Morador de rua em Curitiba (Crédito: Franklin de Freitas)

O Núcleo da Cidadania e Direitos Humanos (NUCIDH) da Defensoria Pública do Estado do Paraná (DPE-PR) entregou, na última terça-feira (07/02), à Fundação de Ação Social (FAS) da prefeitura de Curitiba o relatório “População em Situação de Rua em Curitiba: Uma Descrição Crítica dos Serviços Ofertados às Pessoas em Situação de Rua na Capital Paranaense”. O documento é resultado de um trabalho de fiscalização da Defensoria nos equipamentos públicos municipais de atendimento às pessoas em situação de rua na capital realizado ao longo do ano passado.

Ao todo, foram 24 locais visitados, como unidades de acolhimento institucional, unidade de resgate, casas de acolhida, centros pop, casas de passagem, restaurantes populares e consultório de rua, entre outros. No relatório, a Defensoria também faz 44 sugestões à FAS a fim de colaborar para a solução dos problemas encontrados nos locais. Em todos os equipamentos visitados, além da fiscalização, as equipes da Defensoria aplicaram um questionário sobre regras, público-alvo e serviços fornecidos no local, avaliação da infraestrutura e avaliação de pessoal.

“O principal problema encontrado, que reputo ser muito grave, é a completa ausência de fluxos definidos entre as políticas públicas das diversas áreas voltadas para esse segmento. Há a política de Assistência Social, com seus fluxos internos; a Saúde; algumas atividades de primeiro emprego, mas essas políticas não se conversam. O trabalho acaba dependendo de cada profissional ter a sensibilidade de acionar o colega de outra pasta”, afirma o coordenador do NUCIDH, defensor público Antonio Vitor Barbosa de Almeida.

O defensor citou um exemplo comum de falta de articulação nas unidades: quando é necessário realizar um atendimento emergencial de saúde. “Não há um fluxo definido se alguém apresentar problema de saúde. Alguns entendem que seria o caso de chamar o Consultório da Rua, o que é equivocado. Outros entendem que tem que chamar o SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) ou mandar pra UPA. É uma política falha e extremamente frágil”, comenta Almeida.

Ele lembrou ainda outro ponto crítico: a falta de profissionais psicólogos(as) assistentes sociais e educadores(as) nesses espaços. “É preciso ampliar o quadro de profissionais. Além disso, há uma questão grave, que são os relatos de precariedade nas estruturas, como banheiros sem manutenção, infestação de ratos, fios expostos, deficiência na oferta de locais para banho às pessoas não acolhidas”, ressaltou. Na visita à Casa de Passagem Emergencial Plínio Tourinho, em maio de 2022, por exemplo, foram encontrados ratos no local, como mostram as imagens anexadas ao relatório.

Na avaliação do defensor, essa fiscalização é muito importante para verificar a efetividade dos serviços prestados à população de rua e também o respeito às normas que regem a prestação desse trabalho. As falhas encontradas nos equipamentos têm impacto direto na prestação das políticas a essa população em situação de extrema vulnerabilidade, e podem dificultar a superação da condição de rua. “Do ponto de vista jurídico, podemos concluir que não há condições materiais suficientes [nesses espaços] para que a pessoa em situação de rua consiga superar essa situação de vulnerabilidade”, conclui.

Veja aqui o relatório completo entregue à FAS com as análises e sugestões.

Resumo das sugestões entregues no documento à FAS:

Disponibilizar espaços que assegurem a realização de atividades de lazer, profissionais e de educação nos espaços destinados ao acolhimento de pessoas em situação de rua;
Garantir a salubridade dos banheiros;
Disponibilizar guarda-pertences distribuídos na cidade, assegurando seu uso inclusive por pessoas não vinculadas aos serviços da Assistência Social;
Garantir acesso livre a banheiros públicos para a população em situação de rua;
Realizar concursos públicos, especialmente para educadores(as) sociais, assistentes sociais e psicólogos(as);
Capacitar continuamente os(as) agentes sobre os direitos da população em situação de rua;
Garantir equipes multidisciplinares nos equipamentos destinados ao atendimento da população em situação de rua;
Efetivar o funcionamento do Comitê Intersetorial da População em Situação de Rua (CIAMP) Municipal, assegurando uma fiscalização da política de assistência social da população em situação de rua;
Realizar o censo da população em situação de rua;
Ampliar o cadastro de pessoas em situação de rua no CADÚnico;
Regulamentar o benefício de Aluguel Social, previsto na Lei Municipal n° 14.700 de 2015, a fim de auxiliar a promoção do direito à moradia da população em situação de rua;
Garantir o uso de dormitórios no período diurno e vespertino;
Fiscalizar os serviços prestados pelos(as) agentes de segurança atuantes nos equipamentos de acolhimento institucional, prevendo formação em Direitos Humanos a esses(as) agentes;
Estabelecer fluxo entre os equipamentos de Assistência Social e os hotéis sociais com as demais políticas públicas de saúde, habitação e trabalho, a fim de assegurar a superação da condição de rua;
Extinguir a Unidade de Resgate e Cidadania (URC) e das Operações Integradas, tendo em vista os objetivos da política de assistência social à população em situação de rua;
Ampliar o acesso à alimentação gratuita nos Restaurantes Populares, sem a necessidade de vínculo com algum equipamento de acolhimento institucional;
Fornecer água potável, especialmente em locais de grande circulação de pessoas em situação de rua;
Assegurar a prestação de serviços de saúde às/aos cidadãs(os) em situação de rua, sem a exigência de documentação ou comprovante de residência.