José Francisco Borges ou J.Borges, como prefere ser chamado, é considerado o maior gravador popular em atividade no Brasil. Admirado pelo escritor e amigo de longa data Ariano Suassuna, J.Borges traduz em versos e traços o imaginário nordestino, dos costumes às lendas fantásticas. O Museu Oscar Niemeyer abre a exposição “A Arte de J.Borges do Cordel à Xilogravura”.

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Em exibição há mais de 40 cordéis e cerca de 100 xilogravuras e matrizes originais. A exposição, ambientada na história pessoal do artista, na pacata Bezerros, cidade do agreste de Pernambuco, situa a produção de Borges no contexto do cordel nordestino e, principalmente, na arte brasileira. Foi pelo resultado obtido com a publicação de seu primeiro cordel “O Encontro de Dois Vaqueiros no Sertão de Petrolina” que ele começou a produzir xilogravuras.

J.Borges lembra que, se os dez meses de escola que freqüentou não o ensinaram “a conta de dividir”, os folhetos de cordel fortaleceram o “gosto pela palavra escrita”. O pernambucano diz que o primeiro cordel, publicado em 1964, lhe rendeu “cinco milheiros de muita sorte”, em apenas dois meses. Animado com o resultado, escreveu o segundo chamado “O Verdadeiro Aviso de Frei Damião Sobre os Castigos que Vêm”, que o conduziu pela primeira vez ao entalhe. Em uma colher de madeira de jenipapo talhou a fachada de uma igreja.  
   
Atraídos pela riqueza histórica dessa obra, a partir de 1970, artistas plásticos, intelectuais e marchands passaram a fazer encomendas das xilogravuras, fortalecendo progressivamente a obra. Capas de discos, livros e outras publicações, premiações de instituições nacionais e internacionais revelaram a qualidade da produção artesanal do artista popular. É o contexto que reflete a mostra.

Atualmente, instalado em um novo ateliê, construído ao lado da casa onde vive em Bezerros –o antigo deixou para os filhos que seguem o ofício –, J.Borges está com a agenda cheia de trabalho neste ano. Além de abrir a mostra em Curitiba, já apresentada em Brasília, o artista se prepara para levar a exposição aos Estados Unidos. Esta será a sexta vez que os trabalhos dele serão exibidos aos americanos.

Ambientação
     
A exposição é dividida em diversos segmentos seqüenciais. Painéis com cordéis, placas originais de xilogravuras e uma prensa contam parte da história do cordel e das técnicas utilizadas para impressão e a confecção de xilogravuras. Outro núcleo contextualiza a própria história de J.Borges com a família, cujos integrantes seguem o ofício do artista. A família aparece representada em fotografias e através das próprias obras que realizam.

Para evocar a atmosfera de Bezerros, situada às margens da BR-232, barracas, ambientadas por uma trilha sonora característica e iluminadas com fios de luz, reproduzem o ambiente das feiras das praças das pequenas cidades da região. Nas barracas, alguns cordéis estão pendurados em varais para ilustrar a forma como J.Borges exibe a produção para vendê-la. A ambientação se completa com objetos típicos como os mamulengos, popularmente usados em teatro de bonecos e com os quais brincam as crianças; e as máscaras usadas no Carnaval de Bezerros, papangus; além de sacos e cestas com ervas medicinais, fumo-de-corda e outros ingredientes vendidos nas feiras do Nordeste.  

Em um ambiente subseqüente, um vídeo exibe a vida, a obra e a relação de Borges com a cidade em que vive. Assinado por Vincent Carelli, o documentário apresenta diversas entrevistas com o artista sobre os temas abordados. Somente após todo esse trajeto, são apresentadas as xilogravuras selecionadas para a mostra. Nesse último núcleo, destacam-se os três livros inéditos com xilogravuras que ilustram as dezenas de profissões existentes, muitas delas características daquela região. Além da parede com as matrizes originais, de pequeno, médio e grande porte.

Todas essas peculiaridades foram concebidas pelo curador José Octavio Penteado com o objetivo de demonstrar a força da cultura popular brasileira que, “mesmo em condições adversas, produz obras de inegável valor”. A proposta do curador é a de possibilitar o desenvolvimento de um conhecimento mais amplo dos temas recorrentes nos cordéis, das figuras míticas do imaginário nordestino e, principalmente, do meio e do “talento do artista forjado na fé e na raça”.