Um dos artistas paranaenses de maior sucesso no trânsito internacional de exposições, Marcelo Conrado participou de inúmeros eventos artísticos no exterior, em 2008. Começando por uma exposição no Museu Alfredo Andersen, em Curitiba, Marcelo prosseguiu expondo em Lisboa, seguiu para Frankfurt, na Alemanha e continuou vendendo muitas obras em galerias internacionais – o que é importante para o artista.
Já escrevi que a obra de Marcelo se traduz como uma pintura-gráfica depurada, nervosa, que possui uma qualidade muito forte em sua auto-presença como obra de arte. Ela se corporifica e se representa nela mesma, pois lhe subjaz uma linguagem que, apesar de não ser um código de significados, não deixa de se constituir tal qual uma gramática de formas.
As pinceladas passam a configurar uma composição estética que indica claramente a questão da autoria, mesmo naquelas obras que se afastam um pouco da expressão em comum e cuja similaridade só pode ser detectada em pontos específicos. Entretanto, sua arte é tão marcante, que estes pontos escassos são mais do que suficientes para o imediato reconhecimento. O mecanismo pelo qual ele denota sua autoria é difícil de ser manejado. Não há nenhuma obra igual à outra, mas todas compartilham de um mesmo território. Ele utiliza códigos abstratos que se referem, se não a ele mesmo, à sua linguagem artística.
É extremamente árduo o desenvolvimento e conseqüente aquisição de um ferramental como este, pois ele é constituído da linguagem da pintura somada à da expressão gráfica não figurativa. Nela deve haver uma coerência de formas, de aplicação de tinta, de traçado, de gestual, de modo que a própria composição passe a assinalar, não somente a questão da autoria como a da seqüência, da seriação, da plástica.
Olhando uma pintura de Conrado e conhecendo sua obra, imediatamente a identificamos. Em outras palavras, sua pintura traz em seu âmago a autoria. Âmago que pode ser duplamente definido: como componente da pintura e como referente ao próprio íntimo do artista.
A ausência de cores contrastantes ou fortes e a persistência de um padrão monocromático acrescentam – em vez de tirar – mais uma qualidade ao seu trabalho.
Se a paleta colorida facilita o trabalho dos artistas pela variedade das cores nas obras, diferenciando-as umas das outras, Conrado – ao prescindir voluntariamente deste recurso – faz com que lhe seja muito mais difícil manter a identidade de suas pinturas.
Comparando com a música, suas obras assemelham-se a uma série de sinfonias compostas como variantes do mesmo tema, cabendo ao artista a complexa tarefa da sutil diferenciação entre cada uma delas, uma vez que a diversificação fica restrita aos exíguos limites auto-impostos pelo artista.
O tcheco Františec Kupca (1871 – 1957), ligado à abstração do Orfismo, comparou as formas não-objetivas com desenvolvimentos na arquitetura, música e até na semântica. Disse ele: “Fugas, nas quais as notas surgem como reais entidades físicas, entrelaçam-se, vêm e vão.”
A abstração nas obras de Conrado tende
a se afirmar como essência, ou síntese dos seus conhecimentos artísticos somados às pesquisas do pintor. Ele nos apresenta em suas telas os novos ângulos e abordagens das formas reelaboradas deste repertório. Estas formas, correlacionadas a reminiscências, associações mentais, memórias, tempo, espaço e movimento embutidos nos trabalhos sugerem a presença humana. Assim, suas linhas e superfícies na pintura são expressões de vida, denotando algo semelhante a alguns aspectos da obra em desenho vivencial de Joseph Beuys (1921-86).
Marcelo nos propõe enigmas em suas obras. Ao lado da gramática de formas, há uma outra espécie de charada onipresente e que, na verdade, nos permite uma descoberta: a linguagem artística do pintor se traduz tal qual uma verdadeira escrita.
Não no sentido de fraseologia ou texto mostrando seqüência de palavras, mas no modo como ele organiza e joga com as formas, manejando seus pincéis. Se numa frase gramatical temos o sujeito, verbo e complementos, em sua obra encontram-se suas respectivas equivalências. Estes elementos se distribuem no espaço e se arranjam como sentenças pintadas em artes plásticas, transformando os trabalhos em paráfrases, ao apresentar inúmeras soluções para as composições e formas.