STF adia decisão sobre descriminalização do porte de drogas

Nesta quinta-feira, análise será retomada com a leitura do voto do relator do processo, o ministro Gilmar Mendes

Redação Bem Paraná

O Supremo Tribunal Federal (STF) interrompeu nesta quarta-feira (19 de agosto) o julgamento que pode descriminalizar o porte de drogas para uso pessoal. Durante a sessão de hoje, subiram à tribuna do Supremo a defesa e a acusação no processo que levou à condenação de um mecânico que assumiu ser dono de 3 gramas de maconha, episódio que levou a Suprema Corte a discutir a possibilidade de legalizar o porte de drogas no país. Nesta quinta-feira (20 de agosto), a análise será retomada com a leitura do voto do relator do processo, ministro Gilmar Mendes. Ele será o primeiro dos 11 ministros da Corte a votar.

Além da defesa e da acusação, também falaram hoje advogados de entidades que não são parte no processo, mas que se apresentaram como “amicus curiae” (amigos da Corte), com interesse em opinar sobre o assunto. Seis entidades se manifestaram a favor da descriminalização, enquanto outras cinco se posicionaram contra, divergindo na maioria das vezes sobre as consequências da liberação do porte de drogas, principalmente no que diz respeito à diminuição ou aumento do consumo.

O primeiro falar na sessão foi defensor público de São Paulo, Rafael Muneratti, que atua em nome de Francisco Benedito de Souza, condenado em 2009 a dois anos de prestação de serviços à comunidade por assumir posse de droga encontrada na cadeia onde estava preso. O defensor argumentou que o uso de drogas é praticamente inerente à natureza humana e que a punição penal não é a melhor maneira de tratar a questão, enumerando uma série de medidas educativas e de saúde que seriam mais adequadas para tratar o usuário.

Na sequência, foi a vez do procurador-geral de Justiça do estado, Márcio Fernando Elias Rosa, representando o Ministério Público de São Paulo, se manifestar. Ele defendeu a condenação de Souza, afirmando que a atual legislação, de 2006, não prevê a prisão do usuário, mas somente penas alternativas, como prestação de serviços à comunidade. Ele também alegou que a lei visa proteger a saúde do próprio usuário e da população, refreando o tráfico de drogas.

Consumir droga sempre causa danos. Se ilícita então, o dano pode ser irreversível, afirmou, sustentando ainda que a droga alimenta a violência, modifica comportamentos, financia organizações criminosas, induz a prática de crimes contra o patrimônio público e contra a vida, a dependência desnatura o homem e compromete a sua dignidade.

O representante do organização não governamental (ONG) Viva Rio, Pierpaolo Bottini, disse que direito penal não alcança o cidadão que portar drogas. O advogado afirmou que as penas previstas na esfera criminal só podem ser aplicadas quando há lesão ao outro, mas não quando se trata de uso particular de entorpecentes. Para Bottini, é errado afirmar que a descriminalização do porte vai favorecer o tráfico. “O usuário, na maior parte das vezes, é uma vítima do seu vício. Ele é uma vítima do traficante. Sustentar a tese significa sustentar a criminalização da vítima para afetar seu algoz, o que não faz sentido da política criminal.”, argumentou.

 

A Associação Amor Exigente, que atua no tratamento de dependentes químicos e no auxílio aos familiares de usuários, disse que a descriminalização vai aumentar o consumo e não haverá condições para recuperá-los. Segundo o advogado Cid Vieira, o uso de drogas não pode ser considerado somente como questão pessoal, porque afeta a sociedade e as famílias. “Nós não temos condições de dar tratamento aos nossos dependentes com uma capenga saúde pública brasileira. Quem é que vai atender os dependentes, passando a falsa impressão às crianças de que a droga não faz mal?”, questionou.

 

A Associação dos Delegados de Polícia do Brasil sustentou que a descriminalização do porte trará para sociedade o aumento do consumo de entorpecentes. O advogado David Azevedo, representante da Associação Brasileira de Estudos do Álcool, defendeu a manutenção da criminalização por entender que a norma não viola o direito à intimidade. “O estado pode intervir? Óbvio que pode. Não só pode, deve, quando se perde a autonomia privada”, disse Azevedo.