
Neste sábado (17) o cantor e compositor uruguaio Jorge Drexler volta ao palco do Teatro Guaíra, em Curitiba, para apresentar seu mais novo álbum, Tinta y Tiempo. Os fãs do artista vão poder encerrar uma espera de mais de três anos, já que sua última apresentação na cidade aconteceu em junho de 2019, antes da pandemia.
Se em sua última visita Drexler trouxe um show intimista, dessa vez promete uma experiência muito mais expansiva. “Há muitos anos faço um trabalho pendular. Fiz um show muito animado em 2018, na Ópera de Arame, depois mais intimista, em 2019, e agora trago de novo um espetáculo de celebração.”
Ele subirá ao palco do Guairão com uma banda totalmente nova e plural, formada por seis solistas – artistas com projetos individuais e que se uniram exclusivamente para essa turnê. “São músicos de vários lugares, como Guiné-Bissau, Barcelona, Madri, Buenos Aires e Bilbao, formando uma banda bastante sonora”, conta Drexler.
As primeiras canções de Tinta y Tiempo, que é o 14º. disco da sua carreira, nasceram ainda durante o confinamento, o que traz ao álbum um certo ar de refúgio e introspecção. Porém, embora delicado, é um trabalho também pulsante, que passa longe da melancolia, como mostram as faixas Tocarte, com participação de C. Tangana, e ¡Oh, Algoritmo!, com Noga Erez.
O show de sábado começa às 21 horas, tem classificação livre e duração de 80 minutos e os últimos ingressos estão sendo vendidos pela plataforma Disk Ingressos. Antes de vir a Curitiba o cantor passou pelo Uruguai, sua terra natal, de onde falou com exclusividade ao ‘Bem Paraná’.
Bem Paraná – Você abre o álbum ‘Tinta y Tiempo’ com a frase “Corría la era del Mesoproterozoico”, o que não é estranho para quem já ganhou um Grammy com uma canção sobre telecomunicações. Como essas temáticas tão fora do comum entram no Jorge Drexler e depois saem em forma de canções que funcionam muito bem com o público?
Jorge Drexler – De alguma forma, todos esses temas acabam nos levando para dentro da alma e ampliam o espaço da canção como gênero artístico. Sinceramente, aprendi a promover essa expansão com a música brasileira. Como Gilberto Gil ou como Chico Buarque, que fez alguns dos melhores textos e canções que conheço, levando com maestria temáticas formais para dentro da literatura. Assim como Caetano Veloso, que em Noite do Norte traz um verdadeiro discurso sobre a escravidão e que não tem rima. Todos eles me ensinaram que a canção não tem limite e pode atingir todos os aspectos da experiência humana. E eu senti essa liberdade.
BP – Em 1997 o Gilberto Gil lançou um álbum chamado Quanta, que trata da produção científica, da tomada de consciência do ser humano, na mesma linha que você gosta de criar. Esse disco te influenciou?
JD – Totalmente. Nunca falei sobre isso antes, mas conheço de cor esse disco do Gilberto Gil, que é baseado na física do século XX. Pouco depois dele eu comecei a integrar a ciência nas minhas canções. Não tenho dúvida nenhuma de que isso foi, em parte, responsabilidade do Gil, com o álbum Quanta.
BP – Você tem uma relação muito bonita com o Brasil e com a América Latina de forma geral. Em Tinta y Tiempo faz referência à música folclórica argentina. Já Bailar em La Cueva traz muito da Colômbia e Salvavidas de Hielo tem muito do México. Você tem – ou pretende ter – um disco que diga “esse é o meu disco mais brasileiro”?
JD – Vou confessar uma coisa que também nunca contei antes. Uma das minhas intenções principais era gravar esse disco novo no Brasil. Eu estava convencido, porque realmente falta esse álbum brasileiro. Porque tenho uma densidade muito grande de amigos músicos aí, tenho conhecimento e um amor muito grande pela cultura do país. Seria maravilhoso passar um tempo em São Paulo e no Rio, com amigos como Tó Brandileone, Marisa Monte e muitos outros. E ir até a Bahia ver o Carlinhos [Brown]. Veio a pandemia e não consegui fazer, mas ainda está nos meus planos. O disco bem brasileiro ainda não aconteceu, mas o Brasil está em todos os meus álbuns, como no primeiro, com a música Éden, que fala do Carnaval de Salvador.
BP – Essa sua relação com o Brasil chama atenção, porque nem sempre é simples para outros artistas latinos criarem uma conexão fluída com o país. Concorda que, apesar de vizinhos, ainda existe uma barreira cultural, idiomática?
JD – Sim, minha trajetória é uma exceção. Por isso me considero muito afortunado e agradecido ao público brasileiro. Não é habitual que o Brasil se abra tanto para músicos estrangeiros e isso acontece porque o país tem uma autonomia musical muito grande – que é resultado de uma produção musical de qualidade muito grande também. Por outro lado, nós uruguaios temos uma relação direta com o Brasil. Somos o único país que tem uma fronteira de mil quilômetros quase totalmente transitáveis com o Brasil. É uma fronteira aberta, é muita conexão. Eu, por exemplo, falo português sem nunca ter tido aulas. Nem sei como eu falo português [risos] e isso acontece com muitos uruguaios.
BP – E aqui em Curitiba, tem algo que te marca? Como é a sua relação com a cidade?
JD – Eu conheço Curitiba há muito tempo. Quando era bem jovem viajei bastante pelo Brasil. Entre 1988 e 1989 estive na cidade pela primeira vez, visitando um amigo que tinha ido estudar, e já naquela época adorei Curitiba, seu ambiente estudantil. Quando estou em turnê não consigo visitar pontos específicos, porque é muito corrido, mas gosto muito do ambiente da cidade, da sua poesia, do Paulo Leminski. Gosto da conexão que o público tem com a poesia. É uma cidade inteligente, perceptiva. Eu me sinto muito confortável quando vou e estou muito animado para sábado.