Maternidade
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O câncer de mama, tipo mais frequente entre mulheres (excluídos os cânceres de pele não melanoma), não traz apenas o desafio do tratamento: muitas pacientes convivem também com o medo de ver interrompido o sonho da maternidade. Avanços terapêuticos têm aumentado a sobrevida, mas quimioterapia e radioterapia ainda oferecem risco à fertilidade. Foi diante desse dilema que estudantes de Medicina do Centro Universitário de Brasília (CEUB) realizaram uma revisão sistemática da literatura científica sobre a eficácia do congelamento de óvulos em mulheres diagnosticadas com a doença.

O estudo integra o campo da oncofertilidade – área que conecta oncologia e reprodução assistida – e analisou evidências já disponíveis sobre a preservação da fertilidade. Os resultados mostraram que mulheres com câncer de mama apresentam desempenho semelhante ao de mulheres saudáveis em critérios como número de óvulos recuperados, taxa de maturidade e fertilização. Protocolos que utilizam medicamentos como letrozol e tamoxifeno também se mostraram eficazes para proteger a saúde mamária durante o estímulo hormonal, sem prejuízos à segurança oncológica ou reprodutiva.

“O que mais nos chamou a atenção foi a consistência: tanto o total de óvulos quanto os maduros recuperados são comparáveis entre pacientes oncológicas e mulheres saudáveis. Isso traz segurança para o aconselhamento médico e esperança para quem sonha em ser mãe”, afirma Luana Rafael, aluna do nono semestre de Medicina e autora principal do trabalho.

A pesquisa reforça que a preservação da fertilidade em pacientes com câncer de mama é viável e segura, devendo ser encarada como um direito reprodutivo. Para a coautora Isabela Pedersoli, os dados podem embasar políticas públicas que garantam acesso à criopreservação antes do início do tratamento anticâncer. “O impacto é duplo: fortalece o direito das pacientes e organiza a base científica para que novos avanços sejam possíveis”, destaca.

O orientador do estudo, professor de Medicina do CEUB, Bruno Ramalho, ressalta, porém, que ainda existem desafios a superar. “Precisamos, cada vez mais, confirmar a segurança oncológica da estimulação ovariana e da gravidez após a remissão. Embora já existam evidências positivas, o receio de interferência no prognóstico da doença ainda limita encaminhamentos para a reprodução assistida”, explica.

Desafios e próximos passos

Entre as barreiras à preservação da fertilidade estão o curto intervalo entre o diagnóstico e o início da quimioterapia, os custos do procedimento, o medo de comprometer o tratamento e as desigualdades de acesso. Para os pesquisadores, os resultados reforçam a importância de incluir a orientação sobre oncofertilidade no percurso terapêutico das pacientes e justificar linhas de financiamento específicas.

“Esse estudo é apenas um passo, mas um passo fundamental para mostrar que a maternidade após o câncer é uma possibilidade real. Preservar a fertilidade deve ser entendido como parte do direito à vida plena”, concluem as autoras.

Metodologia

A revisão seguiu as diretrizes internacionais PRISMA 2020 e analisou 64 publicações científicas. Destas, 18 estudos atenderam aos critérios de inclusão e foram avaliados em profundidade. Foram considerados indicadores como número e maturidade dos óvulos, taxas de fertilização, gravidez e nascimento de bebês vivos.

“O congelamento de óvulos já é visto como a técnica de escolha para preservar a fertilidade, mas ainda é uma prática recente na clínica. Nossa revisão sistemática organiza as evidências confiáveis e ajuda médicos e pacientes a tomarem decisões seguras”, finaliza Pedersoli.