Fernando Diniz talvez seja um dos personagens que mais polariza as conversas sobre futebol atualmente. HĂ¡ quem goste e defenda o estilo do treinador e hĂ¡ quem deteste e acredita que ele nĂ£o pode comandar um time de primeira linha no Brasil. Hoje, torcedores do Cruzeiro estĂ£o no segundo grupo.

A demissĂ£o do tĂ©cnico Ă© mais um capĂ­tulo em baixa no recorte recente da sua carreira. Em pouco mais de um ano, Diniz foi de campeĂ£o da AmĂ©rica a brigar para nĂ£o cair pelo Fluminense, atĂ© chegar jĂ¡ em setembro em Belo Horizonte, e atĂ© agora sem convencer de que faria a equipe mineira melhor do que estĂ¡.

A reportagem do EstadĂ£o buscou comentaristas esportivos, ex-jogadores e tĂ©cnicos para buscar respostas a uma pergunta: Fernando Diniz perdeu o prestĂ­gio no futebol? Como costuma ser quando o assunto Ă© Diniz, a resposta nĂ£o Ă© unĂ¢nime.

“NĂ£o acredito que o Diniz tenha perdido o prestĂ­gio, pelo contrĂ¡rio, pois mesmo saindo do Fluminense com o time na zona de rebaixamento, foi procurado por diversos clubes e rapidamente foi para o Cruzeiro”, argumenta a comentarista da TV Globo, Ana ThaĂ­s Matos, ao EstadĂ£o.

Cleber Machado, narrador da Record, vai alĂ©m. Para ele, a demissĂ£o de Diniz do Fluminense jĂ¡ poderia ser questionada. “Foi algo que aconteceu com o Fluminense, e com o Diniz, por consequĂªncia. Eu nĂ£o tiraria o Diniz e veria se ele nĂ£o retomaria o que conquistou. O trabalho foi inquestionĂ¡vel… campeĂ£o Carioca, da Libertadores. O que aconteceu? Teve jogador machucado? Jogador perdeu rendimento?”, questiona.

“Quando o time ganha, os jogadores sĂ£o Ă³timos. Quando o time perde, o tĂ©cnico Ă© ruim. SerĂ¡ que daria certo (com mais tempo)? Em dois meses mais ou menos e um ruim, nĂ£o deu certo. Diniz nĂ£o Ă© teimoso, tem bom gosto de futebol e estilo. Talvez ele precise, como muita gente fala, ter uma versatilidade maior no jeito de jogar. Achar o famoso Plano B”, sugere o narrador.

Ana ThaĂ­s dĂ¡ outra sugestĂ£o. “Acredito, de uma forma bem pessoal, que seria o momento para o Diniz parar um pouco e dar uma refrescada nas ideias, pausar um pouco essa sequĂªncia de emendar um trabalho no outro, porque o 2024 foi muito intenso, passando ainda pela seleĂ§Ă£o no ano anterior e como ele foi desligado…”, reflete.

Isso poderia ter sido antecipado, na opiniĂ£o de Leonardo Bertozzi, comentarista da ESPN, que tambĂ©m falou ao EstadĂ£o. “Acho que ele podia ter se preservado e jĂ¡ começado o ano pensando em outro projeto. No Fluminense, as coisas desandaram rĂ¡pido demais. Eu acho que ele precisa escolher melhor assim o prĂ³ximo passo, nĂ£o pegar time no meio de temporada, ou em situaĂ§Ă£o delicada”, pondera.

“É um trabalho que precisa de tempo, nĂ£o adianta, Ă© modelo de jogo que precisa de muita repetiĂ§Ă£o, muita, treino”, conclui.

GalvĂ£o Bueno publicou sua opiniĂ£o. “É um tĂ©cnico muito bem preparado, tem Ă³timas ideias e conceitos sobre futebol, mas vai sempre precisar de tempo para fazer um time ser vencedor! E o Cruzeiro de hoje Ă© praticamente um novo time”, escreveu.

A saĂ­da de Diniz do Cruzeiro tem ares de um tĂ©rmino que era construĂ­do desde o fim da temporada passada. ApĂ³s a Ăºltima rodada do BrasileirĂ£o, uma vitĂ³ria por 1 a 0 contra o Juventude, a demissĂ£o chegou a ser noticiada como certa, o que gerou um desabafo do treinador na entrevista coletiva pĂ³s-jogo.

“Vim de coraĂ§Ă£o aberto para fazer um trabalho justo e honesto. E isso praticamente os jogadores, vai perguntar se o cara nĂ£o melhorou. Pergunta se o Marlon nĂ£o melhorou, se o William agora nĂ£o terminou bem a competiĂ§Ă£o. Se o Matheus Pereira nĂ£o correu mais, nĂ£o se dedicou mais, se o CĂ¡ssio nĂ£o aprendeu jogar melhor com os pĂ©s. Me trouxeram para quĂª? É isso, ou ganha, ou sai em dois meses? Para que isso aĂ­?”, desabafou na Ă©poca.

Diniz havia assumido o Cruzeiro com a missĂ£o de garantir o clube na Libertadores deste ano. Ao chegar, classificou a equipe Ă  semifinal da Sul-Americana e, depois, para a final, perdida para o Racing. No BrasileirĂ£o, foram seguidas rodadas sem confirmar a classificaĂ§Ă£o. Na derradeira, dependia tambĂ©m de uma derrota do Bahia, que venceu. O nono lugar sequer garantia vaga nas fases prĂ©vias.

O resultado parecia inusitado, jĂ¡ que o tĂ©cnico vinha de um tĂ­tulo de Libertadores e atĂ© mesmo comandou a seleĂ§Ă£o brasileira, de julho de 2023 a janeiro de 2024. A equipe brasileira, aliĂ¡s, nĂ£o chegou ao nĂ­vel esperado com a troca no comando. Primeiro, a CBF garantiu que teria Carlo Ancelotti. Depois, Dorival JĂºnior foi escolhido.

O treinador permaneceu, mas contestado pela torcida. O Cruzeiro foi agressivo no mercado, com contratações midiĂ¡ticas, como a de Gabigol. Nenhum nome, contudo, era de um jogador que potencializasse a ideia de um futebol de posse de bola, caracterĂ­stico dos times comandados por Diniz.

“A formaĂ§Ă£o do elenco e a forma de pensar futebol de quem comanda o Cruzeiro desde a chegada do Diniz nĂ£o tinha absolutamente nada a ver com o estilo de trabalho dele. Faltou visĂ£o de entender para onde estava indo (da parte do treinador), mas principalmente o Cruzeiro que mirou num treinador que nĂ£o tem absolutamente nada em comum com o elenco do ano passado e o atual”, avalia a comentarista Ana ThaĂ­s Matos.

O fato Ă© que atĂ© mesmo Diniz reconhecia a fraqueza da equipe no começo de Campeonato Mineiro. ApĂ³s o empate com o Betim, seu Ăºltimo jogo, o tĂ©cnico lamentou e apontou para um limite com a torcida.

“Contra o AtlĂ©tico-MG (na FC Series) a gente criou chances, hoje a gente criou chances no segundo tempo. É pouco ainda. A gente tem que criar mais, ser mais incisivo. Tudo tem um limite e a torcida estĂ¡ no limite dela, entĂ£o a gente tem que entregar a vitĂ³ria o quanto antes”, afirmou Diniz.

Ganhar era a Ăºnica saĂ­da, mas nĂ£o houve mais tempo. Quando deixou o Fluminense, em junho, nĂ£o ganhava fazia cinco jogos. O entendimento foi de que ele nĂ£o poderia mais recuperar o nĂ­vel do time que havia sido campeĂ£o da Libertadores hĂ¡ menos de um ano.

A chegada de Mano Menezes nĂ£o resolveu os problemas da equipe carioca. O livramento da queda veio na Ăºltima rodada, mas ainda sĂ£o sintomĂ¡ticos, os problemas, originados por um calendĂ¡rio apertado, segundo o zagueiro Thiago Silva.

“A gente nĂ£o pode ter duas semanas de preparaĂ§Ă£o e jogar Ă s 16h contra eles, que estĂ£o treinando hĂ¡ trĂªs meses. Eu vim de um treino de 40 minutos. NĂ£o Ă© desculpa, a torcida pagou o ingresso e tem razĂ£o de vaiar. Sem condiĂ§Ă£o fĂ­sica, fica praticamente impossĂ­vel a gente fazer algo positivo. Eu entendo que os torcedores vejam como um jogo muito importante, mas a gente encara o Carioca como prĂ©-temporada. SerĂ¡ que para mim vale a pena? Com a minha famĂ­lia em Londres? NĂ£o sei”, desabafou.

JĂ¡ Diniz agora analisa o que vale a pena para si. O futuro do treinador nĂ£o Ă© garantido pelo tĂ­tulo da Libertadores em 2023. Como o tĂ©cnico mesmo disse, ele Ă© mais do que isso. Logo poderĂ¡ ter mais uma chance de tentar mostrar.