Vivendo bem na Grécia

Por Dayse Regina Ferreira

A Grécia não sai das primeiras páginas dos jornais, capas de revistas, temas de reportagens na televisão internacional. Enquanto Atenas vive seus dias de grandes decisões econômicas, as ilhas (e são inúmeras) guardam o sol, o ritmo de férias, recebendo milhares de turistas todos os dias. Só no ano passado a Grécia acolheu mais de 12 milhões de visitantes estrangeiros. E todos acabam viajando pelas ilhas, no que fazem muito bem.

Um dos destaques da viagem pela Grécia, além das belezas naturais, da longa e importante história que influenciou tudo e todos no planeta, dos monumentos, da arte e dos museus, é a mesa. A gastronomia grega é um estilo de vida. Tudo muito fresco, tudo simples, tudo tradicional. Os restaurantes são ponto de encontro e quase sempre fazem parte da vida noturna de cada cidade.

Fotos: Dayse Regina Ferreira

Spiros Bairaktaris, proprietário da taverna de 1879, símbolo de Monastirakis na capital grega

Atenas tem dois pontos básicos, para uma boa refeição. Um é Monastiraki, centro antigo, na região onde fica o Mercado das Pulgas, a Plaka, museus, biblioteca da Adriano. E também, no número 2 da praça Monastiraki, a taverna de 1879, onde reina absoluto Spiros Bairaktaris. A taverna vive lotada, o barulho é constante e em dias especiais há música ao vivo, o que chama ainda mais gente. São poucos os turistas e muitos os gregos no seu interior. Os turistas costumam escolher as mesas ao ar livre, na rua de pedestres.

Mas é no interior que o clima tem vida, com o setor de grelhados à vista dos clientes. As paredes estão completamente cobertas de ícones, fotos de personalidades que passaram pela taverna, sempre ao lado de Spiros Bairaktaris. Que não abandona seu posto de dono em nenhum dia da semana, do mês, do ano.


Ícones, quadros, fotos de personalidades, na taverna mítica de Atenas

A tradição de ir até a cozinha para escolher os pratos nas próprias panelas, foi substituída por um cardápio com grandes fotos de cada especialidade. O chope sai no balcão e é sempre bom. Mas é difícil resistir ao ouzo ou ao vinho grego. Retsina, por exemplo, só mesmo em tavernas. Os restaurantes mais elegantes se recusam a oferecer o que eles chamam de vinho dos mais velhos, porque tradicional.

O outro ponto para uma boa refeição é o Mikrolimano, ( anteriormente chamado de Tourkolimano). É na região próxima ao porto de Pireus, onde ficam as marinas para grandes iates de ricos e famosos. Todo o caminho é lotado de bares, restaurantes, sorveterias, locais de shows. O movimento é intenso e nos domingos mal dá para caminhar, de tanta gente curtindo os finais de tarde, o pôr do sol, o drinque, a boa comida de frutos do mar, o sorvete.Namorados, casais, gente empurrando carrinho de bebês, velhinhos de bengala: todos curtindo o bem bom da vida, sem pensar em crise.


Em Kalambaka, onde fica Meteora e seus mosteiros, o restaurante Meteora tem a “nona” dirigindo a cozinha de pratos típicos. Uma deliciosa refeição custa 12 euros por pessoa

 

Basta chegar até uma taverna, escolher uma mesa e esperar o desfile de pratos típicos. Um dos aperitivos tradicionais é a fava ( um purê de grãos), horiatiki (tomate, pepino, azeitonas pretas, queijo feta), taramosalata ( ova defumada de peixe em pasta), plaki ( um prato de feijões), melitzanosalata (salada de berinjela) dolmadakia ( folhas de uva recheadas com carne, arroz e cebola, servidas com molho de limão).

O prato de entrada é uma escolha de carnes grelhadas (em geral carneiro, mas pode ser vitela, galinha ou vaca), e uma grande variedade de frutos do mar (polvo, lula, peixes, lagosta ou yuvetsi , caçarola de camarões).


Todas as tradições da cozinha grega, em Meteora, que há quatro gerações servem receitas típicas sob direção da matriarca

Na escolha de um vinho grego, prefira os vinhos de Santorini. Mas não deixe de experimentar a retsina, vinho temperado com ramos de pinheiro, daí o nome de resina. Na hora da sobremesa, além das frutas de época – sempre saudáveis – é bom provar os doces folhados, recheados com pistache ou nozes, levando uma calda espessa de açúcar.São as famosas baklava. Kataifi é trigo prensado, ensopado de mel. Pagoto é sorvete e as sobremesas spoon, são frutas em compota. Para terminar, nada com um bom e forte café grego.

Tudo faz parte da chamada Cozinha Mediterrânea, cada vez mais na moda. Claro que há restaurantes de especialidades internacionais, lanchonetes para aquelas marcas norte americanas, das quais ninguém está livre. Os coffee shops servem para um sanduíche e as bancas de rua ou lanchonetes sempre têm um bom suco de laranja feito na hora ou o imperdível suco de romã, que não dá para esquecer.


Os filhos do padre ortodoxo grego, Themis e Theodore, se encarregam da pintura, dos trabalhos em prata e da venda dos ícones em Kalambaka

UM CARDÁPIO TÍPICO
Meze – plural mezedes – é o aperitivo frio e quente. Kraso-mezes, é o aperitivo com vinho, e ouzo-mezes são especiais para quem vai beber ouzo. Mezedopolio ou ouzeri são os restaurantes que servem mezedes. Normalmente as tavernas e os restaurantes que servem a cozinha Mediterrânea Grega, incluem meze (ou orektiko) em seus cardápios.

É sempre bom provar tzatziki (yoghurt com pepino e alho), tiropitakia (pequenas tortas de massa folhada com recheio de queijo), bourekakia ( tortinhas de carne) ou spanokopita (torta colhada com espinafre no recheio). Em Santorini as especialidades incluem zucchini (abobrinha frita com mel e yoghurt), garides (camarões com alho, molho de pimenta e yoghurt) e kalamarakia (pequenos polvos envoltos em massa e fritos).


Pelagia, irmã do padre Pefkis, e a guia Globus na Grécia, Lida, nas explicações das várias fases e técnicas que transformam um pedaço de madeira em uma obra de arte, os belos ícones

O prato principal quase sempre é moussaka ( camadas de berinjela, carne moída de carneiro e purê de batatas coberto de queijo). Pastisio é o macarrão com carne moída, molho bechamel, assado no forto e gemista é tomates ou pimentão verde recheados com arroz e carne moída. Yiouvarlakia (bolas de carne cozidas servidas com arroz), soudzoukakia ( bolas de carne com molho de tomates e alho), gigantes ( grandes grãos de feijão com cebolas e molho de tomate), kokoretsi ( espetinho de fígado e rins), saganaki (queijo frito servido com limão), fasolada (sopa de feijão) e kakavia (bouilabaisse) ou arni (carneiro) aparecem na mesa de todos os dias.

Além do ouzo, que é indicado principalmente para acompanhar polvo, calamares frito e outras delícias (convém não subestimar seu poder alcóolico), há outras bebidas igualmente fortes. O ouzo é feito com uma combinação de uvas e ervas (aniz, menta, erva doce, avelãs) em processo de destilação. Tudo combinado com álcool puro e água e uma pequena quantidade de óleos. É servido com gelo e água, o que torna a bebida opalina.


Cores fortes de tintas naturais, folhas de ouro, muita arte: ícones gregos são as melhores compras de lembranças

O raki, tsipouro e tsikoudia são outros drinques igualmente poderosos. Raki não é doce, mas leva aniz e é destilado duas vezes. O tsipouro é um destilado forte, produzido com restos da uva prensada, uma espécie de grapa. Tsiloudia é o raki de Creta, com um sabor forte, produzido por destilação. Todas as três bebidas são servidas puras, sem água nem gelo no copo.

Quem é especialista em experimentar peixes e frutos do mar, precisa aprender como pedir seu prato preferido. Lagosta é astakos; calamares é kalamari; polvo é ktapodi. O pequeno peixe vermelho mais famoso na Grécia é o barbouni. Camarão é garides; bacalhau frito é bakaliaros e ostra, stridia. Caranguejo é kavouri, mexilhão é mídia. Nos restaurantes você escolhe o peixe, que é apresentado ainda cru na sua mesa, para a certeza de que será bem servido.


O atelier do padre Pefkis, com seus ícones antigos que poucos conhecem

SURPRESAS AGRADÁVEIS
Agradáveis e inesquecíveis. Depois de visitar a mítica Meteora, com seus mosteiros pendurados no alto das rochas e suas igrejas cobertas de ícones e afrescos, — como manda a tradição ortodoxa, a parada do ônibus da Globus para almoço leva até o restaurante Meteora, em Kalambaka. O restaurante existe desde 1925 e está preservando a qualidade, o sabor e frescor da gastronomia grega há quatro gerações da família Gertson.

O restaurante fica abaixo das pedras de Meteora e na frente da fonte da praça central, no lado oposto da Prefeitura. É lá que a nona, como chamou a guia Lida, dirige a festa dos panelões de iguarias, matriarca da família onde todos trabalham e oferecem bons serviços. Os turistas chegam, escolhem a mesa no jardim ou no interior do restaurante Meteora e vão até a cozinha, onde a nonaé quem serve o carneiro, os legumes recheados, os molhos bem temperados.


Os filhos do padre ortodoxo, e seus alunos, seguem a tradição de pintar ícones em Kalambaka, onde ficam os mistérios de Meteora e seus mosteiros no alto das pedras

Outra surpresa agradável, também na região de Meteora, foi conhecer o local onde são feitos os ícones, seguindo preceitos tradicionais da pintura religiosa ortodoxa, copiando peças antigas de grande valor, usando pigmentos de colorido natural. A firma foi fundada por um padre ortodoxo, que segue pintando e tem nos foi filhos a certeza de que sua arte continuará por muito tempo.

Os padres ortodoxos podem casar, daí que a tradição familiar se mantém. Lá são feitas as peças de prata, que muitas vezes contornam as figuras de santos e anjos. E quem ajuda na parte comercial é a irmã do padre. A guia Lida se encarregou de traduzir detalhes da feitura de cada peça e a irmã do proprietário abriu uma exceção para nós, mostrando o atelier especial do artista e seus ícones mais antigos, devidamente protegidos do tempo. Uma experiência para ser lembrada.


Na taverna Bairaktaris, os domingos dos atenienses são embalados com música ao vivo, com bouzouki e canções tradicionais que os clientes também cantam


Evzone é o soldado com roupa de gala, que faz guarda no Parlamento grego, em Atenas. A saia curta, de 400 pregas, representa os anos em que a Grécia ficou sob domínio dos otomanos