O mundo parecia ter dado uma trégua em suas lutas durante a espera pela definição das eleições norte-americanas, mas tão logo veio a confirmação da vitória de Barack Obama, os atores de costume voltaram a brigar. Os atentados terroristas de Mumbai, na Índia, fizeram-nos recordar o 11 de setembro. Muçulmanos do grupo Mujahedin de Deccan atacaram durante quase 60 horas dois hotéis 5 estrelas, a estação de trens e o sofisticado restaurante Café Leopold, com um saldo de 183 mortos. O 1º Ministro Manalohan Singh demorou a ir à TV pedir calma e é acusado de fraco por não declarar nova guerra contra o vizinho Paquistão que não consegue controlar os radicais que estão infiltrados inclusive no ISI, o Serviço Nacional de Inteligência. No outro lado da península indiana e também às margens do Oceano Índico, ferve a política tailandesa num país cujo Rei, Bhumibol Adulyadei de 81 anos, está no trono desde 1946 apesar dos dezoito golpes de estado que testemunhou. O Partido do Poder Popular (PPP), de base rural, que governava, foi extinto por decisão da justiça e o 1º Ministro Somchai Wongsawat perdeu o cargo. A oposição, da Aliança Popular pela Democracia que representa as classes urbanas mais favorecidas, embora tenha perdido as últimas eleições, tomou prédios públicos e o aeroporto, mantendo a tradição de demitir governos pela via dos protestos nas ruas e da aliança com os militares. O líder do PPP, o magnata das telecomunicações Thaksin Shinawatra, hoje exilado, quando no governo (foi derrubado pelo exército em 2006) desenvolveu políticas populistas favoráveis aos estratos mais pobres do norte e ainda tem grande apoio no país. A situação é explosiva. A Tailândia com seus 66 milhões de habitantes, quase todos budistas, tornou-se um tigre asiático nos últimos anos e vinha resistindo bem à atual crise econômica, mas agora afunda nas garras de seus políticos. Na África, tirando os piratas que se divertem na costa da miserável Somália, o Zimbábue declarou estado de emergência médica pelo colapso do sistema de saúde e uma epidemia de cólera, enquanto o governo de Robert Mugabe segue paralisado pela exigência internacional de formar um governo de coalisão com o líder oposicionista Morgan Tsvangirai. Mesmo depois de ter cortado dez zeros da moeda nacional, o Tesouro acaba de imprimir uma nova nota, de cem milhões de dólares zimbabuanos, que vale cerca de mil dólares americanos.
Nas Américas, o caso mais crítico é o do México onde, no mesmo dia em que a primeira parte do pacote de ajuda dos EUA (US$ 200 milhões de um total de US$ 1,4 bilhão) para combate ao narcotráfico, o Plano Mérida, foi liberada, anunciou-se que o número de assassinatos relacionados ao crime organizado já chegou a 5000 este ano, devendo dobrar até o final de dezembro os 2700 perpetrados no ano passado. Já na Venezuela, o coronel Hugo Chávez continua agindo como se a oposição a nada tenha direito e acaba de federalizar os serviços de saúde e segurança de Caracas, num ato publicado às vésperas da posse do novo prefeito eleito Antonio Ledezma (a Polícia Metropolitana já fora transferida para o Ministério do Interior em janeiro). Fez o mesmo com os municípios grandes, em geral capitais de estados, onde foi derrotado no último pleito. O prefeito da cidade de Sucre, Carlos Ocariz do Partido Primeiro Justiça discursou para o povo em sua posse: “Se nos fecharem as portas, sairemos pelas janelas”. No vizinho Equador, o jovem e afoito Presidente, o economista Rafael Correa, resolveu não pagar um terço da dívida externa, no valor de US$ 3,8 bilhões (a vencer a partir de agora em Bônus Brady), com o que jogará o país em moratória, mas “com responsabilidade” segundo declaração da Ministra das Finanças Maria Elsa Viteri, sem explicar o significado da expressão, mas dizendo-se disposta a uma grande confrontação com o sistema financeiro internacional. A Corte de Haia aceitou demanda da Chevron contra um débito equatoriano não pago de US$ 1,6 milhão e até o pacato ministro brasileiro Celso Amorim deu sinais de reação diante da ameaça de calote ao BNDES, que poderá ser copiado pelo Paraguai e, se der certo, pelos demais devedores da região. O Canadá também enfrenta problemas, com a Governadora-Geral e representante da Rainha Elizabeth II acatando o pedido do 1º Ministro conservador Stephen Harper para fechar o Parlamento até 26 de janeiro (sem dissolvê-lo) a fim de evitar a aprovação de um voto de desconfiança proposto por uma coalizão majoritária dos liberais com o Partido da Nova Democracia e o temido Bloc Québécois formado pelos separatistas da província francesa do Québec. A revolta é contra atos do governo que eliminou subsídios aos partidos políticos e retirou o direito de greve dos servidores públicos. Estes quatro países têm sido afetados pela crise global que fez o barril do petróleo, seu principal ativo, atingir o mais baixo preço em quatro anos (44 dólares). A OPEP reúne-se dia 17 na Argélia e o ministro saudita do petróleo, Ali Naimi, promete fazer o que for preciso, mas até uma redução na oferta não deve produzir maiores efeitos, pois a demanda internacional continua em ativa tendência de queda.
Vitor Gomes Pinto
Escritor. Analista internacional