dia de brincar
Brincar na infância (Freepik)

É comum enxergar as brincadeiras das crianças apenas como um momento de lazer sem grande relevância. No entanto, essa visão desconsidera o valor formativo e social do brincar na infância. Para se ter uma ideia, em março de 2024, foi sancionada a Lei nº 14.826/2024, que institui a parentalidade positiva e reconhece o direito ao brincar como uma das estratégias de prevenção à violência contra crianças.

Isso prova que mais do que entretenimento, o brincar tem papel central no desenvolvimento integral das crianças. Quando as escolas reconhecem essa prática como parte essencial do currículo, e não como um momento “livre” e dissociado da aprendizagem, é possível garantir o tempo, o espaço e a liberdade necessários para que essa vivência ocorra de forma cotidiana e significativa.

Por isso, é fundamental que esse direito seja efetivamente preservado e garantido, sobretudo em um contexto em que a urbanização acelerada, a escassez de espaços públicos e o avanço da tecnologia têm transformado radicalmente a infância.

Desenvolvimento cognitivo e construção de vínculos

O brincar na infância estimula muito mais do que a criatividade e o descanso. Por meio dele, as crianças exercitam habilidades como atenção, memória, linguagem, empatia, motricidade e pensamento simbólico. Afinal, inventar histórias, resolver conflitos e experimentar papéis sociais, as permite se desenvolver de forma integrada.

O psicólogo russo Lev Vygotsky (1896-1934) já defendia que a criança, ao brincar, atua em um nível de desenvolvimento superior ao habitual, ampliando sua capacidade de planejamento, representação e autorregulação. Além disso, por meio do faz de conta e das interações espontâneas, as crianças expressam sentimentos que, muitas vezes, não conseguem verbalizar, construindo vínculos extremamente importantes para o seu crescimento.

Os empecilhos do brincar na infância

Apesar de sua importância, o direito ao brincar enfrenta inúmeros obstáculos. A sobrecarga de conteúdos formais, a pressão por resultados, a falta de estrutura física adequada e a formação docente ainda centrada em modelos escolarizantes são alguns dos entraves. A antecipação de conteúdos escolares e a busca por desempenho mensurável reduzem o tempo destinado à brincadeira, empobrecendo a experiência infantil e comprometendo a construção de aprendizagens profundas.

Desta maneira, é necessário traçar um planejamento do brincar com intencionalidade pedagógica, trazendo a escuta e o respeito à infância para o centro da prática. A mediação docente não deve engessar a brincadeira, mas ampliar seus horizontes, acolhendo o improviso, a imaginação e a surpresa, que fazem parte dessa linguagem tão potente.

Além disso, fatores externos, como o uso excessivo de telas, a redução do tempo livre e a escassez de espaços verdes, têm impactado diretamente a qualidade do brincar. Muitas crianças não têm acesso a brincadeiras ao ar livre ou ao contato com a natureza, o que torna a escola ainda mais responsável por oferecer essas experiências.

O papel das famílias e das escolas

O artigo 3º da Lei nº 14.826/2024 determina que é dever do Estado, da família e da sociedade, incluindo as instituições de aprendizagem, proteger, preservar e garantir o direito ao brincar. Nesse processo, os educadores atuam como observadores sensíveis, responsáveis por organizar os espaços e propor contextos ricos para a brincadeira, sem limitar a ação da criança. São eles que oferecem materiais, acompanham os interesses do grupo e levantam hipóteses pedagógicas a partir da escuta atenta.

As famílias, por sua vez, exercem um papel decisivo, por serem as primeiras mediadoras das experiências infantis. Para tanto, é essencial que promovam tempo livre de qualidade, ofereçam ambientes acolhedores e seguros e estejam disponíveis para brincar junto, valorizando não apenas os momentos espontâneos, como também os compartilhados.

Em suma, ao compreender a verdadeira dimensão do brincar na infância, é possível enxergar a prática como um instrumento legítimo de aprendizagem, expressão e socialização, gerando um compromisso com a formação de cidadãos mais criativos, empáticos e completos.