SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Quando lançou “The Walking Dead” em 2003, depois de só três anos se arriscando no mundo das histórias em quadrinhos, o americano Robert Kirkman não poderia imaginar que seria em pouco tempo um fenômeno na televisão mundial.


Agora, passadas nove temporadas do seriado de zumbis em várias plataformas, obra na qual Kirkman é produtor-executivo, não deixa de ser divertido constatar que sua mais recente aposta em HQ venha impregnada de DNA televisivo. “Oblivion Song”, além de um gibi muito bom, é praticamente um storyboard para uma nova série de ficção científica.


Na primeira coletânea publicada agora no Brasil pela Intrínseca, “Oblivion Song – Volume Um: Canção do Silêncio”, as páginas são viradas com a fluidez narrativa de imagens em movimento.


O desenho do italiano Lorenzo De Felici exibe aproximações intercaladas com imagens amplas, imprimindo ritmo ágil à narrativa. E ele tem uma ajuda muito grande de Annalisa Leoni, que aplica as cores. Há uma divisão de páginas entre tons azulados e amarelados, para indicar em qual mundo os personagens estão.


Sim, há dois mundos na história criada por Kirkman. Um deles é a Terra, alguns anos no futuro. A ação transcorre uma década após um estranho fenômeno. Sem explicação, uma parte da Filadélfia sumiu do mapa, fazendo desaparecer 300 mil pessoas.


Pesquisas científicas sobre alterações em campos de energia levaram à descoberta de um mundo paralelo, Oblivion, no qual os humanos retirados da Terra tentam sobreviver num local de inóspitos desertos, cidades em ruínas e criaturas monstruosas gigantescas dispostas a devorar todos eles.


Seguindo uma tendência forte na HQ atual, os monstros são um tanto disformes e realmente muito grandes.


Não dá para entender direito o que é cabeça, boca, membros. Uma “bagunça” aterrorizante. O desenho de De Felici, aliás, exige muita observação dos leitores até que seja possível entender toda a ação.


Como em “The Walking Dead”, os heróis são relutantes, agem por necessidade. Nenhum é um combatente excepcional, apenas gente acuada em uma situação extrema.


Esses acontecimentos são explicados ao leitor aos poucos, enquanto são mostrados os esforços solitários de Nathan Cole, o último homem a dedicar sua vida a viagens constantes ao mundo paralelo para tentar achar sobreviventes.


Depois de vários resgates conseguidos com uma tecnologia de viagem dimensional, ficou cada vez mais raro encontrar alguém vivo em Oblivion, e o governo decidiu suspender as missões. Cole segue obstinado nas viagens, porque tem esperança de encontrar o irmão, Ed, do qual não teve uma única notícia desde o fenômeno.


“Oblivion Song” vai além da simples narrativa de ação. O relacionamento de Cole com as pessoas que ele vai conhecendo em Oblivion insere uma discussão de pertencimento na obra. Depois de anos lutando num ambiente hostil, muitos deles não querem retornar à Terra. Alguns acreditam que não se adaptariam novamente à sociedade atual, enquanto outros encontram em seu grupo fugitivo um propósito mais atraente para suas vidas.


Também entram no caldo temático da HQ questionamentos sobre ética científica, combate a governos autoritários e questões de diversidade. Os personagens incluem afro-americanos, asiáticos e árabes, e a trama esbarra em conflitos de classes.


“Oblivion Song – Volume Um” reúne os seis primeiros gibis da série, lançados mensalmente nos Estados Unidos desde março do ano passado, pela Image Comics. A segunda coletânea, com os seis números seguintes, sai agora no mercado americano.


Parece ser questão de tempo descobrir se Nathan Cole chegará à TV com o mesmo sucesso de Rick Grimes, herói de “The Walking Dead”.


LIVRO


Oblivion Song – Volume Um: Canção do Silêncio


Avaliação: muito bom


Autores: Robertt Kirkman, Lorenzo De Felici. Editora Intrínseca. R$ 49,90 (152 págs.)