Em dezembro, já sob os efeitos da pandemia em bares, restaurantes e espaços culturais da cidade, o 92Graus, histórica casa de shows curitibana, celebrou 29 anos com uma série de lives, mantendo uma tradição de cantar parabéns ao longo de vários dias e muitas performances. As transmissões ao vivo foram o embrião da nova empreitada do incansável JR Ferreira, músico, produtor, empresário proprietário do espaço, que vem fazendo de tudo para mantê-lo funcionando.
O ‘Show do Jovem’ é um programa semanal transmitido diretamente do 92, sob o comando dele, claro. Com escassos recursos financeiros e técnicos, o “maior programinha de Rock da cidade” é curto, simples e com os recursos disponíveis. “O nome, veio do céu que nem raio e adotamos”, conta. Quem conhece sabe. Qualquer um que convive com ele já foi cumprimentado com um caloroso “E aí, jovem…?”
“Um programinha legal no 92 para levar entretenimento aos jovens roqueiros durante a pandemia”, explica ele, bem ao seu estilo divertido de ser. O sétimo episódio irá ao ar na próxima quinta-feira, às 20h, pela página do Facebook. A ideia aposta no talento nato de Ferreira, que tem o apoio de alguns ‘Jovenzinhos’ nesta empreitada. Vídeos, transmissão e edição estão a cargo do produtor audiovisual André Otto Silva de Almeida; Luciano Popadiuk colocou na roda mais câmeras e cuida da iluminação, e o “velho punk’ Rodrigo Meister, da No Milk Today, ajuda na divulgação e dá pitacos pra irmos acertando os tropeços”, explica Ferreira.
O ‘Show do Jovem’ conta até com apoio e propaganda do Lado B, outro endereço voltado a este perfil de público, cujos proprietários são amigos e fãs que sabem bem o que ele está passando. “Se para nós, que conseguimos abrir como restaurante, tá muito difícil pagar as contas, imagine para ele”, diz Regina Walger, sócia do Lado B.
Entrevistas, clipes, vinhetas inspiradas, convidado ao vivo e, claro, o anfitrião, um dos mais genuínos e talentosos artistas gerados por aqui, com performances cheias de bom humor, perspicácia e doses de impertinência. Entre os quadros tem o ‘Túnel do Tempo’, com vídeos de shows antigos no 92; e ‘London Callling’, conversas com artistas que lá se encontram contando suas aventuras de além mar. “As atrações são surpresa, pois às vezes fazemos com quem está mais próximo e preparado para enviar os vídeos”, explica ele, mandando a real, como sempre, sem disfarces.
Dizer que JR está fazendo de tudo para manter o espaço, não é força de expressão. Sempre foi assim. Mas, agora, a coisa toda ganhou outra dimensão. Além das adequações exigidas pela pandemia, precisou desbravar novos ambientes dentro dos 460m2 do terreno e foi ainda mais longe, passando a fazer trabalhos remotos que vão de colocação de pisos e rodapés, pintura, até pequenos fretes com sua velha veraneio de guerra, a ‘Preciosa’.
Tem sido assim desde que as portas foram fechadas pela primeira vez, em 14 de março de 2020, período em criou um belo espaço externo e realizou sorteios de instrumentos doados por outros ‘jovens’ amantes do 92. O próximo passo é a lanchonete – café, em horário comercial. “No mais, é só boletos empilhados, contas e juros que só crescem sem nenhum recurso”.
O Garden Now do 92, nos fundos do terreno, é amplo arejado e seguro, pois permite manter distanciamento, além do respeito aos procedimentos de segurança exigidos. “Montando com material 100% doado e reciclado, muita pá, enxada e picareta para nivelar a terra, que era um brejo numa pirambeira”, explica, sobre o ambiente mais usado no momento, mediante reserva. “Estou fazendo tudo o que posso pra não deixar cair a peteca uma vez que não dá pra contar com nenhum apoio ou auxílio de qualquer entidade pública. Ao contrário, elas só colocam mais regras, multas e empecilhos. Haja coração e sanidade pra lidar com tudo isto, que tem gerado enorme desgaste físico e emocional”, observa.
Para completar, a casa está à venda e tem sido seu maior pesadelo. “Ter este fantasma rondando, a possiblidade de ter que largar tudo e fechar a casa definitivamente é mais nociva que a pandemia”, assegura. “Tenho feito de tudo um pouco reza braba, velas, meditações, rifas, lives, fretes, pinturas, reparos em telhados”, relata, com seu bom humor habitual. “E procurando um patrocinador que me ajude a resolver pra resolver compra da casa, implantar o Museu e demais ações de preservação da nossa memória”.
Serviço
O show do Jovem
Quando: Todas as quintas-feiras, 20h.
Onde: https://www.facebook.com/92graus
Pix para doações: 760722829-20
SAIBA
Linhas de crédito
“Uma empresa cultural que já rasteja para se manter em tempos normais não consegue ter capital giro quando chega uma pandemia com a extensão que temos”, explica Jr Ferreira, um dos tantos pequenos empresários locais em dificuldades, sobre a impossibilidade de acesso às linhas de crédito. “Já negociei, mas tem conta pagas duas vezes e ainda devo. Não acaba nunca”, desabafa. “Com Copel e Sanepar não tem negociação. Como a gente faz para gerar emprego se o negócio virou risco gigante”, questiona, citando a Inglaterra, de onde chegam notícias de músico que foram depois da pandemia, estão cadastrados, recebendo auxilio, vacinados e os pubs fechados tiveram 80% das contas pagas pelo governo.
O IPTU aqui também foi para estratosfera. “Ao invés ajudar pra galera conseguir passar por isso, o prefeito faz o contrário. Sabemos que os shows não voltarão tão cedo. Tô fazendo de tudo para não encerrar. Talvez transformar o 92 em um instituto, quem sabe e conseguir um patrocinador, porque não é muito o que preciso aqui para manter”, finaliza JR Ferreira. (AP)