
Comemoram-se em março 300 anos do surgimento da relĂquia e do inĂcio do culto a Nossa Senhora em Aparecida. Durante o ano todo o santuĂ¡rio estĂ¡ em festa e, tambĂ©m a partir de março, Renato AragĂ£o integra-se Ă s festividades. Em outubro de 1999, ele encarou a maratona de 130 km a pĂ©, indo de ArujĂ¡, em SĂ£o Paulo, atĂ© a basĂlica, para agradecer as doações feitas durante a 14ª ediĂ§Ă£o da campanha Criança Esperança, do Fundo das Nações Unidas para a InfĂ¢ncia, Unicef. Na sala da casa do trapalhĂ£o, sua mulher, LĂlian, aponta quadros e objetos. O trapalhĂ£o pendurado num helicĂ³ptero, na mĂ£o do Cristo Redentor.
“Tudo isso vai para uma exposiĂ§Ă£o”, ela diz. Logo na entrada da casa, num condomĂnio da Barra, hĂ¡ um santuĂ¡rio cheio de relĂquias e devoções. Imagens de SĂ£o Francisco de Assis, de Santo AntĂ´nio. Seu irmĂ£o Ă© Francisco e ele Ă© AntĂ´nio Renato, mas o prĂ³prio trabalhĂ£o brinca – “Meu nome deveria ser AntĂ´nio Renato Didi MocĂ³ Esperança AragĂ£o. Sou um eterno otimista torcendo pelo Brasil.” Na quinta-feira Ă tarde, 5, o calor carioca fica do lado de fora. Na portaria do condomĂnio, o funcionĂ¡rio libera o repĂ³rter para ir Ă casa do ‘Dr. Renato’. NĂ£o Ă© simples deferĂªncia. A gente atĂ© esquece, mas antes de virar o trapalhĂ£o mais amado do Brasil, Didi, vamos nomeĂ¡-lo pelo apelido carinhoso, formou-se em Direito. Mas Dr. Renato nunca exerceu.
Ainda cursava a universidade quando o surgimento da TV no Nordeste – a TV CearĂ¡ – o desviou da rota prevista. Fez um curso de diretor e roteirista, mas terminou virando ator. Tudo isso foi hĂ¡ muito tempo, mas agora, dĂ©cadas mais tarde, Didi vive a expectativa de um novo lançamento. Em 1981, e com direĂ§Ă£o de J.B Tanko – que assinou oito filmes, incluindo alguns dos maiores sucessos dos Trapalhões -, ele fez Os Saltimbancos Trapalhões. HĂ¡ 35 anos… No prĂ³ximo dia 19, uma nova versĂ£o estarĂ¡ chegando aos cinemas do Brasil. Os Saltimbancos Trapalhões – Rumo a Hollywood. O novo filme, com direĂ§Ă£o de JoĂ£o Daniel Tikhomiroff, retoma as canções de Chico Buarque, mas agora num novo conceito.
Um musical, primeiro testado no teatro e que agora ganha a tela. O velho circo de Didi e DedĂ© (Santana) estĂ¡ Ă beira de fechar. JĂ¡ que os circos nĂ£o podem mais ter nĂºmeros com animais, Didi bola o espetĂ¡culo em que os humanos dĂ£o voz aos bichos. Didi e DedĂ© retomam suas trapalhadas, mas agora Ă© um elenco jovem que canta e dança, incluindo LetĂcia Colin e Livian AragĂ£o. O repĂ³rter desculpa-se pela pergunta que nĂ£o quer calar. Livian nĂ£o era nada boa quando fez com o pai O Guerreiro Didi e a Ninja Lili, em 2008. Algo se passou, porque ela nĂ£o estĂ¡ apenas mais. É talentosa – de verdade. A mĂ£e coruja conta tudo – “Ele foi estudar interpretaĂ§Ă£o em academias de Nova York, Los Angeles e Londres.” E o pai – “Fala um inglĂªs fluente.” Livian jĂ¡ estĂ¡ sendo chamada para testes nos EUA.
De cara, e para justificar o tĂtulo – Rumo a Hollywood -, Didi sonha com a glĂ³ria do Oscar, que serĂ¡ atribuĂdo por… Dan Stulbach, na pele de um apresentador gringo. Nos anos 1940 e 50, houve o que nĂ£o deixava de ser uma escola de cinema no PaĂs, e era a AtlĂ¢ntida, que praticava uma estĂ©tica da parĂ³dia, como resistĂªncia a Hollywood. Pois apesar do tĂtulo, a reviravolta do novo Saltimbancos Trapalhões vem expressa na letra de uma canĂ§Ă£o – Hollywood Ă© aqui! LĂlian reforça. “É o que Renato vive dizendo a Livian. Ela pode fazer todos os cursos do mundo lĂ¡ fora, mas seu compromisso deve ser aqui.” Dos filhos deste solo Ă©s mĂ£e, gentil, pĂ¡tria amada – Brasil! “Sou PMB, Partido pela Melhoria do Brasil”, diz o trapalhĂ£o.
Depois de lotar tantos cinemas e estabelecer parĂ¢metros de bilheteria no Brasil, Renato AragĂ£o nĂ£o estĂ¡ mais preocupado com nĂºmeros. “Faço porque gosto, porque espero agradar, mas nĂ£o penso no retorno como nĂºmero. JĂ¡ me preocupei mais com isso. Fiquei muitos anos fazendo sĂ³ TV. NĂ£o tinha tempo de pensar em cinema. Mas o Saltimbancos foi tĂ£o bacana no teatro… Deu vontade de novo.” Anos atrĂ¡s, apĂ³s um hiato, houve O Noviço Rebelde. “O pĂºblico nĂ£o compareceu, mas em toda parte o carinho das pessoas era enorme. SĂ³ nĂ£o se traduziu em ingressos. Nossa parte estĂ¡ feita, agora Ă© torcer.” O filme Ă© o 50.° de Didi. O repĂ³rter pega a deixa – “EntĂ£o precisamos ter o 51.” Afinal, o cinema Ă© uma cachaça e 51 Ă© uma boa ideia. “JĂ¡ estĂ¡ a caminho”, anuncia Didi. Depois de muito negociar, ele dĂ¡ uma palinha. Vai se chamar O Fantasma do Teatro, e serĂ¡ outro musical.
E ele estarĂ¡ no elenco? “Claro!” Mas entĂ£o tem de ser como James Bond. Tem de ter 007 no tĂtulo. “E tem, vai ser Didi e o Fantasma do Teatro.”
O tempo passa, Renato AragĂ£o fez 82 anos no dia 13. Ofende-se se alguĂ©m lhe fala em aposentadoria. “Faço o que gosto e Ă© distribuir alegria. Isso nĂ£o tem preço.”
Encanto
As mĂºsicas
As canções de Chico Buarque jĂ¡ estavam no velho Saltimbancos Trapalhões, de J.B. Tanko, de 1981, baseado no musical de Sergio Bardotti e Luis EnrĂquez Bacalov, transposto para o Brasil por Chico. Piruetas, AlĂ´, Liberdade, Hollywood, Rebichada, etc. Os funcionĂ¡rios humildes viram atraĂ§Ă£o do circo representando os bichos. Unem-se contra o mĂ¡gico SatĂ£ e o ganancioso BarĂ£o. HĂ¡ 35 anos, o mundo era outro, mas a essĂªncia do novo Saltimbancos continua a ser dar voz aos animais – aos humildes, aos excluĂdos Didi e DedĂ© de alguma forma fazem a escada para o canto e a dança dos jovens. Uma passagem feita com generosidade, mas os ‘velhos’ nĂ£o desistiram. Didi ainda sonha e nos convida a sonhar com ele.