– “Já Já (Se essa mulher fosse minha)” – Sinhô – 1926

Se essa mulher fosse minha eu tirava do samba já já / Dava uma surra nela que ela gritava chega, chega, ó meu amor…

– Já em 1926, mulher que caía no samba causava chiliques nos machões. A música fala abertamente em “surra”, “soco”, “pauladas” e outros absurdos. O detalhe aqui é que o homem fica escandalizado com uma mulher que nem dele é.

– “Ai, que Saudade da Amélia” – Mario Lago – 1941

Às vezes passava fome ao meu lado / E achava bonito não ter o que comer / E quando me via contrariado / dizia meu filho o que se há de fazer / Amélia não tinha a menor vaidade / Amélia que era mulher de verdade.

A música entrou no imaginário popular e Amélia virou sinônimo de um certo tipo de dona de casa. Não ter “vaidade” e “achar bonito não ter o que comer” são qualidades inerentes as Amélias. Medo.

– “Emília” – Wilson Batista e Haroldo Lobo- 1942

Quero uma mulher que saiba lavar e cozinhar / Que de manhã cedo me acorde na hora de trabalhar / Só existe uma e sem ela eu não vivo em paz / Emília, Emília, Emília / Eu não posso mais…

Amélia tem uma irmã gêmea. Seu nome é Emília. Assim como na música do Mário Lago, a mulher em questão tem de lavar e cozinhar. Importante o fato de Emília acordar seu homem para o trabalho. Provavelmente, ela ficará em casa cuidando dos filhos e dos afazeres domésticos.

– “Os Homens são uns Anjinhos” – Zeca Ivo e Custódio Mesquita – 1932. “O homens são uns anjinhos e as mulheres verdadeiros diabinhos / Mas mesmo assim o homem quer (…) Todo mal que há no mundo foi a mulher que criou (…) Mulher, a mãe da mentira do pecado e da tentação”.

A culpa é da mulherada. Veja bem, elas são acusadas de provocarem “todo o mal que há no mundo”. Todo! Cruzes!

– “Minha Nega na Janela” – Germano Mathias/Doca – 1956. Eta nega, tu é feia / Que parece macaquinha / Olhei pra ela e disse / Vai já pra cozinha / Dei um murro nela / E joguei ela dentro da pia / Quem foi que disse que essa nega não cabia…

Agressão física e moral sem precedentes, que hoje jamais seria aceita. Além de chamar a mulher de macaquinha, o grosseirão ainda deu um murro nela. Pior, a porrada foi tão forte que ela foi parar dentro da pia. Um típico caso de polícia

– “Mulher Indigesta” – Noel Rosa – 1932 – “Mas que mulher indigesta / Merece um tijolo na testa”

Até tu, Noel Rosa, que conquistou tantos corações? Bater na mulher com um tijolo na testa também daria cadeia.

– “Minha Namorada” – Vinícius de Moraes/Carlos

Lyra – 1962 – “Se você quer ser a minha namorada (…) Você tem que me fazer um juramento / De só ter um pensamento / Ser só minha até morrer (…) Você tem que vir comigo em meu caminho / talvez o meu caminho seja triste pra você (…) Os seus olhos tem que ser só dos meus olhos…”

A música é bonita, muitas mulheres se derretem ouvindo esses versos. Mas exigir um juramento e fazer com que a mulher ‘só tenha um pensamento’ é antiquado e machista. Muita insegurança para um homem só. E um perigo…

– “Na Subida do Morro” – Moreira da Silva e Ribeiro Cunha -1958 – “Na subida do morro me contaram que você bateu na minha nega / Isso não é direito / bater numa mulher que não é sua (…) Cheio de malícia / dei trabalho à polícia pra cachorro / Dei até no dono do morro / Mas nunca abusei de uma mulher que fosse de um amigo…

Lição de ética! Que cada um bata na sua própria mulher. Sem essa de distribuir bordoada na mulher dos outros.

– “Silvia” – Marcelo Nova – 1983 – “Todo homem que sabe o que quer / Pega o pau pra bater na mulher / Ô Silvia…”

Letra impublicável e comentário desnecessário.

– “Me Chama de Cachorra” – Tati Quebra Barraco – 2007

“Me chama de cachorra que eu faço au-au…”

E lá vai o feminismo dançando o “Créu”.

– “Geni e o Zepelim” – Chico Buarque – 1977 – “Joga pedra na Geni / Ela é feita pra apanhar / Ela é boa de cuspir / Ela dá pra qualquer um / maldita Geni”.

Tem mulher apanhando até em metáfora política. Se não fosse o Chico Buarque, não tinha perdão. Pobre Geni.

– “Loira Burra” – Gabriel Pensador – 1993

“Existem mulheres que são uma beleza / mas quando abrem a boca, hum, que tristeza/ (…) bundinha empinada pra mostrar que é bonita / e a cabeça parafinada pra ficar igual paquita / Loira burra, loira burra, loira burra, loira burra…”

Ficou o estigma. Por conta da música, as loiras inteligentes pintaram o cabelo.

– “Mesmo Que Seja Eu” – Roberto e Erasmo Carlos – 1982 – “Você precisa é de um homem pra chamar de seu / Mesmo que esse homem seja eu…”

Aqui, o homem aparece como uma figura protetora, aquele que vai ser o eterno provedor de indefesas donzelas. A vingança feminista é que a melhor intérprete dessa canção é uma mulher, Marina Lima.

– “Eu Gosto é de Mulher” – Ultraje a Rigor – 1987

Mulher de qualquer jeito / Você sabe que eu adoro um peito / Peito pra dar de mamar / E peito pra enfeitar

Em tempos de silicone, essa pérola do machismo até ganha um significado diferente.

– “Vou Contar Tintim por Tintim” – Cartola – “Década de 50” – “Eu fui tão maltratada / Foi tanta pancada que ele me deu / Que estou toda doída / Estou toda ferida / Ninguém me socorreu / Ninguém lá em casa apareceu / Mas eu vou ao distrito / Está mais do que visto/ Isto não fica assim / Vou contar tintim por tintim / Tudo nele eu aturo / Menos tapas e murros / Isto não é para mim”.

Alguém, enfim, deu voz a uma vítima de violência doméstica. Ao menos o valentão irá para o distrito.