Rovena Rosa/Agência Brasil – Justiça reconheceu vínculo empregatício de um pastor que atuou por oito anos para a Igreja Universal do Reino de Deus.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) mandou a Igreja Universal do Reino de Deus devolver R$ 204,5 mil a uma professora de São Paulo que teria sido coagida a ofertar todo seu patrimônio à instituição religiosa. A decisão, da 29ª Câmara de Direito Privado do TJ, publicada nesta quinta-feira, 10, manteve sentença da 4ª Vara Cível do Foro Regional de Itaquera, na capital, que já havia dado ganho de causa à mulher. Em nota, a Universal nega a coação e informa que vai recorrer.

Segundo os autos, a mulher começou a frequentar a igreja e realizou vários depósitos financeiros por acreditar que seria uma forma de validar sua fé. A professora enviou R$ 7,5 mil para a igreja em dezembro de 2017 e, em julho de 2018, transferiu outros R$ 197 mil. Conforme o processo, tempos depois de entregar a maior soma que possuía, oriunda de indenização trabalhista, a doadora e a filha ingressaram com ação judicial alegando que o ato comprometeu a subsistência da família.

Em março do ano passado, o juiz Carlos Alexandre Böttcher declarou a nulidade das doações, alegando que a professora foi vítima de coação, “considerando as pressões psicológicas empreendidas pelos membros da organização religiosa para a realização de tais ofertas na campanha denominada Fogueira Santa”, como disse na decisão que foi objeto de recurso ao TJ.

O relator do recurso, desembargador Carlos Henrique Miguel Trevisan, destacou que a apreciação do caso pela Justiça não configura interferência na liberdade de crença ou prática religiosa. “Trata-se apenas da aplicação de um controle judicial legítimo sobre atos que afrontam direitos fundamentais do ser humano, quais sejam, dignidade, boa-fé e honra”, explicou.

Disse ainda “não ser razoável dispensar a uma entidade religiosa, qualquer que seja a doutrina por ela professada, uma espécie de imunidade jurídica pelo simples fato de lidar com questões e regras espirituais”.

O magistrado destacou ter ficado comprovado que a ofertante, que recebe salário de R$ 1,5 mil e vive com marido e filha desempregados, passou a suportar crise financeira após a doação. “Além de a liberalidade ter atingido todo o patrimônio das autoras, não houve reserva de renda ou parte idônea para sua subsistência”, escreveu. Os desembargadores Silvia Rocha e Mário Daccache completaram a turma julgadora. A decisão foi unânime.

Lei prevê ofertas e liberdade religiosa, diz igreja


Em nota, a Igreja Universal do Reino de Deus informou que vai recorrer da decisão ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), “com a absoluta certeza de que a decisão será revertida, fazendo com que a justiça e a verdade prevaleçam”. A Universal reforçou que faz seus pedidos de oferta de acordo com a lei e dentro do exercício regular do seu direito constitucionalmente assegurado de culto e liturgia.

“Desta forma, exatamente em razão da liberdade religiosa, não é possível qualquer tipo de intervenção do Estado – incluindo o Poder Judiciário – na relação de um fiel com sua Igreja.” A Universal lembrou que a autora da ação é professora de escola pública, “uma pessoa esclarecida, bem formada e informada, que conseguiu ser aprovada em um concurso público, sendo totalmente capaz de assumir suas próprias decisões”. Disse, ainda, que a mulher foi membro da Igreja por 18 anos, “conhecida profundamente seus rituais litúrgicos e jamais alegou ter sofrido qualquer tipo de ‘coação'”.