O registro fotográfico realizado por Ré Soupault é singular. Abrangendo
os últimos cinco anos de paz antes da Segunda Guerra Mundial, as 42
fotografias – ora apresentadas no Goethe-Institut de Curitiba – foram
clicadas entre 1935 e 1939, em diversos países como França, Suécia,
Noruega, Tunísia e Espanha.   
Nascida Meta Erna Niemeyer, na Pomerânia, Alemanha, Ré foi uma mulher
incomum em seu tempo, voltando-se também ao cinema, design de moda e
desenho.
Em pesquisa do jornalista Ortrun Egelkraut, de Berlim, ficamos sabendo
que ela estudou, entre 1921 e 1925, na Bauhaus em Weimar, com Johannes
Itten, Oskar Schlemmer, Wassily Kandinsky e Paul Klee, entre outros,
sendo impossível negar a influência estético-artística que a escola
representou em seu trabalho e seus posicionamentos existenciais
subseqüentes. Inclusive porque, mais tarde, ela confessaria que Itten
foi o seu professor mais importante – uma espécie de diretriz
permanente em suas atividades artísticas.  A partir de 1923, viveu e
trabalhou em Berlim, e durante curto período foi casada com o dadaísta
e pintor Hans Richter. Com ele viajou à Paris, oportunidade em que
conheceu Man Ray e Fernand Léger. De volta a Berlim, novamente foi Hans
quem lhe apontou um caminho no jornalismo das passarelas. Como Ré
Richter, ela criou modelos para a Editora Berlinense Scherl, e suas
criações foram fotografadas por Man Ray. Seu vestido transformável é
parte da história da moda. Ele permitia à mulher uma aparência
perfeita, adequando-se rapidamente às exigências de uma época que
cobrava diferentes trajes de acordo com o período do dia. O segredo
estava em zíperes escondidos e botões de pressão que modificavam
radicalmente a roupa.   Mudando-se para Paris, em 1933, conheceu um dos
mais importantes jornalistas franceses que também era escritor, o
surrealista Philippe Soupault, a quem acompanhou em suas reportagens
pelo mundo. Casaram-se em 1937 e Ré passou a documentar as viagens, o
que resultou numa vasta obra fotográfica. Depois de uma permanência na
Tunísia, onde Philippe foi preso pela guarda de Vichy, acusado de alta
traição, o casal conseguiu fugir e as fotos de Ré ficaram para trás,
perdidas naquele país do norte da África. Ambos foram morar nos Estados
Unidos em 1942 e ao retornar à Europa, Ré passou a escrever,
tornando-se uma tradutora renomada, traduzindo também os dez romances e
os diversos contos do marido para o alemão. Uma feliz coincidência fez
com que uma amiga resgatasse os negativos das fotos, enviando-os para
Ré que os guardou numa caixa de sapatos e os esqueceu.  
O redescobrimento da artista iniciou-se em 1988, quando o editor
Manfred Metzner, de Heildeberg, amigo íntimo de Philippe e Ré visitou o
casal em Paris. A fotógrafa mostrou-lhe, ainda dentro da caixa, seus
1.500 negativos, feitos entre os anos de 1934 e 1942, quando a Europa
estava no terceiro ano consecutivo da guerra que só acabaria em 45.
Manfred entusiasmou-se com o que viu e logo depois, no mesmo ano de 88,
foi publicado o primeiro livro de fotografias de Ré, intitulado “Uma só
mulher pertence a todos – fotografias do bairro Quartier réservé na
Tunísia”. Na época das fotos, as mulheres consideradas castas não
tinham acesso ao “Bairro proibido”. Porém, na qualidade de européia
interessada neste tipo de registro, foi-lhe permitido entrar e
fotografar o local onde as mulheres – rejeitadas por suas famílias ou
por seus maridos – eram levadas a fim de se prostituírem ou mendigarem
para sobreviver.
Também em 1988, foram realizadas exposições de suas fotografias nas
cidades de Heildelberg, Krefeld, Nürnberg, Ludwigshafen e Mannheim, na
Alemanha.
  Philippe Soupault morreu em 1990 e quatro anos mais tarde, em Paris,
durante o “Mois de la Photo”, Ré foi homenageada como
fotógrafa-revelação na sua exposição realizada no Goethe-Institut da
capital francesa. Na ocasião, seu comentário foi: “Que eu me torne
famosa com minhas (poucas) imagens é algo que não posso acreditar”. Mas
foi justamente o que ocorreu, quando ela estava com 93 anos de idade.
Ré faleceu em 12 de março de 1996, em Paris, afirmando que “Nunca criei
uma fotografia. Tudo o que eu fotografei era proveniente da vida”.  A
exposição “Ré Soupault – Ver através da Câmera”, permanece aberta até
29 de setembro, no Goethe –Institut Curitiba (R. Reinaldino S. de
Quadros, 33 – Alto da XV – fone: 41 3262-8244).