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Gerson Conrad em entrevista no Bem Paraná (Foto: Franklin de Freitas)

Pouca gente sabe que Curitiba ganhou um morador ilustre há dois anos. O músico, compositor e arquiteto Gerson Conrad, 71 anos, que iniciou sua carreira no grupo musical Secos & Molhados, veio morar na capital paranaense por amor. Isso mesmo, ele reencontrou uma namorada da adolescência e por esta relação trocou São Paulo por Curitiba e vive um período de adaptação por aqui.

Ainda se acostuma ao comportamento mais “fechado” dos curitibanos, se perde nas ruas da cidade, mas já planeja uma agenda de shows por aqui para 2024.

Ele falou com o Bem Paraná sobre a nova vida em Curitiba, sobre os 50 anos do álbum histórico “Secos & Molhados” a gravação de uma música sua por Ney Matogrosso e muito mais.

Bem Paraná: Como você e porque você veio morar em Curitiba?

Gerson Conrad: É uma história bastante peculiar que começa no início dos anos 70.

BP – Antes mesmo do Secos & Molhados, não é?

Conrad: Eu fiz muita direção musical de teatro em São Paulo. Principalmente peças infantis, e aí em 1971, eu estava dirigindo um espetáculo em São Paulo quando acabei namorando uma figurante do corpo de bailarinas. A família dela era de São Paulo, mas se mudou para Curitiba. Começou o Secos & Molhados e naquela época era difícil manter um relacionamento à distância. Não existia celular. Para fazer um interurbano, você tinha que chamar telefonista, esperar 45 minutos a vida completar a ligação. Resumindo a história, acabamos perdendo contato, ficamos 50 anos sem nos encontrar. Até que há dois anos, recebo uma mensagem pelo Messenger do Facebook de um fulano que trabalhou na peça que eu dirigi em 1971. Eu perguntei da Gisele e ele disse que não tinha, mas me disse para eu procurar nas redes.  Eu estava com aquilo na cabeça, falei, deixa eu ver. Achei um telefone, mandei mensagem no whatsapp. Foi muito curioso, porque ela demorou uns 5 dias para me responder. Conversamos. Me contou que havia se casado, mas que o marido havia morrido há muitos anos. Eu contei que estava saindo do segundo casamento de 30 e poucos anos. Daí ela me convidou para vir conhecer Curitiba.

BP – E você veio?

Conrad – Coincidentemente era um fim de semana no início de novembro de 2021. Eu tinha um show em Porto Alegre, aí eu falei assim, puxa, esse fim de semana, infelizmente, eu não posso ir para Curitiba. Mas se o convite ficar em pé, sabe da próxima semana? Talvez dê aí. Ela perguntou em que hotel eu iria ficar. Quando eu cheguei em Porto Alegre, ela estava no saguão me esperando. Me fez uma surpresa. Aí foi assim a fome, com a vontade de comer como brinco, não é? A gente, acabou, sabe se entendendo. Ficamos juntos. Então, como ela está muito bem estabelecida aqui já há muitos anos em Curitiba, tem uma empresa que fabrica os móveis do Sérgio Rodrigues, design famoso brasileiro, me chamou para vir para Curitiba. E eu vim.

BP- Veio para Curitiba por amor então?

Conrad – Sim, eu vim para Curitiba por amor mesmo. Quando namoramos pela primeira vez eu tinha 19 para 20 anos e ela 16. Foi uma paixão de adolescência. Ficamos 50 anos sem nos ver e agora estamos construindo esta relação.  Foi uma coisa de destino.

“O sol não gosta de Curitiba e isso pra mim é uma tristeza”

BP – Você já se acostumou com Curitiba?

Conrad – Confesso a você que eu ainda não me acostumei muito com o Curitiba, apesar de ser uma cidade mais tranquila que São Paulo. É uma metrópole interiorana, na minha percepção. Por exemplo, estava em Curitiba há cinco dias e acordo muito cedo, resolvi ir no supermercado. Cheguei lá e abria só as 8h30. Fiquei uma hora esperando. Isso não acontece em São Paulo.  Sempre ouvi falar que Curitiba é uma cidade modelo, mas não é bem assim. No transporte coletivo, por exemplo, tem ônibus de hora em hora em algumas regiões. Em São Paulo, o ônibus é de seis em seis minutos.  Por outro lado, tudo é perto (risos). Aqui em 45 minutos, você atravessa a cidade. Aqui, demorei dois meses para aprender a me locomover na cidade com mapas.  Ah, o Sol literalmente não gosta de Curitiba, né? Para mim isso é uma tristeza. Tem uma coisa assim, sabe que é que que me chama muito muita atenção, acho que é um comportamento cultural.  O curitibano não te olha no rosto. Ele se passa pela rua, ele está olhando para o chão. Eu gosto de conversar, sou palhação. O curitibano não te dá espaço para você desenvolver um diálogo, desenvolver uma coisa, mas é uma questão de costume. Hoje eu realmente estou me adaptando mais

BP – O que mais você tem feito em Curitiba?

Conrad – Estou com minha carreira ativa há muitos anos e com a mudança para cá, acabei deixando de ter compromissos com meus músicos em São Paulo. Vou para São Paulo, Rio, Minas Gerais, quando tenho contrato. Cheguei a fazer um show após uma entrevista na Rádio Educativa no Teatro de Bolso, mas foi uma experiência desastrosa.

BP – Qual o motivo?

Conrad  – Primeiro que eu não conhecia ninguém, me apresentaram três músicos. São músicos excelentes, mas os músicos curitibanos parecem que não gostam de ensaiar. No dia, não tinha infraestrutura, tiveram que trocar o equipamento 10 minutos antes. Em São Paulo, os músicos ensaiam demais, aqui pouco. E em um trabalho autoral como meu é mais complicado ainda.

BP- Tem outros shows programados em Curitiba?

Conrad – Estou num ritmo mais lento, mas montei uma bela equipe aqui em Curitiba.   Eu estou com oportunidade para o ano que vem, talvez para uma apresentação no Teatro Paiol. Começando a dar início numa pequena agenda que sabia na cidade. Isso tem me deixado bastante animado. Também trabalho como arquiteto.

BP – Já tem alguma música composta aqui em Curitiba?

Conrad – Tenho. A composição é um exercício diário. Costumo tocar diariamente. Daí às vezes eu estou tocando, me surge uma ideia, eu gravo, deixo aquela ideia, sabe do armazenada lá na minha nuvenzinha.  De repente eu lembro e vou desenvolver. Desde que eu cheguei aqui, acho que eu já criei umas três ou quatro músicas inéditas, que ainda não trabalhei ainda.

“Álbum Secos & Molhados revolucionou a música”

 BP- Não temos como não falar no Secos & Molhados e álbum do mesmo nome que completou 50 anos em 2023.

Conrad – Foi um álbum que revolucionou a música e o comportamento dos brasileiros.  Foi um divisor de águas, principalmente pela indústria fonográfica. Eu participei de um tributo aos Secos & Molhados no Teatro São Pedro, em Porto Alegre, em 3 de novembro com o cantor Marcos Delfino. E foi uma loucura, porque o teatro estava pilhado de gente, deu lotação total, tinha gente de pé nas galerias. Foi de uma recepção assim fantástica do Público

BP – Quando fizeram o álbum e a banda imaginavam o sucesso que seria?

Conrad – A gente sempre foi ousado. A gente acreditava na proposta e que estávamos no caminho certo, mas não esperávamos que seria tão rápido.  O fato de a gente ter entrado já maquiado causou um impacto grande. A ideia da estreia eram dois dias de show e tivemos que estender para outra semana. Foi sucesso desde o primeiro show. Foi um ano que pouquinho mas que mudou tudo. De agosto de 1973 até agosto de 1974, nós fizemos 369 shows mais do que um por dia do ano. Depois de 1 ano, estava literalmente esgotado.

BP – Vocês passaram por Curitiba neste período?

Conrad – A gente fez Curitiba ainda em 1973 no Círculo Militar. Eu voltei no local 50 anos depois e foi interessante identificar.

BP – E qual que é a sua impressão sobre o público curitibano?

Conrad – Olha as poucas exposições que eu tive me deixaram muito confortável, porque tem uma receptividade muito, muito calorosa.

BP – E nas demais cidades?

Conrad –  Desde que acabou o Secos & Molhados eu venho numa constante na carreira apesar de não estar figurando na grande mídia. Mas eu criei um público que me conhece há muitos anos.  E esse boca-a-boca me traz gente nova.

BP – Ney Matogrosso lançou neste ano o single “O fio do meu destino”,  uma  música (relativamente) nova sua. Como foi?

Conrad – Ney me telefonou dizendo que estava querendo gravar uma coisa minha. Eu mandei uma nova e ele escolheu “O Fio do meu Destino”.  Ele é um artista impecável, mas eu particularmente não gostei da gravação e falei isso pra ele na boa. Ele descaracterizou minha criação. Como eu o conheço há 50 anos, sei que ele tem potencial para fazer uma coisa melhor que fez.  Mas eu não posso culpa-lo, porque eu tinha me comprometido a acompanhar a gravação no Rio de Janeiro, mas aí eu tive um imprevisto aqui  em Curitiba e acabei não podendo ir.

BP – Planos para o futuro, vamos aqui para a cidade. O que que a gente pode esperar do Gerson em Curitiba?

Conrad – Então eu quero como, como eu te falei, né? Eu estou empenhado agora, sabe, em ver se eu consigo realmente montar agenda.  Outro dia fui ver um espetáculo no Teatro Guaíra e se abriu uma possibilidade, além do Teatro Paiol. A partir de fevereiro, provavelmente colocarei a banda na rua.