O candidato a cantor esganiçava e um som de campainha (téééiiin!) o interrompia como um aviso de que ‘seu tempo de glória acabou, meu filho’. Imediatamente, o sorridente apresentador perguntava à ácida jurada o que havia de errado com o calouro. A jurada não perdoava e apontava como itens reprováveis a voz fanha ou a calça frouxa. Ou as duas coisas. Tal cena se repetia, com algumas variações, semanalmente no ‘Show de Calouros’, do SBT.
Acompanhado pelo largo sorriso de Silvio Santos, o folclórico comentário ranzinza de Aracy de Almeida frequentou o cardápio dominical de milhões de telespectadores nos anos 1980. ‘Vai ganhar dez paus e estamos conversados!’, resumia aquela senhora diante dos candidatos que (ufa!) conseguiam não ser devastados pela campainha, que nem sempre era disparada pela jurada. Pelo menos, é o que ela dizia em entrevistas.
Ficou na memória popular a imagem da desbocada dos programas de auditório. Imagem esta que desagradava amigos da cantora e pesquisadores musicais. Sim! Nas enciclopédias, a carioca Aracy era e é a voz dos sambas de Noel Rosa: ‘Último Desejo’, ‘Conversa de Botequim’, ‘Três Apitos’, entre outros clássicos.
No final dos anos 1930, a grande intérprete do ‘poeta da Vila Isabel’ encontrou um príncipe. Quer dizer, um Rei: o curitibano José Fontana, goleiro do Vasco da Gama e de bom círculo entre os artistas do rádio e da noite carioca. Campeão estadual com o Coritiba (1931) e com o Vasco (1934 e 1936), Rei viveu quatro anos de romance com Aracy, de 1938 e 1942. Uma das melhores histórias deste período inclui David Nasser, compositor e mais tarde famoso repórter da revista ‘O Cruzeiro’. Ainda desconhecido, o jornalista bateu na porta do casal. Aracy não estava, mas Rey ouviu o apelo de Nasser, que pretendia ter uma criação sua gravada pela cantora. Limpando a casa, o goleiro propôs: ‘Você me ajuda a encerar a casa e ela grava o samba’. Fato ou lenda, a história é ótima. E fato é que Aracy registrou em disco ‘Com Sem Razão ou Sem Razão’, parceria de Nasser com Ari de Almeida:
‘Com razão ou sem razão
Convém nossa separação
Eu fiz tudo, mas em vão
Pra nosso amor não ter fim
Mas alimentar a ilusão
É sacrifício demais pra mim’
Sem que a canção tivesse culpa alguma, o casal realmente se separou. E quando o amor acabou, Aracy se recusou a pronunciar a palavra ‘rei’, presente originalmente em ‘Engomadinho’, de Pedro Caetano e Claudionor Cruz. Segundo estudiosos da MPB, Pedro Caetano trocou ‘rei’ por ‘seresteiro’ e o samba ficou assim:
‘A chave que abriu a liberdade
Para o meu coração cheio de dor
Está na voz e na simplicidade
Deste seresteiro, que é o meu amor’.
Também grafado como ‘Rey’, o goleiro revelado no Coxa disputou três jogos pela Seleção Brasileira e ainda defendeu Bonsucesso, Bangu, Portuguesa e Bragantino. Depois de encerrar a carreira, voltou para Curitiba, onde morreu em 1986, com 74 anos. Aracy, a popular algoz dos calouros, faleceu em 1988, com 73.
O romance não durou para sempre, mas Rei tornou-se o único jogador que saiu do futebol paranaense para exercer alguma influência na música brasileira.
iiin!) o interrompia como um aviso de que ‘seu tempo de glória acabou, meu filho’. Imediatamente, o sorridente apresentador perguntava à ácida jurada o que havia de errado com o calouro. A jurada não perdoava e apontava como itens reprováveis a voz fanha ou a calça frouxa. Ou as duas coisas. Tal cena se repetia, com algumas variações, semanalmente no ‘Show de Calouros’, do SBT.
Acompanhado pelo largo sorriso de Silvio Santos, o folclórico comentário ranzinza de Aracy de Almeida frequentou o cardápio dominical de milhões de telespectadores nos anos 1980. ‘Vai ganhar dez paus e estamos conversados!’, resumia aquela senhora diante dos candidatos que (ufa!) conseguiam não ser devastados pela campainha, que nem sempre era disparada pela jurada. Pelo menos, é o que ela dizia em entrevistas.
Ficou na memória popular a imagem da desbocada dos programas de auditório. Imagem esta que desagradava amigos da cantora e pesquisadores musicais. Sim! Nas enciclopédias, a carioca Aracy era e é a voz dos sambas de Noel Rosa:
‘Último Desejo’, ‘Conversa de Botequim’, ‘Três Apitos’, entre outros clássicos.
No final dos anos 1930, a grande intérprete do ‘poeta da Vila Isabel’ encontrou um príncipe. Quer dizer, um Rei: o curitibano José Fontana, goleiro do Vasco da Gama e de bom círculo entre os artistas do rádio e da noite carioca. Campeão estadual com o Coritiba (1931) e com o Vasco (1934 e 1936), Rei viveu quatro anos de romance com Aracy, de 1938 e 1942. Uma das melhores histórias deste período inclui David Nasser, compositor e mais tarde famoso repórter da revista ‘O Cruzeiro’. Ainda desconhecido, o jornalista bateu na porta do casal. Aracy não estava, mas Rey ouviu o apelo de Nasser, que pretendia ter uma criação sua gravada pela cantora. Limpando a casa, o goleiro propôs: ‘Você me ajuda a encerar a casa e ela grava o samba’. Fato ou lenda, a história é ótima. E fato é que Aracy registrou em disco ‘Com Sem Razão ou Sem Razão’, parceria de Nasser com Ari de Almeida:
‘Com razão ou sem razão
Convém nossa separação
Eu fiz tudo, mas em vão
Pra nosso amor não ter fim
Mas alimentar a ilusão
É sacrifício demais pra mim’
Sem que a canção tivesse culpa alguma, o casal realmente se separou. E quando o amor acabou, Aracy se recusou a pronunciar a palavra ‘rei’, presente originalmente em ‘Engomadinho’, de Pedro Caetano e Claudionor Cruz. Segundo estudiosos da MPB, Pedro Caetano trocou ‘rei’ por ‘seresteiro’ e o samba ficou assim:
‘A chave que abriu a liberdade
Para o meu coração cheio de dor
Está na voz e na simplicidade
Deste seresteiro, que é o meu amor’.
Também grafado como ‘Rey’, o goleiro revelado no Coxa disputou três jogos pela Seleção Brasileira e ainda defendeu Bonsucesso, Bangu, Portuguesa e Bragantino. Depois de encerrar a carreira, voltou para Curitiba, onde morreu em 1986, com 74 anos. Aracy, a popular algoz dos calouros, faleceu em 1988, com 73.
O romance não durou para sempre, mas Rei tornou-se o único jogador que saiu do futebol paranaense para exercer alguma influência na música brasileira.