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Espectrômetro do Centro Multiusuário de RMN da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que integra o Centro de Ciências Forenses da Universidade. Foto: Gabriel Costa

Além de ajudar na identificação de novas substâncias psicoativas, como acompanhamos na segunda reportagem da série Além da Ficção, a Ressonância Magnética Nuclear também é aplicada na autenticação de medicamentos. No Centro Multiusuário de RMN da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que integra o Centro de Ciências Forenses da Universidade, esse trabalho já vem sendo feito há anos — e, muitas vezes, contribui para tornar o dia a dia das pessoas um pouco mais fácil. Você já sabe: ciência forense não é só sobre morte. Mais do que isso, é sobre vida.

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No Laboratório, os três pilares da educação pública são levados a sério: pesquisa, ensino e extensão. Isso significa devolver à sociedade o conhecimento e os serviços que a universidade produz. Lá, por exemplo, são feitas análises gratuitas de amostras de medicamentos — uma ajuda importante para quem precisa, por diferentes razões, confirmar o que está tomando.

Medicamentos

Algumas dessas histórias são tão gratificantes que chegam a levar os cientistas às lágrimas. Foi o caso de uma criança com epilepsia, que dependia de um medicamento à base de canabidiol (CBD), importado dos Estados Unidos. À época, por volta de 2021, não havia produção nacional da substância, e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) exigia a comprovação de que o remédio continha apenas o CBD, sem a presença de THC — o composto psicoativo da cannabis. O pai da criança chegou à Polícia Civil, que o encaminhou ao laboratório da UFPR. A equipe não hesitou.

“Assim que o pai chegou, a gente se reuniu — eu, a Ana, a Maria — e fizemos a análise imediatamente. Isso era de noite, e ficamos até umas dez horas”, lembra o professor Andersson Barison, do Departamento de Química.

O laudo confirmou que o medicamento estava regular, e a autorização de importação foi liberada.

“Teve até comemoração aqui no laboratório”, diz Barison. “Ajudamos aquela criança e, com isso, muita gente. São essas coisas que não têm preço. Só esse caso já justificou todo o investimento nesse equipamento.”

Além do caso envolvendo medicamento controlado, o laboratório também atua em situações um pouco mais midiáticas. Um exemplo é a análise de supostos “emagrecedores naturais” vendidos nos mais diversos lugares. Em muitos casos, os produtos, comercializados como fitoterápicos, escondem substâncias controladas.

“Era pra ser natural, mas estava cheio de medicamento controlado”, conta o professor Andersson Barison. “Medicamentos que podem causar problemas graves de saúde. Alguns continham diuréticos tão potentes que, dependendo da dose, poderiam até levar à morte”, complementa o cientista.

O Laboratório também possui compromisso com a educação da sociedade à respeito dos temas em que atuam. Regularmente, recebe visitas de escolas com crianças que aprendem, na prática, como a ciência funciona.

“Elas mesmas usam o equipamento e fazem análises simples, como verificar se um azeite de oliva é autêntico ou não. A gente explica rapidinho e elas conseguem fazer a comparação. É bem legal”, relata Barison.

Ciência forense: atuação na pandemia de COVID-19

Durante a pandemia de Covid-19, o Laboratório ganhou destaque em veículos de imprensa de todo o país. Uma das principais preocupações do período foi a venda de álcool em gel adulterado — os rótulos indicavam uma concentração de etanol que, na prática, não se confirmava.

“Esse foi o trabalho mais importante que a gente fez aqui, que realmente contribuiu para o combate à Covid-19”, conta Barison.

Segundo ele, cerca de 80% das marcas comercializadas não apresentavam a quantidade mínima de etanol exigida. Diante disso, o Laboratório desenvolveu um método, com base em uma licença, para quantificar o teor de etanol por meio da Ressonância Magnética Nuclear. E o mais importante: o protocolo foi disponibilizado gratuitamente para todo o país. Qualquer pessoa, de qualquer lugar, podia enviar amostras para análise.

“Essa foi a principal contribuição do laboratório para o mundo”, destaca Barison, com emoção.

A coleta e preparação da amostra é um processo simples: “Ela é colocada nesse tubinho aqui, que parece uma caneta BIC”, explica Barison.

Se o material for líquido, ele pode ser analisado diretamente. Já substâncias sólidas precisam ser dissolvidas em solventes especiais — geralmente aqueles sem hidrogênio, para não interferirem na leitura. Depois, a amostra é inserida no espectrômetro para gerar o espectro.

“A análise em si é fácil. O desafio é interpretar os dados — e é aí que vem a parte legal”, comenta o professor.

Com a técnica, é possível identificar praticamente qualquer substância, independentemente do contexto em que ela aparece.
Se nesta reportagem exploramos a relação entre ciências forenses e a saúde, na próxima vamos seguir por outro caminho: a identificação da origem dos mais diferentes tipos de substâncias. Sabia que um laboratório da UFPR ajuda a investigar crimes internacionais?

Ciência forense, além da ficção

Com um trabalho tão amplo, é impossível contar todos os casos, histórias e curiosidades do Centro de Ciências Forenses da UFPR em apenas uma reportagem. Por isso, a Agência Escola UFPR se debruçou sobre o tema em uma série repleta de momentos marcantes.