REINALDO JOSÉ LOPES SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Simplesmente bombardear as pessoas com informações científicas confiáveis não é suficiente para que elas tomem decisões sensatas sobre temas complicados, indica um novo estudo feito nos EUA. Os resultados reforçam a hipótese de que, quanto mais as pessoas aprendem sobre ciência, menos elas tendem a concordar entre si em relação a assuntos polêmicos, como a teoria da evolução, as mudanças climáticas e o Big Bang. A pesquisa, que acaba de sair no periódico especializado “PNAS”, da Academia Nacional de Ciências americana, foi realizado por Caitlin Drummond e Baruch Fischhoff, ambos da Universidade Carnegie Mellon. Eles fizeram uma análise estatística dos dados do GSS (sigla inglesa de “Pesquisa Social Geral”), iniciativa da Universidade de Chicago que examina periodicamente as opiniões do público americano a respeito de uma série de temas relevantes, ouvindo uma amostragem representativa da população (nos moldes do que faz o Datafolha e outros institutos de pesquisa brasileiros). Na análise em questão, os dois pesquisadores avaliaram as respostas de cerca de 2.500 americanos, entrevistados durante as edições de 2006 e 2010 do GSS, sobre temas científicos importantes da atualidade: nanotecnologia, alimentos geneticamente modificados, mudanças climáticas, evolução humana, pesquisa com células-tronco e o Big Bang. As opiniões dos entrevistados sobre tais assuntos foram cruzadas com informações sobre seu nível de escolaridade geral, sobre sua educação formal em ciência (se a pessoa tinha cursado disciplinas científicas no ensino médio e na universidade ou não) e sobre seu nível de alfabetização científica (nesse caso, o GSS submeteu os participantes a testes de conhecimentos sobre ciência). Mais importante ainda, os dados educacionais foram cruzados com fatores como posição política (no espectro entre liberal e conservador, vagamente equivalentes aos nossos “esquerda” versus “direita”), nível de religiosidade e nível de confiança pessoal na ciência (do tipo “confio muito na ciência” versus “não confio em cientistas de modo geral”). Outros estudos já tinham indicado que essas variáveis de posicionamento ideológico têm impacto importante sobre a maneira como as pessoas enxergam temas científicos –às vezes, um impacto até maior do que o conhecimento da pessoa sobre aquele tema. Exemplos disso são áreas como a evolução humana a partir de formas mais antigas de primatas, frequentemente rejeitada pelo público que faz uma leitura “ao pé da letra” do texto da Bíblia, ou o efeito da ação humana sobre o clima, às vezes questionado por quem tem inclinação política conservadora –embora, em ambos os casos, não haja dúvidas na comunidade científica sobre a realidade de ambos os fenômenos. Resultado da análise: nos temas que envolvem crenças religiosas e/ou identidade política (mudanças climáticas, evolução humana, Big Bang e células-tronco), as diferenças de opinião aumentam conforme o nível educacional geral e o conhecimento sobre ciência das pessoas também aumenta. Ou seja: enquanto um liberal com bom conhecimento científico tende a aceitar amplamente o consenso da pesquisa, que diz que o homem é o principal responsável pelas alterações recentes no clima do planeta, um conservador com o mesmo conhecimento razoavelmente bem embasado tende a ter opinião contrária, negando a ação humana. O mecanismo que leva a essa distorção não está claro, mas uma possibilidade, dizem os pesquisadores, é que a pessoa com mais informações sobre um tema tem capacidade maior de enumerar detalhes que apoiem a sua própria posição pré-concebida –mesmo que ela não bata com o que os cientistas propriamente ditos avaliam como o correto.