Nesta sexta-feira (1º de agosto), Curitiba será o centro das discussões sobre o futuro dos medicamentos fitoterápicos no Brasil. A Associação Brasileira das Empresas do Setor Fitoterápico e Suplemento Alimentar (Abifisa) realiza uma reunião técnica com a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para debater o novo guia de orientação para registro de medicamentos fitoterápicos, parte da modernização do marco regulatório do setor.
A atualização das normas representa um avanço estratégico para toda a cadeia produtiva de medicamentos à base de plantas medicinais, desde a pesquisa até a comercialização. O encontro deve reunir representantes da indústria, especialistas e autoridades sanitárias para analisar como as novas regras impactarão o setor.
O evento acontece em meio às celebrações dos 25 anos da Abifisa, entidade que representa os segmentos de fitoterápicos, suplementos alimentares e ingredientes botânicos e que liderou o processo de revisão regulatória junto à Anvisa.
Regulamentação dos fitoterápicos
A condução será da presidente da Abifisa, Laerte Dall’Agnol. Segundo ela, a nova regulamentação será decisiva para ampliar a participação do país no mercado global de plantas medicinais. Atualmente, embora seja o país com a maior biodiversidade do planeta, o Brasil tem participação de apenas 0,1% do faturamento global do setor, avaliado em US$ 230 bilhões.
“O novo marco regulatório traz uma evolução do conceito do fitoterápico, valorizando sua complexidade fitoquímica, ou seja, respeitando a natureza do seu fitocomplexo e sua função na eficácia e segurança.”, afirma a farmacêutica, especialista em Ciências Farmacêuticas na área de Produtos Naturais.
Atualmente, são aplicados aos fitoterápicos os parâmetros de produção e controle de qualidade dos medicamentos sintéticos, o que não traduz a essência de um produto de origem natural. “No fitoterápico, em geral, o ‘princípio ativo’ é o próprio extrato e não apenas uma substância isolada ou um único marcador químico. Ou seja, na maioria das vezes, o responsável pela atividade farmacológica é o fitocomplexo. Com foco na concentração de apenas um marcador químico, a integralidade do fitocomplexo é desconsiderada. Com a mudança, o fitocomplexo será valorizado, preservando características essenciais inerentes à segurança e eficácia dos produtos naturais”, detalha.
A expectativa do setor é de que o novo marco regulatório seja publicado ainda em 2025. A elaboração da revisão normativa, pela Anvisa, teve início em 2024, com três consultas públicas para apresentação e análise das propostas de alterações da RDC 26/2014 e Instruções Normativas (INs) que complementam a norma principal.
Inspiração no modelo europeu
Na última década, em um trabalho conjunto da Abifisa, Anvisa e outras associações do setor, foram analisadas as legislações de vários países, como Austrália, Canadá e EUA. Após os estudos, o novo marco regulatório dos fitoterápicos brasileiros irá seguir um modelo que converge com o europeu.
“Foi um trabalho colaborativo intenso durante todo o processo de convergência regulatória entre as normativas brasileira e européia, até chegarmos a um modelo mais adequado à realidade brasileira”, conta.
A Europa domina o mercado de medicamentos à base de produtos botânicos, com uma participação de mais de 44% da receita global, em 2024, com destaque para a Alemanha. Para a presidente da Abifisa, além da regulamentação adequada, os países europeus culturalmente utilizam e prescrevem produtos fitoterápicos nos cuidados de saúde. Ela acredita que a nova regulamentação brasileira deve contribuir para uma mudança cultural importante para o país.
“Enquanto, na Europa, é comum que os médicos prescrevam fitoterápicos, no Brasil essa prática ainda é pouco frequente. Por aqui, são os próprios pacientes que costumam buscar os fitoterápicos como uma alternativa aos medicamentos sintéticos, principalmente por causa dos menores riscos e efeitos colaterais. Com o novo marco regulatório, haverá atualizações nos parâmetros técnicos, mas a principal transformação será cultural”, ressalta.
Impacto do novo marco no agronegócio
O novo marco regulatório dos fitoterápicos deve alavancar também a produção de plantas medicinais no Brasil, atividade em ascensão no país, com destaque para a região Sul, principalmente o Paraná. O estado, responsável por 90% das plantas medicinais e aromáticas cultivadas no país, tem área de 6 mil hectares ocupada com espécies medicinais, condimentares e aromáticas, que rendem uma produção anual de mais de 18 mil toneladas, segundo dados do Iapar, Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná.
O estado lidera a produção nacional de camomila, sendo Mandirituba, na Região Metropolitana de Curitiba, o município que concentra 30% de toda a camomila brasileira. Além disso, o Paraná se destaca na produção de menta-piperita ou hortelã pimenta, melissa, guaco e ginseng brasileiro (pfaffia), exportado para China, Japão, países da Europa e América do Norte. Já o estado de São Paulo tem forte produção de maracujá (passiflora), utilizada em medicamentos fitoterápicos para insônia, e erva baleeira, com propriedades anti-inflamatórias e analgésicas.
Para a presidente da Abifisa, com 20% de todas as espécies da fauna e da flora global, o Brasil tem imenso potencial para expandir toda a cadeia produtiva de fitoterápicos. “Com a revisão normativa, nossa expectativa é por uma transformação que vai beneficiar a agricultura familiar, os fabricantes de insumos e produtos acabados, prescritores e, principalmente, o consumidor final”, conclui.