Além das dificuldades extras da pandemia, alguns estudantes que prestaram vestibular na Pontifícia Universidade Católica (PUCPR) viram o sonho de iniciar o curso superior em 2021 acabar porque não conseguiram fazer provas online devido a problemas no sistema. A reportagem conversou com vários estudantes nesta situação. Alguns não quiseram se identificar com medo de represálias e porque ainda aguardam um posicionamento oficial da instituição, mas todos têm em comum a frustração, a tristeza e a sensação de um ano perdido de estudos. A questão deve caminhar para uma batalha judicial.

O vestibular online da PUCPR foi dividido em duas partes. Um para os cursos em geral no dia 22 de novembro e outro no último domingo (6) exclusivo para o curso de Medicina. De acordo com os estudantes ouvidos pela reportagem, os dois apresentaram os mesmos problemas, ou seja, mesmo com espaço de 13 dias, a PUCPR não corrigiu os problemas e nem adiou a segunda etapa. Os vestibulandos lesados se uniram em grupos de whatsapp, no Facebook, fizeram postagens no Twitter, apresentaram recursos formais à instituição e postaram relatos no site Reclame Aqui, especializado em questões do consumidor. Mas até agora, a única resposta que os estudantes têm da universidade por e-mail é que a Comissão de Vestibular vai analisar as reclamações, sem prazo definido.

A reportagem do Bem Paraná apresentou todas as reclamações à assessoria de imprensa da PUCPR, pediu três vezes um retorno, mas não houve resposta. O silêncio pode ser proposital, já que, segundo a advogada Melissa Pilotto, doutoranda em Ciências Jurídicas na Universidade do Vale do Itajaí (Univali), mestre em Direito pelo UniCuritiba e Professora de Direito de graduação e de pós-graduação, sem um posicionamento final da instituição fica difícil os alunos entrarem na Justiça em busca dos seus direitos.  Ela acredita que as falhas do processo seletivo da PUCPR podem virar uma batalha judicial dependendo dos próximos passos da universidade. Segundo ela, no entanto, para que os alunos prejudicados possam entram na justiça é preciso que a universidade dê uma resposta definitiva sobre as falhas. “O fato de os problemas terem acontecido na prova do dia 22 de novembro e não terem sido corrigidos para o vestibular do dia 6 pode complicar e render dano moral”, explicou a advogada.

Na opinião dela, a universidade não se manifestou porque é uma questão complicada e devem estar colhendo todos os dados técnicos possíveis: “Se eles decidirem pelo cancelamento do vestibular, quem conseguiu fazer a prova ou aqueles que já passaram poderão também entrar na justiça levando a anos de batalhas judiciais e no caso de medicina, que é um curso caríssimo, fica mais complicado ainda”.

A diretora do Procon-PR, Cláudia Silvano, disse que os estudantes que se sentiram lesados com os problemas nas provas online podem também recorrer ao órgão de defesa do consumidor: “Eles podem pedir que refaçam as provas ou o dinheiro da inscrição de volta. Basta ir ao portal do Procon”.

A estudante Ana Paula Muller, que prestou vestibular para Medicina no último domingo, foi uma das que apresentou recurso formal por e-mail à PUCPR. Ela contou que faltavam 30 minutos para o encerramento do segundo dos três blocos de provas, que começava as 13 horas, quando apareceu uma notificação dizendo que a câmera tinha desconectado e pedindo para acessar a plataforma novamente. “Eu reconectei e novamente veio o mesmo aviso. Quando eu tentei reconectar apareceu uma mensagem dizendo que eu tinha sido bloqueada e que não poderia finalizar a prova. Tentei reconectar pelo menos três vezes, tentei entrar em contato com a PUCPR pelo fone de suporte 30031717 sem sucesso. Só com a ajuda de professores do ensino médio consegui um contato, que se limitou a informar que eu deveria mandar um e-mail relatando o problema, o que foi feito”, explicou Ana Paula.  Ela providenciou uma análise técnica de um profissional de T.I do computador usado para prova e foi atestado que não havia problema: “Se houve algum problema foi no programa usado pela instituição. Nas redes sociais há vários relatos de problemas semelhantes, inclusive no Reclame Aqui, acho que esse vestibular tem que ser anulado. Estou abalada psicologicamente com tanto descaso”.  A inscrição para o vestibular de Medicina foi R$ 390 dos outros cursos foi R$ 79.

Sofia Barrozo tinha a intenção de prestar vestibular na PUCPR para Administração no dia 22 de novembro. “Estava realizando a prova do vestibular, quando o sistema travou na questão 7. Fiquei tentando entrar em contato com o suporte por mais de duas horas e ninguém me atendeu. Depois de 3 horas de tentativa consegui falar no WhatsApp, mas não conseguiram me ajudar.  A minha prova estava como finalizada”, explicou ela. De acordo com a vestibulanda, a universidade demorou dez dias para responder o e-mail com a reclamação afirmando que a prova estava concluída e que a comissão avaliaria o caso: “Isso é um absurdo. Estudei o ano inteiro para entrar na PUCPR e perdi a oportunidade por falha deles. O curioso é que o mesmo problema aconteceu no vestibular para o curso de Medicina, que foi feito depois, no dia 6 de dezembro. A frustração é unânime entre os alunos prejudicados, afinal foi um ano de estudo perdido. “

‘Gastei tempo, dinheiro e estou inconformado com arrogância da instituição’

Um vestibulando que não quis se identificar disse que se sente lesado tanto emocionalmente quanto materialmente. Além do preço alto da inscrição, R$ 390, ele gastou com câmera e microfone para realizar as provas: “No último domingo, após uma hora tentando em mais de um computador a acessar o sistema da PUCPR e me comunicar com algum assistente, perdi a oportunidade de tentar cursar Medicina na instituição. Gastei incontáveis horas me preparando para o teste, dinheiro com cursinho e professores particulares. Ele também reclamou da demora para a PUCPR responder os questionamentos: “Estou inconformado com a arrogância dos responsáveis por esse processo seletivo extremamente frágil e falho, que além de demorarem mais de um dia para responder os e-mails de reclamações, prepararam uma prova repleta de erros de português e ambiguidades Os danos causados são inimagináveis”.

Outra inscrita no vestibular de Medicina que também que teve a prova terminada antes do terceiro bloco de perguntas e da redação disse estar indignada com a falta de suporte, porque telefones não atendiam no momento da prova e com o fato de que os vestibulandos do dia 22 de novembro já tinham enfrentado os mesmos problemas; “Isso era uma falha do sistema que eles sabiam e já devia ter sido corrigida, pois o mesmo foi ocorrido no vestibular feito por eles no dia 22 de novembro”.

Candidatos se depararam com diversas mensagens de erro

Para outro candidato de Medicina, o sistema caiu três vezes, nas duas primeiras ele conseguiu retornar e concluir dois blocos. Na terceira vez, ao tentar retornar novamente, teve a prova interrompida com a seguinte mensagem “o teste do candidato já está completo”.  Um vestibulando disse que a sua prova foi interrompida pela mensagem “não é possível acessar nossos servidores de streaming de vídeo” e que depois de várias tentativas, a tela exibiu a mensagem“ o teste do candidato já está completo”. Os candidatos também relataram outros avisos no sistema como pedido para solicitar ao administrador que permitisse as URLs listadas: “Entrei em contato pelo whats app e o atendente me disse que se tratava da rede de acesso, no entanto minha rede não apresentava problemas”.

Outra inscrita no processo seletivo para Medicina relatou à reportagem do Bem Paraná que o sistema não entrou já no começo das provas e que tentou em dois computadores e mesmo assim não deu certo. Como nos outros casos, ela não conseguiu contato com os meios de comunicação disponibilizados pela instituição: “E antes de começar eu fiz todos os testes enviados. Isso foi muito triste para todos nós. O sistema online adotado pela PUCPR não funcionou, apesar de todas as garantias de que ele seguro”.