Se você viveu a juventude em Curitiba nos anos 1990, é quase certo que suas melhores noites passaram por um galpão avermelhado na Rua Piquiri. O Aeroanta, casa de shows lendária que recebeu de Tim Maia a Little Richard, foi mais do que um palco: tornou-se um símbolo de liberdade sonora e cultural numa cidade cuja noite ainda dava os primeiros passos. À frente desse marco estava Henrique Braga, então um jovem empreendedor com tino artístico e nenhuma pressa para enriquecer.
Hoje, Henrique se destaca no mapa urbano com a padaria Nhac Nhoc, localizada no coração da cidade, no Batel. E engana-se quem pensa que ele trocou os amplificadores pelo forno por acaso. “Tudo o que eu faço gira em torno de criar espaços onde eu gostaria de estar”, resume ele, repetindo a máxima que o guiou no Aeroanta. A padaria oferece iguarias inusitadas, como coxinha de costela, além de pães e quitutes fresco, e respira música: uma vez por mês há noites de jazz, e apresentações ao vivo acontecem com frequência crescente, reforçando a proposta de misturar gente, arte e comida boa.
Mas para entender a proposta atual, é preciso olhar para o passado. Antes de colocar o Aeroanta no mapa noturno da capital paranaense, Braga já aquecia motores com a festa Villa Rock, uma espécie de embrião do que viria a ser a casa mais emblemática da década. Em sociedade com Sérgio Apter, trouxe a franquia curitibana do Aeroanta paulistano. Sem grandes dificuldades, a casa logo se destacou como reduto de pluralidade musical: passaram por lá Paralamas do Sucesso, Skank, Nação Zumbi, Cássia Eller, Buddy Guy e até a americana Steppenwolf, entre outros ícones da música.
Mais do que uma simples casa de shows, o Aeroanta era um manifesto contra o marasmo. Sua proposta desburocratizada — sem fichas, filas ou imposições de consumo — ajudou a redefinir a vida noturna curitibana. De quebra, contribuiu para mudanças na rígida lei do silêncio da cidade.
Assista a entrevista completa no YouTube do Estúdio Bem Paraná:
O fim do Aeroanta, em 1997, causado por uma disputa sobre o imóvel, encerrou uma era vibrante da cultura curitibana, mas não apagou o legado da casa que marcou uma geração. Em entrevista ao podcast Retrato Gravado, Henrique relembra com nostalgia as noites de shows inesquecíveis, os encontros improváveis e o espírito comunitário que dominava o espaço. “O Aeroanta era um lugar em que todos queriam estar. Você podia jantar, dançar, curtir bons shows…”, conta.
Hoje, à frente do Nhac Nhoc, Henrique mantém vivo o amor pela boa música, de outra forma: com jazz e apresentações ao vivo que aquecem o ambiente e atraem públicos diversos. Embora não descarte a ideia de um “novo Aeroanta”, prefere saborear os projetos atuais e viver o presente. Ele mora em Curitiba, cidade onde nasceu, numa casa de vidro que construiu em apenas 35 dias.
Colocar a mão na massa — seja no concreto, na farinha ou na criação cultural — sempre foi uma de suas maiores habilidades, mesmo com formação em Economia. Henrique Braga é um desses curitibanos que fez história e continua escrevendo novos capítulos na vida cultural da cidade, com a mesma autenticidade e espírito coletivo de sempre.
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FICHA TÉCNICA
Coordenação: Josianne Ritz
Apresentação e produção: Katia Michelle
Operação: Evandro Soares
Edição: Luísa Mainardes