Ela está comemorando 50 anos de carreira em 2008. E mesmo com 73 anos de idade (ela completa 74 em 19 de outubro), sua agenda não lhe permite descansos muito longos. Isso porque Glória Menezes divide seu tempo, hoje, entre as gravações da novela “A Favorita”, na qual vive Irene, com a turnê da peça “Ensina-me a Viver”, atualmente no Rio de Janeiro (no Teatro do Leblon, até 26/10), após uma longa temporada em São Paulo. No espetáculo, que ficou lotado na capital paulista e é dirigido por João Falcão, ela vive Maude, uma senhora de 80 anos apaixonada pela vida cujo destino se cruza com um garoto de 20 anos, obcecado pela morte. O texto é inspirado no filme Harold & Maude, de Colling Higgins. E por falar em cinema, Glória Menezes fez parte de um dos filmes mais importantes da história do Brasil, “O Pagador de Promessas”, vencedor do Festival de Cannes em 1962. Isso, no entanto, não garantiu uma carreira no cinema, e a atriz reclama da falta de convites para filmes. Casada há 44 anos com Tarcísio Meira, ambos são considerados o casal modelo da televisão. Mas Glória conta que não tem nada em comum com o marido, a não ser o fato de se amarem. Projetos para o futuro? Apenas um, conhecer o bisneto que mora nos Estados Unidos. Hoje, a atriz apenas o vê pela internet e confessa que a distância a transformou em uma internauta.

Você está celebrando 50 anos de carreira. Nunca pensou em parar?

GLÓRIA MENEZES – Trabalho só cansa para quem não tem prazer no que faz. Pergunta para o Oscar Niemeyer se ele está cansado de projetar, com 100 anos de idade. Ele vai dizer que não. E agradeço estar com 73 anos de idade e me darem um personagem denso em peças e na televisão. Sair de um Shakespeare e passar, no teatro, para uma doce mulher irresponsável, uma anarquista, uma amoral, é uma raridade na vida de uma atriz. São raros os papéis bons na minha faixa de idade. Estou gravando novela aqui no Rio de segunda a quarta, mas até poucos meses eu passei de quinta a domingo em São Paulo com a peça. Me cansei? De jeito nenhum.

Mesmo “A Favorita”, uma trama das oito, num papel importante. Esta rotina de novela ainda te atrai?

GLÓRIA MENEZES – Não sei o que me cansa mais. Existe um cansaço normal. Funciona assim. Você tem 30 anos e leva X horas para se recuperar. Eu com a minha idade, levo 2X ou mais. É apenas isso. Essa é a diferença. Eu levo mais na minha recuperação, mas no momento que eu estou fazendo, estou inteira, depois eu deito e descanso. Quando eu era mais jovem eu levantava inteira. Hoje, a única diferença é que meu cansaço demora um pouco mais para desaparecer.

Se considera uma exceção no Brasil por conseguir receber convites no teatro e na TV com sua idade?

GLÓRIA MENEZES – Se você quiser contar a história de uma família, seja numa novela, seja num espetáculo, você vai ter que contar a trama envolvendo filhos, pais e avós. Hoje, eu já sou bisavó mas faço avós. Pode ser um papel menor, mas tem seus atrativos e há espaço para eles, mesmo que menores.

“Ensina-me a Viver” fala de um envolvimento com um homem 45 anos mais novo. Se você não fosse bem casada, acha que isso seria possível na vida real?

GLÓRIA MENEZES – Certas pessoas chegam na vida dos outros para modificá-los e não há limite de idade para isso acontecer. Dramaturgicamente, a coisa é linda, é uma poesia, funciona. Na vida real, tudo depende, pode ou não dar certo. Não sei opinar sobre isso. Tem uma frase na peça que diz que “a diferença de idade entre uma mulher de 80 e um garoto de 20 não é tão grande porque o coração de quem não desistiu não envelhece nunca”. Ou seja, não desistir das coisas da vida te torna sempre jovem.

Você tem medo da morte?

GLÓRIA MENEZES – Eu não penso nisso ainda porque tenho tanta coisa para fazer no dia-a-dia que a morte fica em segundo plano para mim. A única coisa que eu quero é continuar bem como estou hoje lá nos 90 anos. Para não precisar ficar dependendo de ninguém, que isso é muito triste.

Nem o envelhecer é um problema para a senhora?

GLÓRIA MENEZES – Para mim, seria ótimo se a gente pudesse chegar nos 50 anos e se manter. O desastre da vida é que depois disso o corpo vai perdendo a força, isso é muito desagradável. A gente devia chegar aos 50 anos e parar. Aí, quando chegasse aos 90 anos, apertava um botão e desligava a máquina. Assim, todos já saberiam até onde viveriam. Assim como estou bem, conheço gente com a minha idade que não está bem.

A senhora ainda faz cenas que sugerem relacionamento sexual em algumas peças. Trata-se do tipo de cena mais complicada de se fazer nesta fase da carreira?

GLÓRIA MENEZES – Há cinco anos, fiz uma peça em que eu tinha câncer, a peça ‘Jornada de um Poema’, com o Diogo Vilela. Tive que raspar o cabelo e encerrava a peça completamente nua no palco. Sem cabelo e pelada. Ou seja, há coisas muito mais complicadas de serem feitas do que relação sexual. Numa carreira de 50 anos, é impossível dizer qual o momento mais difícil.

A senhora fez “O Pagador de Promessas”, um marco do cinema nacional. Mas depois, desapareceu das telonas, por quê?

GLÓRIA MENEZES – Só não faço mais cinema porque não me convidam. Sempre dou o exemplo da Fernanda Montenegro, que se tornou uma atriz de cinema depois dos 70 anos. Antes, ela fez pouco cinema. A Marília, Tônia, também fizeram pouco. Acho que o teatro e a televisão se interagem mais. Mas sinto que os diretores de cinema não vão ao teatro. É difícil você encontrar diretor de cinema em teatro e, por isso, acho que sou pouco escalada.

Seu casamento com o Tarcísio é um dos mais longos da TV. Os anos passam e o casamento fica mais fácil ou difícil de se manter?

GLÓRIA MENEZES – Não há macetes nem fórmulas para se manter um casamento como o nosso. Não há nada que eu possa dizer que possa ser uma razão pela qual nosso casamento tenha dado certo. Acho que a única coisa em comum entre nós é que nós nos amamos. Eu tenho prazer em estar com o Tarcísio e vice-versa. De resto, somos de temperamentos diferentes, temos nossas desavenças, mas o amor é um denominador comum que zera tudo isso. O amor é uma coisa muito complicada, não se consegue forçar ninguém a continuar gostando do outro.

Lembra-se de alguma época complicada no relacionamento de vocês, como o nascimento de um filho ou um trabalho longo fora de casa?

GLÓRIA MENEZES – Eu tenho feito muito mais teatro do que o Tarcísio, então passo quase todos os fins de semana longe de casa. Acho isso até bom, saudável para o casamento. Não é a distância que derruba um casamento. Porque quando a gente se encontra é um prazer enorme. A falta da presença estimula mais voltar pra cama com o seu parceiro. Mas quando a coisa está feia, aí a distância ajuda a cortar de vez o laço matrimonial.

O Amaury Jr. disse uma vez o seguinte: “A Glória Menezes me contou que não coloca a mão no fogo por nenhum homem, pois não acha os homens sexualmente fiéis, nem o Tarcísio Meira”. Então nem o próprio marido você exclui de uma traição?

GLÓRIA MENEZES – Hoje é difícil ser fiel não é mesmo? Embora haja uma liberdade muito grande para as mulheres atualmente, a cabeça delas é mais sentimento, a dos homens é mais sexo. A mulher é capaz de trair, mas por outras razões que não a sexual, bem diferente dos homens.

Aos 73 anos, a senhora ainda faz planos pessoais e profissionais?

GLÓRIA MENEZES – Eu estou com tanto texto para decorar para ‘A Favorita’, pois este personagem é tão grande nesta novela que nem penso em projetos. Se eu colocar mais alguma coisa na minha cabeça é capaz de ela transbordar.

Então não sobra nem tempo para ficar com o bisneto?

GLÓRIA MENEZES – Meu bisneto mora nos Estados Unidos e infelizmente eu ainda não o conheço. Só o conheço pelo Skype, pela bendita internet. Eu adoro o Skype, adoro e-mail, google. Fico plugada o tempo inteiro. Esta tecnologia ajudou muito com minha família. Mas ele vem para cá no Natal e eu vou conhecê-lo finalmente.