O caminho afetivo impregnado na obra de Tarsila do Amaral (1886-1973) é o foco central desta exposição. A partir da descoberta do Diário de Viagem –da década de 1920, com desenhos e impressões das viagens que a artista fez pelo Brasil e pelo exterior – o curador Antonio Carlos Abdalla traçou o percurso da mostra e definiu a seleção a ser apresentada em Curitiba. A obra de maior destaque é Antropofagia, produzida em 1929. Procissão, de 1954, a segunda versão de A Negra, iniciada em 1940, e o Estudo para A Negra, em nanquim sobre papel, são outras importantes surpresas da mostra.
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“Com sete metros de comprimento, Procissão nunca foi exposta fora de São Paulo porque é muito grande. A tela só foi exibida no 4o. Centenário de São Paulo, em 1954. E, acredito que até os anos 70 a segunda versão de A Negra foi trabalhada e retrabalhada, permanecendo inacabada. O que sugere a continuidade da leitura do trabalho da artista e a abertura para inúmeras possibilidades de interpretação da obra de Tarsila, que permanece aberta”, ressalta o curador. Entre as obras há também as duas gravuras em metal de Abapuru e Antropofagia, ambas sem data, mas que, segundo Abdalla, seriam posteriores às duas famosas pinturas de Tarsila. São 57 trabalhos em exibição, entre desenhos, pinturas e gravuras em metal provenientes de acervos de museus de São Paulo e Bahia e de coleções particulares de São Paulo e Rio.
Emblemática
Tarsila é uma figura emblemática para a compreensão do Modernismo no Brasil e de tudo o que se seguiu a ele. Formando o chamado “Grupo dos 5”, ao lado de Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Anita Malfatti e Menotti del Picchia, a artista tem seu nome registrado na história da arte brasileira como a vanguardista. A partir do final dos anos 1920, envolvendo-se de forma direta nos movimentos Pau-Brasil e Antropofágico, “ajuda a dar um contorno único e especial à cena cultural brasileira”, afirma o curador.
Abdalla diz que esta é uma “ocasião rara” para ver obras de Tarsila em uma exposição individual, de conceito biográfico-documental, com “especial atenção a um único documento: o diário de viagem, que traça o percurso afetivo da vida da artista”. Além do acervo da família, a mostra reúne pinturas e desenhos vindos de importantes coleções, como Nemirovsky, Rodrigo Jacques Perroy, Roberto Marinho, Paulo Kuczynski, Pinacoteca de São Paulo, e dos museus de Arte Contemporânea e de Arte Moderna de São Paulo, entre outros. O curador chama atenção para o recorte onírico que “desde sempre esteve presente na produção de Tarsila”.
No segmento biográfico surgem os retratos de Mário de Andrade, Blaise Cendrars, Luís Martins e Lasar Segall, companheiros de formação e atuação, e da neta Beatriz do irmão Milton, seguidos de obras da fase antropofágica. A vida urbana, a presença da máquina e o forte contraste social, o olhar místico e a fuga para a natureza, com o surgimento do onírico, completam os temas abordados. “Esta exposição foi bastante ampliada em relação à primeira (Pinacoteca) e, nesta nova leitura, não foram considerados os períodos –Pau-Brasil, Antropofágico e Social – habitualmente identificados na obra de Tarsila. O enfoque dado, em primeiro lugar, foi intimista; depois, temático e, quando possível, cronológico. Há um proposital e aparente caos, planejado para que o visitante possa sentir-se mais próximo da vida da artista e admire as obras individualmente, livres de classificações mais rígidas”, conclui Antonio Carlos Abdalla.