Flávio Bauraqui, 41 anos, nunca fez tanto sucesso. O ator tem sido cumprimentado pelo trabalho como Evilásio, de Duas Caras, da Globo. O problema é que o ator interpreta Ezequiel, o motorista evangélico do vilão da trama de Aguinaldo Silva. Não entendeu? A semelhança física com Lázaro Ramos confunde parte do telespectador, que o elogia pela interpretação alheia. A atuação convincente como o motorista atormentado por visões, claro, é reverenciada pelo público mais atento. A semelhança entre os dois atores até já inspirou piada no humorístico Casseta e Planeta, Urgente!, da Globo, e diverte nos bastidores da trama. “Sou confundido com o Lázaro e ele comigo, acontece direto. Quando alguém vem me falar do trabalho dele, agradeço e digo ‘obrigado, mas não sou o Lázaro’. Mas se a pessoa está muito empolgada com o encontro, só agradeço e saio correndo”, entrega. Eles acham que foram separados no nascimento? A resposta é negativa. “Quanto mais a gente se conhece, menos se acha parecido.”

Bauraqui ainda está se apresentando para os telespectadores – Duas Caras é a segunda novela em que tem um papel de destaque – talvez isso também explique a confusão. O currículo no teatro e no cinema, contudo, é de deixar muito veterano para trás.

O ator nasceu em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, e começou a se aventurar pelos palcos aos 15 anos. Aluno indisciplinado, foi convocado por uma professora a coordenar um grupo de teatro no colégio para ocupar o tempo com algo útil. Parece que funcionou. “Foi aí que descobri que queria ser ator. Montei o Grupo Improviso, que durou cinco anos e ganhou a minha cidade. Foi um começo bacana.”
Antes de se mudar para o Rio de Janeiro, onde vive, participou de outros grupos teatrais e virou figura fácil em campanhas publicitárias para rádio e TV. Em 1993, decidiu investir no eixo Rio/São Paulo e não parou mais. O currículo hoje tem 60 peças teatrais. Entre os espetáculos que participou, sucessos como Elis – Estrela do Brasil, em que fez o cantor Jair Rodrigues; Obrigado, Cartola!, na pele do cantor e compositor; Crioula, biografia de Elza Soares onde viveu Pelé, e Clara Nunes – Brasil Mestiço, entre outros.

O cinema chegou na seqüência, com Madame Satã (2002), no qual fez o travesti Tabu. Os filmes Quase Dois Irmãos (2004), como Jorginho, Cafundó (2005), como Exu, O Céu de Suely (2006) e Noel – Poeta da Vila (2006), como Ismael Silva, também tinham Bauraqui no elenco.

Por que a televisão demorou para descobri-lo? Porque a TV não gostava dele e ele tampouco do veículo, afirma. O ator fazia parte daquela turma de teatro que torce o nariz para novelas. “Por muito tempo achei que não estava preparado para esse tipo de exposição. Quando decidi que queria TV, comecei a fazer participações especiais em programas da Globo até aparecer um personagem legal. Aí veio o Evaldo de Paraíso Tropical”, lembra, sobre a estréia na teledramaturgia. Impressionado com os trabalhos do artista no cinema, o autor Gilberto Braga o convidou para interpretar o ourives que seria assassinado pela vilã Taís (Alessandra Negrini). “Gilberto falou muito de Madame Satã quando me conheceu, o filme é meu cartão de apresentação.”
O convite para Duas Caras foi encarado com ainda mais tranqüilidade. Sem seguir uma religião, buscou na fé pessoal a inspiração para fazer o motorista evangélico que tem de lidar com visões que não consegue explicar. “Prefiro pegar algo de dentro que fazer imitações.”

O próximo projeto é atacar como cineasta. Ele escreve o roteiro de um curta-metragem e planeja escalar a atriz preferida como protagonista: a mãe, Analice, ex-empregada doméstica que resolveu virar atriz embalada pela trajetória do filho. “Ela ainda é meio verde, mas tem potencial. Acho que sempre foi atriz e não sabia. A gente (ele e os irmãos) era pequeno e ela falava de um jeito engraçado. Eu não parava de rir mesmo quando estava falando sério e acabava apanhando.”