para averiguação”. “Ela já é proibida. Vai ser punida agora? Se a Polícia Civil não registrar e o Ministério Público não se importar em apurar, a polícia vai continuar levando pessoas presas para averiguação”, afirma.
Como histórico, Maffezoli menciona o endurecimento da lei de crimes hediondos.
“Logo depois de alguma situação muito grave a resposta do Parlamento costuma ser o aumento de pena. As alterações na Lei do Crime Hediondo não diminuíram a quantidade de estupros ou sequestros”, afirma.