Novela pauta discussões sobre casamento infeliz

Psicanalista fala sobre os motivos que levam as pessoas a manter um relacionamento falido

Ciça Carvalho / Agência Estado

A novela “Páginas da Vida”, de Manoel Carlos, vem pautando várias discussões em família e uma delas é baseada na personagem Marta (Lília Cabral), que vive um casamento falido As cenas inspiram revolta e muito desprezo por parte dos telespectadores. No Orkut, por exemplo, já existem três comunidades intituladas “Eu odeio a Marta da novela das oito”. Mas há também uma comunidade que entende os motivos que fazem da personagem uma mulher mal-humorada, ranzinza e ríspida.

Assim como Marta, muitas outras mulheres insistem em manter um casamento infeliz – algo como uma ‘síndrome de Marta’. Os motivos que as levam a alimentar um relacionamento que há tempos não as satisfaz são os mais variados. “Muitas vezes, existe uma ligação muito forte entre o casal. Veja na novela: quando a Marta vivenciou aquela situação de quase estupro, começou a relembrar o início do casamento, quando os dois viviam bem. Ficou claro que, no caso da novela, a personagem ainda tem um elo de ligação com o marido. O comodismo também a impede de tomar alguma atitude”, explica a psicanalista Gláucia Araújo, do Instituto Brasileiro de Ciências e Psicanálise (IBCP).

Ainda segundo Gláucia, quando o motivo para o casal permanecer unido está ligado à questão financeira, o que predomina na relação é a cobrança, como se a mulher ou o homem devessem algo um ao outro. “As cobranças podem ser muito prejudiciais, porque, na maioria das vezes, o casal parece falar outra língua e o entendimento fica ainda mais difícil.”

Para Gláucia, nunca é tarde para recobrar a consciência e dar a volta por cima. Muitas vezes, as mulheres ficam estáticas e sem saber o que fazer para mudar a situação de seus relacionamentos, mas o mais importante é tomar uma atitude. A iniciativa pode ser tanto para salvar o casamento quanto para terminá-lo de vez. A mudança nunca é fácil, mas a opção de ser feliz está nas mãos de cada um. “Se não tiver coragem de acabar com a situação, tem de buscar ajuda, seja de uma amiga ou até de um profissional da área de saúde”, orienta Gláucia.

A personagem da novela já não vê o marido como homem há mais de cinco anos. “O sexo é uma coisa natural, é expressão de vida, gera vida. E quando isso é reprimido, essa energia que em psicanálise chamamos de libido, ela acaba se manifestando de outras formas, como mau humor, exagero no trabalho, etc. Em alguns casos, a repressão da libido pode se transformar em doenças graves, como a síndrome do pânico”, explica a psicanalista.

Dentro deste quadro, os problemas ligados à somatização, depressão, ansiedade e baixa auto-estima são recorrentes. Marta já passou por várias humilhações, inclusive no momento em que escutou de seu marido que ele também não a via mais como mulher. Segundo Gláucia, “isso acaba com a auto-estima e a mulher acaba ficando cada vez mais angustiada, chegando à depressão”.

A psicanalista Maria do Carmo Fogaça, que trabalha com casais, explica que o que mais os leva à análise são as disparidades e carências individuais. “Os casais realmente não conseguem se comunicar. Por não conseguirem mostrar ao companheiro o que está faltando na relação, as pessoas terminam se ferindo. Em geral, há ausência de afeto, é a reclamação mais comum, mas isso significa uma coisa diferente para cada um. Para algumas pessoas o afeto está numa comidinha, para outros, num presente. No caso de Marta, o que ela gostaria é que seu marido demonstrasse o amor que sente trazendo dinheiro e deixando a casa chique.”