O Paraná tem três novos pilotos, que iniciaram a trajetória nas pistas no kart, e são apontados como com jovens talentos do automobilismo. São três atletas que representam fases diferentes dessa escalada: Felipe Drugovich tem 25 anos, é de Maringá, no Noroeste do Estado, e já está na Fórmula 1 como piloto de teste; Zezinho Muggiati, curitibano de 22 anos, é revelação da Stock Car; já o jovem de 14 anos Guilherme Moleiro é de Rolândia, Norte do Paraná, e é promessa precoce do kartismo nacional.
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Em trilhas distintas, mas com a mesma origem, os pilotos paranaenses mostram por que estão entre os mais promissores do país, seja pela técnica, pelos resultados ou pela maturidade em pista. O que os une é o talento lapidado desde cedo.
Kart é porta de entrada de pilotos para automobilismo
O ponto de partida é quase sempre o mesmo: o kart. É nele que os pilotos aprendem os fundamentos da pilotagem: como traçar curvas, defender posições, lidar com disputas roda a roda e, sobretudo, desenvolver o raciocínio rápido que o esporte exige.
A modalidade é acessada ainda na infância, geralmente entre 5 e 8 anos, e serve como base para qualquer carreira no automobilismo profissional. A partir do kart, os caminhos se bifurcam.
Os pilotos que sonham com a Fórmula 1, considerada o topo da pirâmide, geralmente partem para a Europa na adolescência. Lá, entram em categorias como Fórmula 4, Fórmula Regional e Fórmula 3, subindo degrau por degrau até a Fórmula 2, que é a etapa final antes da F1.
É um percurso técnico, longo e caro, que exige resultados consistentes, apoio financeiro e oportunidades bem construídas. Felipe Drugovich percorreu essa rota com êxito.
Carros de turismo na Stock Car
Outro caminho é o dos carros de turismo, mais sólido dentro do Brasil e com estrutura profissional. Pilotos como Zezinho Muggiati optam por essa trajetória e constroem carreira na Stock Car, a principal competição da modalidade no país.
Com mais visibilidade nacional, a Stock Car oferece prestígio, competitividade e estabilidade para quem deseja viver do automobilismo em alto nível.
Já talentos mais jovens, como Guilherme Moleiro, ainda estão no kart. É uma fase decisiva, em que títulos estaduais e nacionais funcionam como vitrine para programas de formação, patrocínios e convites de equipes maiores. O desempenho nessa base define o quanto um piloto pode subir.
Escolas de automobilismo
Guilherme Moleiro é uma das maiores promessas do kartismo brasileiro. Aos 14 anos, o piloto de Rolândia acumula um currículo impressionante para a idade: campeão da Copa Brasil, tricampeão paranaense, campeão do Open da Copa Brasil, tricampeão da Copa São Paulo Light e vice-campeão brasileiro. A quantidade de títulos evidencia uma consistência rara para alguém da sua idade.
Mas a trajetória de Guilherme não começou no kart, e sim nas motos. “Ele começou no motocross. Mas um amigo da família achou perigoso e apresentou o kart pra gente. Começou com seis anos e nunca mais quis sair”, conta o pai, Paulo. O avô foi o primeiro incentivador: levava o menino ainda pequeno aos kartódromos, onde ele ficava fascinado pelo volante e pelos carros.
Desde então, a rotina do garoto mudou. A infância passou a ser dividida entre escola, treinos, viagens e corridas. “Ele perde aula, perde um pouco da infância. Mas não dá pra chegar onde ele chegou sem abrir mão de algumas coisas”, afirma Paulo, que acompanha o filho em todas as etapas.
Nos primeiros anos, como acontece com tantos outros talentos, o investimento veio da própria família. Hoje, com os bons resultados e a projeção crescente, Guilherme começa a atrair patrocinadores. A visibilidade aumentou, especialmente com a entrada dele na Fórmula Delta, categoria de base do automobilismo nacional.
Apesar da experiência em corridas de fórmula, o futuro da carreira aponta para os carros de turismo. A família já planeja os próximos passos: entrar na academia da Stock Car e, posteriormente, disputar a Stock Light – categoria de acesso à principal competição de turismo do país.
O jovem piloto já deu os primeiros passos fora do kart: estreou na Fórmula Delta, categoria de base da modalidade de fórmula. A meta, no entanto, está nos carros de turismo. “Ainda estou em desenvolvimento. Estreei neste ano na Fórmula Delta e tive apenas uma corrida. Preciso desenvolver mais. Para entrar na Stock Light ainda preciso ter 16 anos, então tenho dois anos para isso”, diz Guilherme.
O objetivo é claro: conquistar uma vaga na Academia da Stock Car, projeto que prepara jovens talentos para a Stock Light – categoria de acesso à principal competição de turismo do país. “Além da pilotagem, ainda vou precisar do apoio de patrocinadores, porque o investimento é alto”, afirma.
Piloto de Stock Car José Luiz Muggiato Neto é de Curitiba
Natural de Curitiba, José Luiz Muggiati Neto, o Zezinho, é uma das principais promessas do automobilismo nacional. Aos 22 anos, disputa sua segunda temporada na Stock Car Pro Series, a categoria máxima de carros de turismo no Brasil. A participação iniciou depois de uma trajetória sólida no kart e uma passagem decisiva pela Stock Light, onde foi campeão em 2023.
Zezinho começou a correr ainda criança, com cinco anos, no extinto kartódromo Raceland, em Curitiba. Construiu um currículo de títulos no Paraná, em São Paulo e em torneios nacionais, como a Copa Brasil e o Campeonato Brasileiro de Kart.
A consistência nas pistas o levou à vitória na seletiva da Academia Toyota Gazoo Racing Brasil, que promove jovens talentos do kart para o turismo. Ele foi o grande vencedor da primeira edição do projeto, o que lhe garantiu a estreia na Stock Light em 2020.
Foram três temporadas na categoria de acesso, com um desempenho crescente: vice-campeão em 2022 e campeão absoluto em 2023, resultado que lhe rendeu o maior prêmio da história do automobilismo brasileiro – um subsídio de R$ 2,5 milhões para disputar a temporada seguinte na Stock Car.
Com a verba e o apoio de patrocinadores paranaenses, Zezinho estreou na elite do esporte em 2024, largando em segundo logo na primeira corrida, ao lado de ídolos como Felipe Massa e Rubens Barrichello. “Foi o momento mais marcante da minha carreira. Eu olhei para trás e estava o Rubinho e o Felipe Massa, meus ídolos que eu assistia na televisão. É emocionante chegar no lugar onde esses caras estão e saber que sou capaz de disputar com eles”, diz.
Mais do que títulos, Zezinho é reconhecido pela maturidade ao volante. Sua condução é limpa, estratégica e cuidadosa com os pneus – habilidade rara em uma categoria conhecida pela agressividade e equilíbrio técnico.
Inspirado em duas referências da Fórmula 1, o heptacampeão Lewis Hamilton pelo estilo controlado e no tetracampeão Max Verstappen pela ousadia, Zezinho aposta na combinação dos dois perfis para construir sua identidade nas pistas. “O que falta para o Zezinho é um pouco do Verstappen”, brinca, ao falar de si mesmo.
A escolha por carros de turismo, e não pela sonhada Fórmula 1, foi pragmática: mesmo após testes na Fórmula 4 Italiana, Zezinho optou por uma carreira sólida no Brasil, onde acredita que há espaço para crescer, competir em alto nível e até buscar oportunidades internacionais em corridas de longa duração – como fazem nomes como Daniel Serra e Dudu Barrichello.
“Colocamos as duas propostas na mesa e vimos que no Brasil eu correria de graça, podendo até ganhar dinheiro com isso já no primeiro ano de competição. Na europa não tinha patrocínio, teria que me manter com dinheiro da própria família que, sendo sincero, nem tinha como”, conta Zezinho sobre voltar ao Brasil.
Primeiro campeão na Fórmula 2
Felipe Drugovich Roncato já está consolidado no automobilismo. É o brasileiro mais bem colocado na escada rumo à Fórmula 1. Em 2022, consagrou-se campeão da Fórmula 2 da FIA – principal categoria de base do automobilismo mundial – e, desde então, é piloto de testes e reserva da equipe Aston Martin na Fórmula 1.
Sua trajetória, no entanto, começou como a de tantos outros: no kart. Depois de vencer as principais competições do circuito, migrou para uma bem-sucedida sequência de títulos em fórmula na Europa.
A ascensão foi marcada por títulos relevantes, como a MRF Challenge (Índia e Emirados Árabes Unidos), a Eurofórmula Open e o Campeonato Espanhol de Fórmula 3, todos fundamentais para chegar à Fórmula 2.
Em 2022, com um desempenho técnico quase perfeito, Felipe venceu cinco provas e garantiu o título da F2 com uma rodada de antecedência, sendo o primeiro brasileiro a conquistar a categoria desde sua reformulação.
O feito chamou a atenção do paddock da F1, como é conhecido os boxes onde ficam as equipes, e passou a integrar a Aston Martin. Agora, Felipe concilia corridas na Fórmula E com a participação em testes, sessões de treinos livres e no desenvolvimento do carro junto aos engenheiros da equipe da F1.
Apesar do título expressivo, Drugovich ainda não assumiu uma vaga como titular na Fórmula 1. Mesmo assim, sua permanência como reserva em uma equipe de ponta, aliada à experiência acumulada em testes e simuladores, mantém viva a expectativa de que ele possa estrear oficialmente nos próximos anos.
“A principal barreira tem sido o cenário político e financeiro da categoria, que prioriza pilotos com patrocínio pessoal”, explica Rubens Gatti, presidente da Federação Paranaense de Automobilismo.
Felipe se destaca pela consistência, inteligência tática e controle emocional – características essenciais em corridas de alta pressão. A vitória na F2, em um grid historicamente competitivo, é prova disso.
Entre os nomes que passaram pela categoria antes de estrear na Fórmula 1 estão Charles Leclerc, George Russell e Lewis Hamilton, todos campeões na base e titulares nas principais escuderias do mundo.
Ao lado do Gabriel Bortoleto, paulistano de 20 anos, campeão da F2 em 2024 e atual piloto da Sauber na F1, Drugovich simboliza uma nova geração brasileira que volta a se aproximar da elite do automobilismo mundial. O paranaense está em posição estratégica: próximo da Fórmula 1 e com credenciais suficientes para agarrar a oportunidade quando ela surgir.