O filósofo Daniel Dennett conta em seu livro “Quebrando o Encanto”, lançado no final do ano passado no Brasil, uma forma interessante de parasitismo. Ratos infectados pelo Toxoplasma gondii, causador da toxoplasmose, ficam menos cautelosos. Eles correm pelo meio da rua, em vez de se movimentar pelos cantos – como manda sua natureza – e acabam virando presas fáceis de gatos. A atitude suicida, acredita-se, é comandada pelo verme, uma vez que ele depende do aparelho digestivo dos felinos para se reproduzir. Ele dominaria o cérebro do rato para assim atingir seu objetivo.
As mudanças de comportamento induzidas após a infecção há tempos já vinham sendo observadas por biólogos, mas só agora os cientistas começam a entender como o parasita age nos circuitos neurais. De acordo com estudo que será divulgado amanhã (3) na edição da revista “PNAS”, o T. gondii bloqueia a aversão natural de ratos e camundongos ao cheiro da urina de gatos e produz no lugar uma espécie de atração ao feromônio, aumentando as chances de o roedor se tornar uma presa.
É a chamada “manipulação comportamental”, por meio da qual o verme altera o modo de agir do seu hospedeiro com o intuito de aumentar sua própria eficiência de transmissão.
Manipulação específica – Essa interferência é bastante específica, ao contrário do que os primeiros estudos sobre a ação sugeriam. A equipe liderada por Ajai Vyas, da Universidade Stanford, comprovou que a infecção não diminui outros tipos de comportamentos aversivos dos ratos, manifestações de ansiedade e medos em geral que tenham sido aprendidos, nem tampouco afeta a capacidade olfativa, o sucesso reprodutivo e o status social dos roedores.
Uma vez que o parasita toma quase todo o cérebro de ratos e camundongos, era de se esperar que eles tivessem seus mecanismos de defesa ou de reprodução afetados. Mas isso não foi observado em laboratório. Os animais testados, por exemplo, continuavam fugindo do odor de urina de cachorro, um predador que não está envolvido na reprodução do toxoplasma. O parasita parece só converter em atração a aversão natural aos odores felinos.
O toxoplasma se reproduz sexuadamente em um ciclo de vida que passa por duas espécies de hospedeiros. A fase sexual da reprodução ocorre no intestino dos gatos, que excretam em suas fezes os oócitos do protozoário, que eventualmente podem ser ingeridos por roedores. Nestes animais, o verme forma cistos que se alojam no sistema nervoso central.
Aparentemente, sugerem os pesquisadores, é a infecção na região do cérebro conhecida como amígdala que responde pela manipulação específica do comportamento do animal. O ciclo de vida se completa quando o gato come o rato infectado.