Dias desses, talvez inspirado pela atmosfera melancólica desses tempos de pandemia, lembrei-me da queda do Muro de Berlim (novembro de 1989) e do muito que foi escrito sobre o “Fim da História”, numa revisitação da teoria criada por Hegel, datada do já pré-histórico Século XIX.

Mais precisamente lembrei-me de Francis Fukuyama, ícone do neo-liberalismo americano e autor do livro “O fim da história e o último homem”, em que decretou o fim da evolução sociocultural humana a partir da vitória das democracias liberais ocidentais sobre o socialismo de matiz soviético.

O livro virou um “best-seller” e Fukuyama foi viver em Palo Alto, para lecionar na Universidade de Stanford, uma das mais prestigiadas do mundo, bem como para curtir a sua justa fortuna amealhada com as vendas estratosféricas da sua mais famosa obra literária.

Hoje, porém, fico imaginando FF diante dessa improvável crise econômica e social que desabou sobre o mundo. Uma crise provocada não pelo contra-ataque de ideias neo-socialistas implementadas por um governo esquerdopata, mas sim por um ser minúsculo, invisível a olho-nu, que colocou de joelho um sistema concebido para retroalimentar até mesmo de suas mazelas, como que em moto-contínuo.

Estaria Francis planejando escrever um outro “best-seller”? Dessa vez não mais sobre a queda de um muro, mas sim a respeito do surgimento de uma nova “Rota da Seda”, que reconectou a China com o Ocidente para nos inundar de produtos industrializados produzidos a um custo irreal para os padrões das democracias ocidentais, e de quebra nos infestar de seres microscópicos que, sabe-se lá a razão, sempre surgem do lado de lá da muralha?

Certamente que não. Francis Fukuyama é um intelectual respeitadíssimo, e não colocaria a credibilidade de uma vida a serviço dessa ideológica canastrona patrocinada por Donald Trump.

Todavia, como intelectual que de fato é Fukuyama não poderá deixar de reconhecer que em sua teoria sobre o “Fim da História” (1992) pensou em quase tudo, menos que o Homem, a despeito de todo o avanço tecnológico alcançado pela civilização, continua sendo uma poeira no Universo, que teve data para entrar em cena, e certamente terá para deixá-la, em que pese a nossa presunção capitalista burguesa de que tudo podemos.

Carlos Augusto Vieira da Costa


ESPAÇO LIVRE

A cassação da chapa Bolsonaro-Mourão para garantir o fair play na democracia

*Adriana Inomata e Estefânia Barboza

O TSE colocou em pauta os processos de pedido de cassação da chapa Bolsonaro-Mourão com o julgamento de duas, das oito Ações de Investigação Judicial Eleitoral (Aijes) as quais acusam Bolsonaro de se favorecer da invasão hacker em grupo virtual que reunia mais de 2,7 milhões de pessoas. O julgamento foi suspenso devido ao pedido de vistas do ministro Alexandre de Moraes. Os demais processos dizem respeito a acusações de abuso de poder econômico na instalação de outdoors, favorecimento de campanha pela Rede Record (já julgado improcedente e aguardando julgamento do recurso), e financiamento empresarial de disparos em massa de fake news no WhatsApp. Dentre eles, este último apresenta fortes indícios que sustentam a acusação e representa um jogo duro no processo democrático eleitoral.

A revolução tecnológica e o uso massivo das redes sociais têm impactado e alterado profundamente as relações privadas e públicas. O escândalo da Cambridge Analytica, que compreendeu o uso dados de 87 milhões de contas do Facebook e envolveu a campanha do presidente Donald Trump e do Brexit, demonstrou que as redes sociais e o uso de big data tornaram-se eficientes ferramentas para a cooptação de grandes massas e controle social. O disparo de mensagens em massa foi a principal estratégia de campanha eleitoral do então candidato à presidência Jair Bolsonaro. A Folha de S. Paulo, em reportagem publicada em outubro de 2019, revelou um esquema de contratação de agência de marketing espanhola por empresas brasileiras para a realização de disparos em massa via Whatsapp contra o PT, sendo que cada contrato chegava a R$ 12 milhões, que não foram contabilizados em contas oficiais de campanha. Com base nessas informações, quatro Ajifes foram propostas no TSE buscando anular a chapa.

A utilização da tática do disparo em massa de mensagens falsas em campanha eleitoral para manipular a opinião pública constitui-se meio ardil incompatível com a lisura e com as regras de um jogo eleitoral democrático e transparente. Em uma democracia, todos os candidatos devem ter iguais condições e oportunidades de realizar a campanha de maneira limpa, honesta e equilibrada.

A Constituição pune o abuso eleitoral, na sua forma mais grave, com cassação das candidaturas e inelegibilidade, com vistas a proteger normalidade e legitimidade das eleições. Conforme entendimento do TSE, mesmo que Bolsonaro e Mourão não tenham contribuído direta ou indiretamente para os disparos massivos das fake news, a chapa poderá ser cassada pelo fato de ser beneficiária da conduta configuradora de abuso de poder econômico, uma vez que a estratégia abusiva desequilibrou o pleito eleitoral.

Nesses julgamentos, o TSE tem um grande desafio, frente aos custos políticos que isso lhe impõe, de assumir o papel que a Constituição lhe incumbe como órgão que integra o Poder Judiciário brasileiro: de ser o guardião da democracia.

*Adriana Inomata, doutoranda em Direito da UFPR, é professora de Direito Constitucional da Escola de Direito e Ciências Sociais da Universidade Positivo. Estefânia Barboza é professora de Direito Constitucional da Uninter e UFPR.


Notícias falsas, grupos organizados e regulação

*Eduardo Faria Silva

**Ana Carolina Contin Kosiak

Os deputados federais Felipe Rigoni (PSB/ES) e Tabata Amaral (PDT/SP) apresentaram na Câmara de Deputados o Projeto de Lei nº 1.429/2020. A proposta traz um dos principais debates que o parlamento precisa realizar neste momento e que pode ser sintetizado na seguinte pergunta: coibir notícias falsas (fake news) disparadas por grupos organizados no ambiente digital, por meio de norma específica, é restringir a liberdade de expressão?

A resposta é direta: não, em hipótese alguma! A sua restrição não viola o campo das liberdades. Ao contrário, o projeto busca coibir justamente a falta de compromisso com a veracidade da informação e suas consequências. A notícia falsa em escala e velocidade digital é destrutiva. Silenciosamente, ela adultera, altera, frauda, forja, controla, domina, inventa dados para influenciar as pessoas nas suas tomadas de decisões. Portanto, o parlamento deve impedir a ação de grupos organizados que se mobilizam para difundir desinformações em escala que possa desestabilizar – em uma perspectiva mais ampla – os fundamentos do Estado Democrático de Direito e da República Federativa do Brasil.

As mensagens produzidas por esses grupos têm o ódio à política humanista, democrática e republicana como núcleo central. As elaborações partem dessa premissa para fragilizar o funcionamento das instituições, deslegitimar seus membros, atacar pessoas, refutar o conhecimento, negar dados científicos e questionar, em última análise, todos os valores civilizacionais construídos desde o iluminismo.

A técnica utilizada é sofisticada e pensada por profissionais qualificados quando se fala em desinformação difundida de forma estruturada e com recursos financeiros. As notícias falsas sob um tema específico são pensadas para atingir diferentes públicos e por distintos canais como Facebook, Youtube, Twitter, WhatsApp, navegando por narrativas que transitam – a depender do destinatário – entre o coloquial e o culto. Muitas vezes partem de um senso comum, alternando na narrativa fatos reais com mentiras.

Para se ter ideia da dimensão do problema das fake news, informações divulgadas pelas próprias empresas de tecnologia dão conta de que parte significativa das interações nas redes são feitas por perfis automatizados com humanos. O Twitter, em 2017, capturava diariamente cerca de 450 mil logins suspeitos na sua plataforma. O WhatsApp, em 2019, baniu perto de 2 milhões de perfis falsos por mês.
Literalmente, sem saber, milhares de pessoas interagem com robôs sobre temas políticos sensíveis e acabam criando uma convicção destrutiva, por exemplo, em relação às instituições democráticas, fantasiando um ambiente sem a necessidade de governo, parlamento e tribunais ou, em uma visão autoritária, que todos se subjuguem a um líder.

Tal compreensão vai de encontro com todas as evidências históricas que comprovam o contrário. A política e as instituições de matriz humanista, democrática e republicana são fundamentais para a construção de sociedades justas e livres. Nesse sentido, o projeto de lei apresentado permite que o congresso brasileiro reflita e busque uma regulação que garanta o campo das liberdades e assegure, ao mesmo tempo, estabilidade institucional na era digital.

*O autor é coordenador da Escola de Direito e Ciências Sociais e professor do Mestrado em Direito da Universidade Positivo. **Ana Carolina Contin Kosiak, mestranda em Direito na Universidade Positivo.


TÁ NA LEI

Lei n. 13.769, de 19 de dezembro de 2018

Art. 1º Esta Lei estabelece a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar da mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência e disciplina o regime de cumprimento de pena privativa de liberdade de condenadas na mesma situação.

Art. 2º O Capítulo IV do Título IX do Livro I do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal) , passa a vigorar acrescido dos seguintes arts. 318-A e 318-B:

Art. 318-A. A prisão preventiva imposta à mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência será substituída por prisão domiciliar, desde que:
I – não tenha cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa;
II – não tenha cometido o crime contra seu filho ou dependente.

Art. 318-B. A substituição de que tratam os arts. 318 e 318-A poderá ser efetuada sem prejuízo da aplicação concomitante das medidas alternativas previstas no art. 319 deste Código.

Esta Lei alterou o Código de Processo Penal para estabelecer a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar da mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência e para disciplinar o regime de cumprimento de pena privativa de liberdade de condenadas na mesma situação.


PAINEL JURÍDICO

Pós Covid-19
O Farracha de Castro Advogados lançou a cartilha Direito e o Mundo Pós-Covid-19. Com linguagem objetiva, o conteúdo traz as principais mudanças legislativas e práticas nas áreas de atuação do escritório. Os advogados da equipe e vão realizar uma transmissão ao vivo para tratar dos tópicos de destaque da cartilha e responder perguntas. É possível enviar perguntas pelo link: https://bit.ly/omundoeodireitoposcovid19 . A transmissão ao vivo será na quinta-feira, 02/07, às 18h, pela plataforma Zoom.

Perícia Judicial
No dia 09 de julho, às 14h30, o canal do youtube do Conselho Regional de Contabilidade do Paraná apresenta a mesa redonda “Perícia Judicial – a interpretação da sentença em sede de liquidação”, com as participações do Desembargador Fernando Antônio Prazeres, do Perito Antônio Fernando Azevedo e do advogado Arthur Mendes Lobo. As inscrições para participar são gratuitas pelo site http://bit.Iy/mesaredondacrcpr

Estabilidade
Funcionária grávida não pode ser demitida durante o contrato de experiência. O entendimento é da 7ª Turma do TST. Segundo a Turma, a estabilidade se aplica ao contrato por prazo determinado, pois não visa proteger apenas a mãe, mas também o bebê.

Honorários
Advogados públicos podem receber honorários sucumbenciais, mas os subsídios mensais não podem exceder ao teto constitucional. O entendimento é do STF.


DIREITO SUMULAR

SÚMULA 734 do STF – Não cabe reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que se alega tenha desrespeitado decisão do Supremo Tribunal Federal.


LIVRO DA SEMANA

O livro aborda os aspectos técnicos da exposição aos agentes físicos, químicos e biológicos para fins de caracterização do possível direito do benefício da aposentadoria especial, de acordo com normas pertinentes e as recentes alterações.