CULTURA MONTAGEM
(Fotos: Kevin Mazur/WireImage for Live Nation e Franklin de Freitas)

Embora pareçam muito diferentes, a rainha do pop Lady Gaga e os reis do nu metal System of a Down (SOAD) têm muito em comum. Ambos usam a arte e a música para defender pautas políticas e sociais, têm o controle absoluto de suas carreiras, geram uma espécie de devoção em seus fãs, além de influenciarem muito mais que a música, mas a moda e comportamentos. Eles usam arte para fazer a sociedade pensar sobre temas mais que relevantes, mas necessários. Eles são quem são, sem se afetar pelas pressões sociais e de imagem.

Bandeiras sociais

Lady Gaga, que fez um megashow na praia de Copacabana no Rio de Janeiro no último sábado (3), usa com maestria sua plataforma e sua arte para abordar questões sociais, de luta, dos direitos das mulheres, direitos reprodutivos, direitos da comunidade LGBTQIA+, saúde mental e etarismo, entre outras lutas.

Um dos exemplos é a fundação Born This Way, em referência à música de mesmo nome, criada em 2012 por Lady Gaga e sua mãe, Cynthia Germanotta. A organização cuida da mental de jovens LGBTQIAPN+ e oferece ações de suporte emocional e recursos educativos voltados para o bem-estar e inclusão. Em 2009, a aliás, a cantora Lady Gaga discursou pela primeira vez sobre os direitos da causa LGBTQIAPN+ na Marcha Nacional pela Igualdade, em Washington. Ela enfatizou a necessidade de mudança imediata e ação, exigindo que os direitos das pessoas lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e da comunidade queer em geral fossem protegidos em todos os estados dos EUA. Em fevereiro deste ano, a cantora, que venceu o prêmio Grammy na categoria de Melhor Performance de Duo/Grupo Pop, dedicou a estatueta à comunidade trans e declarou: “Pessoas trans merecem amor. A comunidade queer merece ser elevada”, uma resposta r às medidas antitrans recentemente aprovadas pelo presidente estadunidense Donald Trump.

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Lançada em 2015, a música Til It Happens to You foi escrita para o documentário The Hunting Ground, que trata de casos de abuso sexual em universidades dos Estados Unidos. A canção ganhou destaque ao ser apresentada por Lady Gaga no Oscar de 2016, ao lado de sobreviventes de violência sexual. Na ocasião, a artista revelou publicamente que também foi vítima de estupro aos 19 anos, experiência que influenciou sua relação com a música e seu envolvimento com o tema.

System of a Down, que fez show em Curitiba na terça (6) no Estádio Couto Pereira, e segue em turnê pelo Brasil, é conhecida por suas letras politicamente conscientes e músicas que frequentemente abordam temas  “pesados”, como genocídio, guerra e crítica social. É formada por Shavo Odadjian, nascido na Armênia, enquanto Serj Tankian e John Dolmayan são do Líbano e Daron Malakian é americano, mas todos também têm ascendência armênia.

A banda se tornou um símbolo de resistência e ativismo, com suas músicas sendo usadas em manifestações e movimentos sociais. Muitas letras da banda falam sobre a crueldade e a inutilidade da guerra, como em “B.Y.O.B.” (Bring Your Own Bombs).  O System of a Down critica sistemas de poder e as desigualdades sociais, como em “Chop Suey!” e “Prison Song”.  A SOAD defende a liberdade de expressão e os direitos das minorias, incluindo a população armênia.  A banda tem um forte apoio à causa armênia e ao reconhecimento do genocídio armênio.

Devoção e coro de fãs

Só quem pode conferir de perto shows de Lady Gaga e SOAD pode notar o incrível magnetismo que esses artistas causam nos fãs. Não é à toa que tanto o show de Lady Gaga no Rio e quanto na apresentação do System of a Down em Curitiba é impressionante o coro dos fãs que acompanha os artistas durante todo o show. Quase não se ouve de conversa paralela, poucos se movem na plateia para buscar uma cerveja.

Os fãs ficam vidrados em seus ídolos e cantam as letras das músicas inteiras. No caso do SOAD, até as mais longas e cantadas em armênio. E mesmo quem não viu ao vivo, pode se emocionar com os milhares de vídeos postados dos shows nas redes sociais.

A devoção é tanta que os shows destes artistas se assemelham a cultos. No caso de Lady Gaga, apelidada de Mother Monster, os fãs são chamados de “little monsters”.

Influência na moda e comportamento

Uma mulher que se veste como Lady Gaga não é comum. Homens que cantam em inglês e armênio músicas longas de nu metal não são comuns também. Mas os dois não só influenciam só a política e a música, mas também a moda, a maneira de se portar.

No megashow de Lady Gaga eram milhares de fãs vestidos como ela, nas mais diversas fases da cantora. Havia até fãs vestidos de carne bovina, igual ao que ela vestiu naquele 12 de setembro de 2010 no MTV Video Music Awards. As roupas, cabelos, sapatos são copiados.

Já os integrantes do SOAD Os membros da banda geralmente optam por um estilo casual, com camisetas, jeans, e outras roupas que refletem a liberdade de expressão e a postura anti-establishment da banda, claro com preferência pelo preto. Em alguns momentos, os membros da banda incorporam elementos da cultura armênia em suas roupas, como peças que remetem à história e às tradições do país.

No show de terça na capital paranaense, além das tradicionais camisetas pretas de “banda”, muitos fãs estavam maquiados e vestidos com as cores “preferidas” da banda. A cor principal associada ao System of a Down é o vermelho, devido à sua ligação com a bandeira da Armênia, país de origem de muitos dos membros da banda. Azul, o laranja e o preto, que aparecem na bandeira armênia, também aparecem no palco ne plateia emocionada.

Lady Gaga e System of a Down cuidam de suas carreiras

Ambos também têm domínio sobre suas carreiras. Lady Gaga tem um forte controle sobre a sua carreira, desde as suas criações musicais e visuais até a sua imagem e a sua marca pessoal.

Gaga tem também uma forte visão de negócios e tem criado a sua própria marca, a Haus of Gaga, que se estende por várias áreas, como música, moda, cosméticos e cinema. Ela é uma empreendedora de sucesso que controla a sua marca e a sua distribuição, utilizando as suas redes sociais para interagir com os fãs e construir a sua comunidade.

A banda System of a Down também é do tipo que decide o que faz. A decisão de tocar em shows, lançar música ou pausar as atividades é tomada exclusivamente pelos membros da banda. Não cedem à pressão do mercado.

O poder além da música

Lady Gaga e a banda System of a Down mostram que o poder da música vai muito além das partituras. Pode transformar a vida de pequenas e grandes comunidades, instalar a dúvida para que o retrocesso não se estabeleça, e as minorias não sejam injustiçadas. Se todos os artistas soubessem o tamanho do poder que têm nas mãos, o mundo seria um lugar muito mais justo.

*Josianne Ritz teve a sorte de estar no show de Lady Gaga no dia 3/05 no Rio de Janeiro e na apresentação do System of a Down em Curitiba no dia 6/05.