
Vinte anos após o estouro da chamada Máfia do Apito, escândalo que abalou o futebol brasileiro em 2005, a história de Edilson Pereira de Carvalho ainda é lembrada como um divisor de águas no debate sobre a formação e a fiscalização dos árbitros no país. O ex-juiz, banido definitivamente do esporte por manipulação de resultados, já havia dado sinais de irregularidades três anos antes do episódio que escancarou o maior esquema de fraude em jogos do Brasil.
Em 2002, Edilson foi suspenso do quadro de arbitragem da CBF ao ser descoberto que seu diploma de ensino médio — requisito obrigatório para exercer a função — era falso. À época, a responsabilidade foi atribuída pela comissão de arbitragem da CBF à Federação Paulista de Futebol (FPF), que havia validado sua inscrição. Segundo Armando Marques, então presidente da comissão, Edilson só voltou a apitar após apresentar um novo diploma, obtido em um curso supletivo durante o período de suspensão.
O próprio Marco Polo Del Nero, então presidente da FPF, admitiu a condução pouco criteriosa da volta do árbitro: “Nós afastamos o Edilson por dez meses, mas depois ele voltou a atuar pela Fifa e pela CBF com o documento regularizado. Aí fomos no embalo deles e voltamos a aproveitá-lo”, declarou.
Escândalo
Três anos depois, em 2005, Edilson se tornaria o protagonista do escândalo que ficou conhecido como Máfia do Apito, sendo acusado de manipular resultados para beneficiar apostadores. Banido do futebol, sua trajetória expôs não apenas a fragilidade dos mecanismos de controle na época, mas também a permissividade de instituições que ignoraram sinais de alerta anteriores.
Documentário
A série documental A Máfia do Apito, lançada em setembro pelo SporTV em parceria com a Feel The Match, revisita o caso e traz à tona inclusive o episódio do diploma falso. O documentário, que marca os 20 anos do escândalo, busca recontar não apenas a trama das manipulações, mas também refletir sobre a vulnerabilidade estrutural da arbitragem brasileira naquele período. “Talvez a grande história por trás seja de que o Edilson, assim como um grande jogador, que desde a base já mostra suas características, também tinha isso em sua conduta pouco ética. O futebol foi permissivo”, afirma Bruno Maia, CEO da Feel The Match e diretor da série.
Duas décadas depois, os critérios de entrada e a preparação de árbitros foram fortalecidos, com regras mais claras, maior controle documental e exigência constante de atualização. O processo inclui etapas que vão além da formação técnica, com ênfase em ética e conduta profissional.
Requisitos básicos
- Idade mínima entre 18 e 25 anos (dependendo da federação).
- Ensino médio completo.
- Boa condição física e saúde compatível.
- Ausência de antecedentes criminais.
Curso de formação
- Oferecido pelas federações estaduais.
- Aulas teóricas (regras, ética, psicologia, legislação esportiva) e práticas (campo, treinos físicos).
- Duração entre alguns meses e até um ano.
Avaliações obrigatórias
- Provas teóricas.
- Testes físicos de resistência, velocidade e agilidade.
- Avaliações práticas em campo.
Cadastro e evolução
- Registro inicial na federação estadual, atuando em categorias de base e futebol amador.
- Possibilidade de ascensão a competições profissionais estaduais, nacionais (via CBF) e, posteriormente, internacionais (via FIFA).
Atualizações constantes
- Cursos de reciclagem, treinamentos físicos e estudo contínuo, já que as regras sofrem alterações anuais.
Carreiras
O caso Edilson mostrou que falhas na porta de entrada da arbitragem podem abrir espaço para carreiras comprometidas e, em última instância, para episódios que afetam diretamente a credibilidade do esporte.
Hoje, as federações e a CBF reforçam que o controle documental e o acompanhamento de conduta fazem parte do processo de formação, justamente para evitar brechas como as que marcaram o início da trajetória de Edilson Pereira de Carvalho.
Se, no passado, um diploma falso passou despercebido e um árbitro com histórico questionável foi reintegrado sem maiores cuidados, o futebol brasileiro agora tenta assegurar que a arbitragem seja formada com mais rigor, preparo físico e ético — e que novos escândalos como o da Máfia do Apito fiquem apenas como lembrança de um tempo de fragilidades institucionais.