Solomon Northup era um cidadão nova-iorquino, violinista, homem culto, casado e com filhos. Numa viagem de negócios a Washington, ele foi drogado e, quando acordou, viu-se transformado em escravo. Vendido para as plantações do Sul do país, penou durante muito tempo até conseguir ser libertado. De volta à sua casa e família, escreveu um livro importante para a campanha pela abolição da escravatura nos EUA. Esse texto pungente está na origem de 12 Anos de Escravidão, dirigido pelo britânico Steve McQueen e indicado para nove categorias do Oscar. É favorito aos troféus principais, entre eles o de filme, direção e ator para seu magnífico intérprete, o também britânico Chiwetel Ejiofor. A história cobre os 12 anos de sofrimento de Solomon, do sequestro em 1841, ao resgate em 1853.

É curioso que, pelo segundo ano consecutivo, a Academia ponha em relevo o tema da escravidão. Ano passado com Lincoln, de Steven Spielberg, que concentra sua biografia do presidente norte-americano em sua luta pela abolição e com Django Livre, de Quentin Tarantino, numa visão pop e libertária daquele processo. Agora, com um trabalho dirigido por um cineasta negro e britânico, homônimo de um dos atores mais conhecidos da história de Hollywood. Mais: alguns críticos têm classificado 12 Anos como o “filme definitivo” sobre a escravidão nos EUA.

Não contemporiza usando como pretexto pretensas relações amistosas entre os donos de fazendas e suas “propriedades”, que incluíam os negros cativos. Quando lhe perguntam por que maltrata tanto seus escravos, que afinal o serviam e haviam custado caro, o fazendeiro Edwin Epps (Michael Fassbender) resume sua visão de mundo numa frase: “Um proprietário faz o que quiser com a sua propriedade”.

Dirigido com intensidade e convicção, 12 Anos de Escravidão parece às vezes excessivamente acadêmico. Por outro lado, convoca a indignação da plateia por uma circunstância adicional: Solomon não era um escravo típico, mas um homem culto, livre e, portanto, vítima de injustiça. Essa situação de fato, real e verdadeira, pode tirar um pouco do foco sobre a maior injustiça de todas — a escravidão em si, pura e simples, execrável quando aplicada a homens livres ou não, cultos ou ignorantes.