Neurologistas já comprovaram que quando uma pessoa conta uma mentira relativamente plausível, seu cérebro utiliza mais funções do que quando fala a verdade, já que sente necessidade de selecionar cuidadosamente o que vai ser falado, dar aos argumentos uma sequência lógica enquanto esconde e manipula comportamentos que poderiam invalidar a história contada.

Verdade e mentira competem entre si, e nem sempre é fácil detectar, pois ambas constituem conceitos repletos de subjetividade, já que pessoas diferentes veem o mesmo fenômeno com interpretações diversas, e a verdade é sempre dependente de muitos fatores, como religião, idade, experiências anteriores e etapa educacional.

A procura da verdade num contexto judicial, por exemplo, certamente é um dos maiores desafios que advogados e psicólogos enfrentam, pois mentir é um processo psicológico pelo qual um indivíduo deliberadamente tenta convencer outra pessoa a aceitar aquilo que o próprio indivíduo sabe que é falso, em benefício próprio ou de outros, para maximizar um ganho ou evitar uma perda; é ato instintivo e funciona algumas vezes como uma arma de preservação social. Mas afirmar uma verdade muitas vezes está na estreita dependência de preconceitos assimilados em tenra idade, em atitudes e valores comunitários algumas vezes perversos, já não percebidos ao longo dos anos.

Crianças educadas em ambientes racistas tendem a ver isso como um valor comunitário, necessitando um processo educativo intenso e amoroso para renunciar ao comportamento absurdo.

Outros profissionais, como médicos ou delegados por exemplo, precisam também aprender a identificar quando um cliente, ou um suspeito de crime, está mentindo, pois sua própria vida ou a de outras pessoas pode estar em risco. Afinal, pode-se mentir por ocultação, quando informações verdadeiras são omitidas, mesmo quando informações falsas não são apresentadas; e muitas vezes pode-se dissimular, apresentando falsidades como verdades.

No entanto, mesmo animais “mentem”, que o digam donos de bichos de estimação, já que estes podem aprender a exibir comportamentos absolutamente fora da realidade, como simular cansaço quando querem ser carregados; e assim apesar da valoração negativa do fenômeno, é possível perceber  alguns aspectos positivos, pois profissionalmente mentiras podem ser vistas como uma certa habilidade no processo de comunicação, na resolução de problemas com chefias e clientes, em negociações complexas. Algumas mentiras são vistas inclusive como “caridosas”, quando não se deseja magoar amigos e companheiros.

Isso de certa fora torna a mentira um fenômeno importante em relacionamentos pessoais, área em que a comunicação não verbal, envolvendo gestos, modulações de voz, expressões faciais, postura corporal, pode facilitar ou ao contrário prejudicar enormemente a convivência.

No entanto, mentiras, mesmo as “sinceras” muitas vezes ocorrem mediadas pela ação do sistema nervoso autônomo, responsável por uma série de funções involuntárias como sudorese, batimentos cardíacos, alterações na respiração, dilatação da pupila. Disfarçar sentimentos e intenções requer manipular expressões faciais, não ficar nervoso, fazer relatos coerentes, não descuidar detalhes e, principalmente, memorizar a narrativa para não cair em futuras contradições.

É mais fácil detectar mentiras em pessoas com as quais se convive muito, pois determinados padrões comportamentais de quando se fala a verdade, podem ser comparados àqueles de quando se tenta mentir.

Muitas pesquisas acadêmicas têm buscado determinar os fundamentos neurobiológicos do comportamento mentiroso, especialmente para os casos da mentira patológica. Em tempos de Fake News, de verdades muito pouco sinceras, de manipulações monstruosas para retirar de cada evento o maior lucro possível, é mais do que nunca necessário entender o mecanismo.

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.