JULIANA COISSI CURITIBA, PR (FOLHAPRESS) – Bandeiras tremulam na entrada do acampamento. A barraca de lona e madeira divide espaço com outras menores. Os acampados se revezam nas tarefas de cozinhar e deixar organizado o ambiente. E a política se faz onipresente nas mensagens em cartazes, em músicas na caixa de som e nas reuniões do grupo ao fim da tarde. Não se trata de um acampamento de grupos sem terra, mas sim de ativistas de Curitiba que resolveram acampar numa praça na cidade em apoio ao impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Lá estão bandeiras do Brasil, camisetas pretas com o rosto do juiz Sergio Moro e pessoas com roupa camuflada como as do Exército no chamado Acampamento Justiça. O nome é uma referência ao endereço escolhido e o acampamento foi montado há 17 dias na praça que fica em frente à Justiça Federal de Curitiba, de onde Moro despacha os processos da Operação Lava Jato em primeira instância.

A operação que apura um esquema de corrupção na Petrobras é o motivo comum de pessoas de idades e profissões distintas, que não se conheciam, decidirem se juntar em um acampamento. Entre seus integrantes, há ainda quem fala em intervenção militar -no local há cartazes SOS FFAA, em referência às Forças Armadas. Outros lutam apenas pela renúncia de Dilma.

VAQUINHA E DOAÇÕES

O cabeleireiro Marcus Ribeiro, 37, foi o primeiro a trazer sua barraca. Ele é um “veterano” de acampamentos contra o governo Dilma, tendo participado deles em Brasília e São Paulo no ano passado. “A direita está toda separada em grupos. Nossa ideia era reunir todos os grupos, no mesmo acampamento.” Até esta quinta-feira (14), quando a reportagem esteve no local, havia quatro barracas de camping, dessas em formato de iglu, uma barraca maior de lona que serve como cozinha e uma tenda na entrada, para reunir o grupo.

Uma churrasqueira fica do lado de fora, além de dois banheiros químicos e um contêiner, alugados. Há uma TV pequena, cadeiras, mesas e um sofá velho. Tudo foi doado, fruto de vaquinha ou trazido das casas das pessoas. A venda de camisetas com o rosto de Moro, a R$ 40, e de bandeiras (de R$ 5 a R$ 10) serve para manter o acampamento. Um contêiner, alugado por R$ 200, guarda mantimentos, cafeteira, um fogareiro a gás, cornetas e bandeiras. É lá, pela noite, que são guardados itens de maior valor, como a caixa de som. Na tarde desta quinta, o som ambiente do acampamento era a voz que parecia ser de Tom Jobim, cantando “Águas de Março”. A letra, porém, era adaptada ao estilo anti-governo: “É pau, é pedra, é o PT no caminho”.

Da caixa de som, saía ainda paródia de marchinhas, como “Dilma eu quero mamar”, além do hino nacional e do hino à bandeira. A vizinhança tem participação indireta no acampamento. Uma padaria vizinha todos os dias leva pães ao grupo. Moradores de prédios entregam água e refrigerante. “Um dia, às 3h da manhã, chegou um vizinho aqui com uma cesta de pão de queijo”, conta Ribeiro. O banho é possível porque uma academia de ginástica permite o uso, com um preço subsidiado. Até o garapeiro da praça quis dar sua contribuição.

Henrique Mello, 50, que diz nunca ter votado no PT, resolveu ceder parte da energia elétrica que tem para mover o motor de sua barraca para que as pessoas à noite tenham iluminação e possam carregar celular ou ver TV. “É a maneira brasileira minha de contribuir”.

REVEZAMENTO

Não há um número certo de participantes. O empresário Anderson Oliveira, 32, um dos que organiza o acampamento, disse que entre 10 e 20 pessoas dormem no local todos os dias. Mas o grupo estima que 500 pessoas se revezam, passando horas do dia no local. São manifestantes como a ambientalista Marli Rossi, 46, que fez questão de abordar a reportagem para dizer, em tom de orgulho, que era ela a segurar um cartaz contra a senadora petista Gleisi Hoffmann, em um protesto na semana passada.

Rossi chega às 7h e muitas vezes só vai para casa à noite. Ela e a educadora infantil Elizeth Sgrance de Souza, 48, eram completas desconhecidas até se unirem nos protestos e, então, no acampamento, uma situação comum no grupo. Souza, quando volta de casa, por vezes traz uma macarronada já pronta. O almoço em geral é churrasco com macarrão ou arroz. Na churrasqueira desta quinta, havia pinhão assado, alimento típico no Paraná.

O acampamento deve inflar neste domingo (17), dia da votação do impeachment na Câmara dos Deputados. Às 10h um carro de som já começa a receber manifestantes, e um telão deve transmitir a votação. Do que precisa o acampamento até domingo? Oliveira responde: “De gente. Quem quiser, traga sua cadeira de praia, água e junte-se a nós”.