Os casos suspeitos de intoxicação por metanol têm levado consumidores a darem preferência por outros tipos de bebidas, como cervejas e vinhos, em lugar dos destilados.
A reportagem esteve na Vila Madalena, bairro boêmio da cidade de São Paulo, assim como em ruas da Barra Funda e da Santa Cecília, na região central, na quinta-feira (2), dia da semana com maior movimento nos bares após a repercussão dos casos de intoxicação por metanol.
A maioria dos consumidores ouvidos pela reportagem está deixando destilados e drinques de lado e apostando em cervejas e vinhos. Nos casos de intoxicação investigados no país as vítimas beberam uísque, vodca ou gim supostamente adulterados.
As quintas-feiras costumam atrair muitos frequentadores, já que a sexta é dia de home office para muitos trabalhadores. Proprietários e funcionários relataram, no entanto, que o movimento estava abaixo do normal para o dia. Alguns atribuíram isso ao tempo mais frio e ao início do mês, quando muita gente ainda não recebeu os salários. Mas todos concordam que as notícias sobre a intoxicação por metanol estão afastando o público dos bares.
O Ministério da Saúde afirmou nesta quinta que há uma morte por intoxicação por metanol confirmada em laboratório, além de outras sete sob investigação — cinco em São Paulo e duas em Pernambuco.
A pasta disse que recebeu 59 notificações de possível intoxicação pela substância em São Paulo, Pernambuco e no Distrito Federal. Há 11 casos confirmados e 48 em análise, números que incluem o paciente que morreu.
A professora Emanuelle Braga, 28, conta que assim que ouviu as primeiras notícias quis logo saber quais bares podia frequentar e quais bebidas evitar para não correr risco de intoxicação.
“Quando parei para entender, eu vi que o problema estava apenas entre os destilados. Como não sou do drinque, e só tomo vinho, não foi minha preocupação. Então em nenhum momento passou pela minha cabeça parar de beber”, afirma.
O amigo dela, o psicólogo Gabriel Miranda, 25, teve uma reação diferente.
“Meu primeiro sentimento foi de preocupação. Fiquei chocado e receoso. Cheguei a pensar em parar de beber. Mas depois que pesquisei mais sobre o que estava rolando, decidi não correr o risco de beber drinques apenas. Pelo menos por agora”, afirma.
“Eu também pensei em parar, mas quando vi que eram destilados específicos, fiquei mais tranquila. Avisei meus amigos para ficarmos só no vinho e na cerveja”, afirma Catarina Ortiz, 26.
Emanuelle, Gabriel e Catarina estavam tomando vinho em um bar especializado na bebida na rua 13 de Maio, na Bela Vista, na noite desta quinta.
Regiane de Paula, coordenadora de controle de doenças da Secretaria de Saúde do Estado, afirmou que as contaminações notificadas ocorreram principalmente em destilados como gim, aguardente e uísque, enquanto cervejas e vinhos não apresentaram risco até o momento.
Segunda ela, não há proibição para venda de destilados, mas os proprietários devem garantir a procedência das bebidas, comprando com nota fiscal e desconfiando de preços muito baixos.
“O nosso alerta é para que as pessoas estejam atentas, e aos primeiros sinais e sintomas, como dor de cabeça intensa, cansaço, dor abdominal e sonolência, procurem uma unidade básica de saúde para que não tenham mais complicações. Existe um antídoto eficaz se usado nas primeiras 12 a 24 horas após o consumo”, afirma.
“Está difícil se entorpecer no Brasil. Se eu tiver que ficar completamente sem beber, vai ser quase como um isolamento”, diz Emanuelle.
Já a professora Marina Rocha, 27, diz que, se a situação piorar, ficará tranquila e não terá problema algum em ficar sem beber. “Não estou a fim de beber nada além de cerveja. Mas se as cervejas também estiverem contaminadas, não tem problemas ficar sem beber”, disse ela, em uma mesa de bar no largo Santa Cecília.
Apesar da Secretaria de Saúde informar que há empenho na conscientização sobre os riscos, proprietários de bares e restaurantes ouvidos pela reportagem relataram não ter recebido nenhum comunicado oficial até o momento.
Tiago Santos, proprietário do Cabaret Santa Cecília, afirmou que, embora não tenha recebido orientações específicas da vigilância sanitária, tem procurado se informar pela imprensa e nas redes sociais.
Ele disse estar preocupado com o impacto que as intoxicações por metanol podem causar no estabelecimento. O local depende das vendas de drinques autorais para sustentar a programação artística e os funcionários, já que não cobra entrada.
“Nós não trabalhamos com comida, só com bebida, então a situação fica complicada. Os clientes são como meus patrões, e preciso sempre oferecer o melhor para eles. É por isso que a gente cuida ao máximo da procedência dos nossos produtos. Mas estou preocupado com o que pode acontecer”, disse.
Caique Lima, responsável pelos drinques de um bar na região de Santa Cecília, também está preocupado.
Na quarta-feira (1°), ele disse que todas as mesas foram ocupadas no bar, mas ninguém pediu drinques.
“Acredito que o impacto será muito grande, porque, de qualquer forma, ninguém quer colocar a vida em risco. Mas vamos nos posicionar e lançar um vídeo explicando melhor toda a situação, tentando tranquilizar os clientes e oferecendo dicas sobre o tema”, disse.
Para aumentar a confiança dos consumidores e garantir a segurança, Caique sugere que a Vigilância Sanitária crie um selo de certificação para os estabelecimentos que comprovarem a procedência e o controle rigoroso de seus produtos, indicando que estão livres de bebidas adulteradas.
“Mesmo que seja uma certificação simples, acho importante ter um selo visível, como ‘este bar é fiscalizado’, para que todos se sintam mais seguros.”