A fotografia, como tradicionalmente a conhecemos, está por acabar. Creio que a proliferação de imagens que o sistema digital proporciona não somente estimula a multiplicidade – através das câmeras fotográficas e da facilidade da multiplicação de clics – como facilita em muito o ato fotográfico. Não falo aqui da ação, vamos dizer clássica de um fotógrafo quando trabalha com sua câmera, mas daquelas imagens que qualquer adolescente vai tirando ao léu e que são provenientes, na maioria das vezes, de seu celular e não de uma máquina fotográfica propriamente dita.

Aliás, excetuando-se as câmeras profissionais de marcas tradicionais – falo das que restaram, pois muitas delas tiveram que ceder ao progresso – a grande parte de imagens vistas hoje em dia, tanto na Internet quanto em noticiários televisivos é proveniente de celulares.

Entre as câmeras que lamentavelmente deixaram de ser fabricadas destaco a câmera Polaroid, que era resultante de um processo ímpar de captação e revelação da fotografia. O objetivo maior daquela máquina para o público – e também o motivo de sua venda – era justamente, em primeiro lugar, verificar como a foto saiu e depois salvar o resultado, coisa que qualquer celular hoje faz na hora – sem ter que esperar a revelação que durava um pouco e que parecia um tempo ainda maior para quem aguardava ansiosamente pelo resultado.

Além do melhor resultado, o custo elevado do filme diferenciado da Polaroid levaram a determinar o final de sua produção. O processo desenvolvido pela Polaroid Corporation utilizava um filme composto por muitas camadas que incluíam uma especialmente feita para capturar a fotografia, seguida de um reagente que atuava ao mesmo tempo como agente fixador da foto, mais camadas das cores primárias aditivas alternadas com camadas das cores primárias subtrativas. As cores primárias aditivas são azul, verde e vermelho; as subtrativas são alaranjado, verde e violeta. Cada foto ao ser retirada da câmera dava início ao processo de revelação ao impressionar as camadas de prata das cores aditivas bloqueando a revelação das cores subtrativas. A fotografia colorida é então resultado da transferência de imagem para o papel através da difusão de tingimento realizado internamente.

É devido aos irmãos Lumière a descoberta e a primeira utilização com sucesso do método das cores subtrativas, que foi utilizado para imagens iluminadas ou diapositivos de 1907 até 1930. A propósito, no Museu Oscar Niemeyer, a exposição Autocromos Lumière – O tempo da cor apresenta 70 belíssimos autocromos coloridos de Auguste e Louis Lumière que foram patenteados como novo processo de fotografia em 1903. Eles revolucionaram a fotografia ao conseguir dar cor às imagens, por meio do processo extremamente criativo e trabalhoso das cores subtrativas. (Rua Marechal Hermes, 999. www.museuoscarniemeyer.org.br ). Vale a pena ver esta exposição cujas imagens – reproduzidas das originais no formato de grandes “slides coloridos” – lembram as obras dos impressionistas por volta de 1850, nos trajes, pessoas, paisagens e principalmente, no distante ar bucólico das cenas campestres. Voltando ao nosso assunto, não há câmera fotográfica de filme que acompanhe o ritmo frenéticos da inundação de imagens a que somos submetidos diariamente nos meios de comunicação. A principal cadeia noticiosa do mundo, a CNN, possui um programa de exibição de imagens dos mais recentes acontecimentos no qual a matéria prima é representada pela contribuição voluntária dos espectadores. É um programa jovem, dinâmico que apresenta justamente os “flashes” capturados geralmente ao acaso, quando qualquer pessoa é surpreendida por um acontecimento que mereça o registro. Junte-se a este quadro, a juventude apostando firmemente em seus dotes de fotógrafo da hora. È uma fórmula de sucesso garantido, não há dúvida.

 Apostando nas câmeras digitais há também a questão do custo elevado dos materiais utilizados na fotografia clássica. Além do equipamento principal, se somam os preços dos filmes, da revelação, da cópia em papel fotográfico especial, e também o complexo e delicado trabalho da conservação de negativos e fotos. Creio que a fotografia irá se fundir ao modo de produção do cinema, na repetição de cenas com mínimas variáveis, na seqüência de quadro a quadro – algo que ela já está fazendo e que, paradoxalmente, a faz retornar aos seus primórdios.