O coronel Hugo Chávez Frias está preocupado, ao sentir o tremor do chão onde pisa, e muda gradativamente seu discurso. Faltam-lhe dinheiro, pois o preço do petróleo segue em queda livre; poder, pois a oposição tem possibilidades de conseguir importantes vitórias no pleito de domingo; e um inimigo, pois Bush está de saída. Foram-se os tempos em que o “crudo” venezuelano atingia a marca de 150 dólares o barril (julho de 2007) e ele ameaçava com o preço de 200 dólares caso os EUA atacassem o Irã e a seu país. Em julho último, com o barril a U$ 129, garantiu à Espanha do rei Juan Carlos, que recém lhe ordenara calar-se, petróleo por cem anos com 22% de desconto. Em setembro afirmou não estar preocupado com a Venezuela e sim com o mundo para finalmente, na última semana, com o barril a U$ 46, reconhecer que “não somos invulneráveis”. O orçamento para o ano que vem foi feito com o petróleo, que representa mais de 90% da arrecadação, a U$ 60, e agora não existem fundos – a não ser que lance mão das reservas nacionais que afirma serem de U$ 40 bilhões – para financiar subsídios ao Petrocaribe que tem dezoito participantes, aos programas sociais, à obesa folha salarial da PDVSA (11 mil novos funcionários este ano) e aos países amigos.
As eleições de 23 de novembro são as primeiras após a única derrota sofrida por Chávez (em 2006 quando tentou aprovar uma constituição mais socialista) em seus nove anos e dez meses de governo e se realizam sob uma inflação de 30% e com escassez de gêneros de primeira necessidade. O voto não é obrigatório para os 16,9 milhões de eleitores habilitados que escolherão 22 governadores de estado, 328 prefeitos e 233 legisladores estaduais. Há 59 partidos nacionais, 236 regionais e o dobro em grupos de eleitores de alcance municipal, mas o que importa é o Partido Socialista Unido da Venezuela, o PSUV da situação e a Unidade Nacional (UN), um bloco de mais de vinte agremiações políticas oposicionistas. A previsão é de que a situação vença na maioria dos estados e no cômputo total. Contudo, o futuro do país será de quem se impuser no chamado “corredor eleitoral” formado pelos sete estados mais ricos e populosos que reúnem 60% dos eleitores e da população. Nos três grandes, Zulia, Carabobo e Miranda, o favoritismo é da oposição, com luta muito acirrada no último onde Enrique Caprile Radonski da UN enfrenta a Diosdado Cabello, atual governador e um ícone do chavismo (foi quem o soltou após o golpe de 2002). Em outros dois, Lara e Aragua, deve ganhar a situação, enquanto em Anzoátegui e no Distrito Capital (Libertadores) a disputa é parelha. As pesquisas proporcionam resultados desencontrados, de acordo com quem as promove, mas a oposição que imaginava ganhar em dez estados, deverá satisfazer-se com cinco, o que é um grande avanço em relação a quatro anos atrás quando elegeu somente os governadores de Zulia e Nova Esparta.
Nos pleitos locais, há desafios cruciais. Na cidade de Sucre, p.ex., onde fica o bairro popular de Petare, um dos maiores da América Latina de fala espanhola, um triunfo oposicionista (seu candidato Carlos Ocariz é favorito) desmentiria a idéia de que os pobres sempre apóiam o chavismo. E em Maracaibo, capital de Zulia (onde está o petróleo), é quase impossível derrotar Manuel Rosales, o arquiinimigo de Chávez por tê-lo enfrentado nas últimas eleições presidenciais. Em geral as classes média e rica e os de melhor nível educacional votam contra Chávez que entrou na campanha para polarizá-la em torno de sua figura. Nos últimos dias, ameaçou invadir Carabobo com tanques se, como o indicam as enquetes de opinião, o candidato oficial for derrotado, chamou o governador de Sucre, Ramón Martinez (a quem quer colocar na cadeia junto com Rosales), de “traidor asqueroso” e ocupou um aeroporto local, além de afirmar que não enviará recursos federais aos estados e municípios que o derrotarem e permitir que alguns fortes candidatos adversários fossem inabilitados arbitrariamente pela Justiça Eleitoral. Para atormentar ainda mais ao Presidente, há forte possibilidade de que dissidentes do chavismo, que se recusaram a aderir ao PSUV e agora, a exemplo de Martinez, são diariamente xingados, conquistem o poder em Guárico, Portuguesa e até em Barinas, a terra natal do Presidente que é hoje governada pelo pai e tem um irmão, Adán Chávez, concorrendo ao governo. Os dissidentes podem aliar-se à oposição, formando um importante bloco de pelo menos oito governadores que poderá crescer e, caso consiga manter-se unido, no futuro desafiar o exclusivismo de Chávez.
Vitor Gomes Pinto
Escritor, analista internacional