A pobreza, no Brasil atual, é urgente mas não tem o matiz da de outros tempos, muito menos da que inspirou Victor Hugo a escrever o romance Os Miseráveis, quando a França atravessava a segunda metade do século 19. Nossos pobres, se precisarem roubar para matar a fome, não correm riscos de terminar como Jean Valjean que, por esse motivo, foi preso e comeu o pão que o diabo amassou.

Por anos discutimos quem é pobre e quantos eles são no país. Esses dados acabam de ser apresentados. São as pessoas que não têm renda nenhuma ou sobrevivem com renda familiar mensal per capita de até R$ 70. Existem pelo menos 16,2 milhões nessa condição, representando 8,5% dos 190,8 milhões de brasileiros: 11,4 milhões têm rendimento médio entre R$ 1 e R$ 70; 70,8% são negros e pardos e 50,9% têm até 19 anos; 50,5% são homens e 49,5%, mulheres; a imensa maioria vive no Nordeste (9,6 milhões), 2,7 milhões no Sudeste, 2,7 milhões no Norte, 715 mil no Sul e 557 mil no Centro-Oeste; 53,3% estão nas cidades e 46,7% no campo. É o perfil.

Abaixo desses 11,4 milhões, há os extremamente miseráveis, cerca de 4,8 milhões, gente sem nenhuma renda. Se a renda do primeiro grupo for aumentada de R$ 70 para até R$ 138, o contingente sobe de 16,2 milhões para quase 24 milhões. Mas critérios são critérios, esses oito milhões estão fora da linha da pobreza. O parâmetro é do Banco Mundial, que define como miserável quem ganha US$ 1,25 por dia, mais ou menos R$ 60 mensais.

E os números só são esses porque a pobreza no país, segundo estudo da Fundação Getúlio Vargas, com base nas pesquisas mais recentes do IBGE, diminuiu 67%, nos últimos 16 anos. Os governos Fernando Henrique Cardoso e Lula desenvolveram ações incisivas para minimizá-la.

A diferença entre os miseráveis de hoje e os de ontem talvez seja que os primeiros são mais amparados. O Bolsa Família é um exemplo. A principal meta do governo Dilma é, se não zerar, minimizar ao máximo a pobreza, estendendo o auxílio àqueles que nada têm.
Há muito sonhamos com isso. Como poderíamos dormir tranqüilos vendo pessoas passando necessidade e como isso é possível quando, somente no ano passado, produzimos riquezas da ordem de R$ 3,675 trilhões?

A preocupação é que as políticas adotadas não estejam indo às causas da pobreza. Voltemos a Victor Hugo, que fez seu personagem Jean Valjean dar a volta por cima, se tornar um empreendendor de sucesso. Ele acreditava no esforço pessoal e no trabalho como capazes de transformar vidas, com reflexos positivos para toda a sociedade; e via a intervenção do Estado com desconfianças.

O governo Dilma já adiantou que não dá a questão como resolvida, a partir da assistência. Seria muita cretinice achar que uma pessoa pode viver com R$ 70 por mês. Está ciente de que o fundamental é romper o ciclo da miséria. Para isso, só existe um caminho: escola, estudo, qualificação e trabalho.

Além de minimizar a pobreza material, a educação resolve também a pior de todas as misérias, a mental-espiritual.

Paulo Caetano é contador, empresário da contabilidade e presidente do CRCPR; e-mail [email protected]