Porque Menelik I, filho do rei Salomão e da rainha de Sabá, foi para a Etiópia, os judeus, no século 10 antes de Cristo, passaram pelo Egito e seguiram até o atual Sudão, partindo depois para o norte da atual Etiópia. A história é longa e cheia de tramas, mas a verdade é que no início dos anos 90 de nossa era, Israel lançou a Operação Salomão, levando mais de 14 mil judeus etíopes para seu território e mais tarde, a partir de 2010, reconheceu o direito dos fakash mura de emigrar para suas terras. A lista de espera hoje ultrapassa 8 mil inscritos.

O problema é que o processo para aliyah (migração) demora. Há quem continue esperando pela benesse há mais de vinte anos.  Gonder, no norte da Etiópia, é o centro dos falash mura, com escola judaica mantida pelo governo de Israel, onde o currículo tem as nove disciplinas normais da educação no país e outras duas específicas: hebraico e judaísmo (história e doutrina da religião).Em Gonder, a população toda é parte da mítica tribo perdida de Judá, dos judeus que se desgarraram há 3 mil anos da Terra Prometida. Os falash formaram há 2.500 anos uma comunidade isolada dentro do próprio país.  Nos anos 80 começaram os resgates e perto de 30 mil pessoas foram levadas para Jerusalém, uma das maiores operações de remoção da história. Mas outros 70 mil migraram por conta própria. Agora os falash vêm sendo levados em grupos  de 50 a 100 pessoas.

Neste final de agosto, termina a série dos resgatados, encerrando um capítulo de três mil anos. E é aí que começa outro problema, bem maior. Só que ainda não deu para compreender bem o porquê dos vôos, entre nosso país e o país etíope,  muito menos a prometida freqüência semanal, transportando 2.590 passageiros a cada 7 dias. Daqui para lá – de lá para cá.Quem viver, verá.

ERA UMA VEZ A RAINHA DE SABA
Cada vez que você toma uma xícara de café, saboreia um pouco de uma antiga Etiópia, pátria de origem do grão aromático. Quem se aventura a fazer um roteiro pelo país de tão longa história e tanta pobreza, vai encontrar lugares selvagens, uma terra de tradições extremas, castelos de pedra. O início da viagem será Addis Abeba, a terceira capital mais elevada do mundo, situada a mais de 2000 metros sobre o nível do mar. O segundo passo pode ser Bahar Dar, um cidade  nas margens do lago Tana, para visitar o monastério de Ura Kidane Mihret,  aberto para homens e mulheres, indistintamente ( o que já é uma raridade). O roteiro turístico segue com uma excursão a Tiss-Issat, para que se possa admirar a cascata do Nilo Azul, por séculos um objetivo de exploradores e aventureiros. Os caminhos levam então para Gonder, capital imperial nos séculos XVII e XVIII. Na cidade de imperadores e dominadores do passado, devem ser visitados o Castelo Fasilidas , a igreja Debre Berhan Selassie e  de  Kusquam, o mercado na vila de Felasha. A etapa seguinte será para Lalibela,  capital de uma dinastia medieval. Lalibela foi considerada a oitava maravilha do mundo, com suas igrejas monolíticas, escavadas na pedra, mas dentro da terra. Antes do retorno a Addis Abeba,uma parada para ver os misteriosos obeliscos, palácios e o museu de Axum, que segundo se acredita, foi a primeira capital da Rainha de Saba, no décimo século. Por razões climáticas, a melhor época para realizar a aventura é entre setembro e janeiro.

O NILO AZUL
O irmão Nilo Azul vem da Etiópia, onde é chamado de Abbay (o outro Nilo é o branco).

O Nilo na verdade tem dupla natureza, formado pela confluência do Nilo Azul e do Nilo Branco. Mas é o Abbay, o menor lago, o que contribui com a massa de água principal do rio. As primeiras gotas d´água são chamadas de Lagrimas de Deus e caem de um paredão rochoso que domina Gish Abbay, ao sul do lago Tana, fazendo a gênese das águas, antes que se transformem em rio.

Para entender essa dupla natureza do rio, é preciso fazer uma viagem no tempo e no espaço, adicionando também o cristianismo, as profecias sobre os rios de águas sagradas, a dupla natureza de Cristo, tão longamente debatida e ainda indispensável para a compreensão da Etiópia de nossos dias.

Na pobre e belicosa África, a Etiópia é o mais pobre de todos os pobres países. Mas guarda alguns monumentos religiosos que chamam a atenção do mundo. Debre Libanos fica a pouco mais de 100 km ao norte de Addis-Abeba. Seu monastério foi fundado no século XIII pelo santo Tekle Haymamot, nome que em aramaico, a língua do país, quer dizer  árvore da fé. Uma trilha na montanha permite chegar até onde se acredita que o santo tenha ficado de pé durante anos e anos.

Perto do antigo mosteiro foi construída uma igreja moderna, com vitrais do pintor Afework Tekle. Inaugurada em  1961 pelo imperador Hailé Sélassie I, para celebrar a liberdade finalmente permitida à igreja copta da Etiópia, ao deixar de ser dependente do patriarca de Alexandria (Egito), como o foi durante séculos.

Na parte mais baixa da rota, uma ponte de 400 anos tem pilares apoiados em 2 blocos de basalto, na beira do abismo. Os soldados portugueses da época misturaram casca de ovo de avestruz moída com gema, clara e conchas em pó, para fazer mais resistente a mistura de terra e água da construção. A ponte é a via de passagem  constante de pedestres de um povo que ficou conhecido pelas incríveis vitórias em maratonas internacionais. Um povo que é infatigável em suas andanças. Pelos caminhos do país, passam homens, mulheres, crianças, velhos, peregrinos, camponeses.

Para chegar a Motha são necessários cinco dias de marcha a pé. Tempo para aprender o guèze, língua litúrgica e literária da Etiópia. O lago Tana, com 85 km de norte a sul, 65 km de leste a oeste, 3.630 km quadrados e uma profundidade média de 14 metros, é o terceiro maior lago da  África, depois do Victoria e do Tanganyika. Seu principal emissário é o Nilo Azul, com as águas das fontes míticas de Gish Abbay, alimentado por cerca de 60 pequenos afluentes.

São as ilhas que guardam tesouros históricos e litúrgicos. O tesouro mais representativo do legendário etíope fica na ilha Tana Qirgos, onde se acredita que a Sagrada Família passou 3 meses e 10 dias, durante a fuga do Egito. Na península de Zeghiè, distante  15 km de Bahar Dar, igrejas e vilas contam a lenda mais bonita: a igreja de Zeghiè Ghiorghis, no norte da península, quando teve sua construção de pedra terminada, um cego quebrou seu bastão em 3 pedaços e plantou cada um deles separadamente na terra. O primeiro floresceu com a planta do café; o segundo deu um limoeiro e o terceiro se transformou no arbusto do lúpulo, para a fermentação da cerveja.

30 km adiante, ao sul de Bahar Dar, as quedas do Tissisat, do Nilo Azul, são considerados das mais belas do planeta. A melhor hora para apreciar tal paisagem é ao amanhecer, quando aparece um arco-íris junto do sol. Na região os pescadores utilizam pirogas feitas de papiro (tankwa), fabricadas no mesmo padrão do antigo Egito dos faraós.

A modernidade, que chega vagarosamente no país mais pobre entre os pobres da África, é uma ameaça que tem a forma de uma barragem gigante, que está no planos de governantes, agora que foi iniciado o desvio do Nilo Azul. Tudo em perigo, só para fornecer energia elétrica aos ribeirinhos. Uma espécie do São Francisco lulista. O que faz prever que em breve as tankwa tradicionais serão substituídas por barcos em plástico moldado.

Cada 24 de outubro acontece a peregrinação ao monastério de Debre Dano, nos altos  da Abissínia, província do Tigre. Uma montanha de pedra, terminando em um cume liso, forma uma espécie de fortaleza geológica. Debre Dano é o mais antigo monastério da Etiópia e os peregrinos, cerca de 50 mil, chegam todos os anos caminhando durante muitos dias, debaixo de um sol forte e inclemente. Diante da rocha sagrada, a massa humana fica reunida na festa votiva, onde se comprimem mutilados, cegos, surdos-mudos, leprosos. Sem falar de ladrões de todos os tipos, sempre presentes nas aglomerações. Soldados com chicotes abrem caminho para os que querem chegar até a ponta da falésia. O único meio de subir para o mosteiro é uma corda feita com oito tiras de couro de boi trançadas, o que é um verdadeiro malabarismo. O espetáculo surrealista  se repete há 15 séculos. A lenda diz que o monastério foi fundado no século VI por Za Mikael, ou Aragawi ( O Velho), vindo da Síria. Extasiado com o lugar predestinado à meditação e ao recolhimento, teve a visão de São Miguel. O santo apareceu com uma serpente imensa, que levou Aragawi ao ponto mais alto da montanha. Daí a corda, que ainda hoje é usada, simbolizando a serpente divina.

Como o monastério é proibido para mulheres, e só os homens podem tentar a subida de 25 metros na força dos braços, também as oferendas aos monges de animais como cabras e carneiros, só podem chegar ao monastério se forem animais do sexo masculino. Apenas os pássaros, porque é impossível impedi-los de voar, sobem dos dois sexos.  Em tempos normais, a subida é um exercício esportivo. Mas quando milhares de iluminados tentam subir ao mesmo tempo, tudo se transforma em uma enorme confusão. Os dois militares que controlam a corda, sempre tomada de assalto na base da pancadaria e do porrete, fazem o que é possível para dirigir o caos insensato. Às vezes conseguem afastar os fanáticos, que se acalmam por alguns instantes, antes de retornar com mais ímpeto e fôrça. O problema fica ainda maior quando a corda é utilizada ao mesmo tempo, pelos que tentam subir e os que tentam descer.

Quem consegue  a façanha de chegar ao alto, encontra na parte lisa da pedra um portal que dá passagem apenas para uma criança de 12 anos, de tão pequeno. Mesmo lá existe o comércio entre os que estão no alto e recebem garrafas vazias para serem preenchidas de água da chuva, acumulada em cisternas encravadas na rocha. A água benta é devolvida aos que permanecem no chão, causando um novo momento de balburdia, já que todos acreditam que a água é milagrosa e tem poderes curativos sobrenaturais.

Uma centena de monges vivem em Debre Damo, depois de fazerem voto de pobreza, obediência e caridade. Passam 364 dias sem terem contato com ninguém. Mas no dia 24 de  outubro, data em que Aragawi desapareceu no ano 534, o mundo desaba na vida dos monges. É preciso explicar que eles acreditam que Aragawi não morreu, apenas desapareceu ao olhar humano, enquanto espera a Ressurreição. Nesse dia os peregrinos têm licença de dormir no lugar do Monastério, já que na manhã é realizada uma missa. Para eles os monges preparam barris de talla, uma bebida fermentada na base de plantas, que chamam de cerveja. Durante toda noite os monges se revezam  ao microfone ( um mecenas instalou eletricidade, há dois anos, no lugar) , para celebrar a missa retransmitida pelo alto falante. E assim, ninguém consegue dormir. Mas como o álcool faz efeito, as vozes dos oficiantes vai ficando cada vez mais pastosa e lá pelas 2 horas da manhã, só se ouvem sussuros e alguns sons de lamentação, repetidos em boucle e em guèze.

Ao amanhecer a igreja de pedra e madeira, que abriga o Santo dos Santos, recebe a veneração de 5 mil penitentes que têm a honra de subir a corda sagrada. O ofício religioso dura 2 horas e meia. Após a missa, monges e padres formam uma procissão, vestindo togas e chapéus de cores vivas, tendo noviços carregando guarda-chuvas e incenso, com todo o fausto e brilho das Igrejas do Oriente, como nos primórdios dos tempos. A procissão dá 3 voltas em torno da igreja, 3 voltas em torno da thébaide., significando a Sagrada Trindade. Do alto da falésia, os homens de Deus abençoam as mulheres e os que ficaram isolados lá embaixo. Os fiéis se prostam e beijam a terra. Um coro de salmos e preces enche os céus da Etiópia,na fé simples, ingênua, única, que toma conta de todos. Ao meio dia todas as cerimônias terminam. Quando o último peregrino deixa a corda sagrada, tudo volta ao silêncio, à vida normal. E os monges de Debe Damo ficam sozinhos, enfrentando a eternidade.

Quem se aventurar a viajar até a Etiópia deve procurar fazê-lo  evitando a estação das chuvas. A melhor época  o período das grandes celebrações religiosas, como a Timkat (19 de janeiro), festa da Epifania. Em termos de formalidades, o visto de entrada é  fornecido no aeroporto de Addis-Abeba, pago em euros (25) ou em dólares, transformados em moeda local, o birr (Etb ) – 1 euro vale 11 Etb. A vacina contra febre amarela é obrigatória. Algumas operadoras regionais se especializaram no destino, como a Horizons Nômades (www.horizonsnomades.com), que organizaram expedições para pequenos grupos de até 12 pessoas,  incluindo uma que chega até as montanhas da Abissínia, berço da civilização da Etiópia. A próxima saída está marcada para 26 de outubro de 2013.

ETHIOPIAN AIRLINES NO BRASIL
A Etiópia é um dos países mais pobres do mundo, entre os mais pobres: está em 173º lugar no ranking de desenvolvimento humano da ONU. Mas colocou um B – 787, o já mais do que noticiado Dreamliner, com 3 frequências semanais entre Adis-Abeba (capital da Etiópia), Lomé (Togo), Rio de Janeiro e São Paulo. Cada vôo pode transportar até 270 passageiros, sendo 24 na classe executiva e 246 na econômica.  E os planos da companhia aérea do país mais pobre do mundo incluem a freqüência diária dos vôos.

Há um mês o aeroporto de Heathrow, em Londres, foi fechado para pousos e decolagens, porque a aeronave da Ethiopian Airlines sofreu um incêndio. Foi o último, mas talvez não o derradeiro, problema do tipo de avião que já ficou três meses no chão, para que autoridades americanas atestassem sua segurança.  A companhia africana fez a reestréia do avião em operação comercial no dia 27 de abril e foi a primeira empresa do mundo a retomar os vôos com os novos Dreamliner. Os problemas com o B 787 começaram em janeiro, com um avião da ANA, companhia japonesa que sofreu incêndio enquanto estava estacionado, vazio, no aeroporto  de Boston (Estados Unidos). Depois, também com a ANA, um B 787 fez pouso de emergência por causa de fumaça. Em seguida foi a United que apresentou problemas semelhantes. Além da Ethiopian, foi registrada outra ocorrência com avião da Thonson Airways, britânica. Por incrível que pareça, a Boeing tem 800 encomendas para entregar do Dreamliner.

Quem pretender voar com a Ethiopian vai sair de Adis Abeba para Lomé (4 horas e meia), onde a escala é de uma hora, seguindo depois para o Rio (mais oito horas) e fazendo outro vôo para São Paulo (40 minutos). Indo para Adis Abeba, o vôo sai de São Paulo para Lomé, e de lá, com a devida escala, para a Etiopia. Veja em www.flyethiopian.com