SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O encontro de verão do Fórum Econômico Mundial no hemisfério Norte levou um público recorde à China na terceira semana de setembro. Dos 2.500 representantes de mais de 100 nações presentes só nove eram brasileiros.

Enquanto os rápidos avanços da tecnologia e seus impactos eram discutidos no país asiático, o debate econômico da campanha presidencial no Brasil girava em torno de medidas para reduzir o rombo das contas públicas e simplificar o sistema tributário.

A atual pauta eleitoral explica, em grande medida, a baixa participação do país em encontros como o realizado na China. Com o estrangulamento fiscal do governo e a asfixia do setor privado, tem faltado espaço para a discussão, o desenho e a implementação de medidas que impulsionem a inovação e aumentem a eficiência da economia.

A demora em encarar questões como os limites dos gastos públicos, a baixa eficácia de algumas políticas de subsídio e os efeitos nocivos da burocracia excessiva ajudou a mergulhar o Brasil na severa recessão que se estendeu entre 2014 e 2016 e contribui para que a atual recuperação seja a mais lenta da nossa história.

Especialistas acreditam que a gravidade da situação forçou a maioria dos candidatos a reconhecer que reformas estruturais são essenciais para que o país volte a crescer. “No passado, a preocupação com esses assuntos era restrita a um pequeno grupo de economistas. Não reverberava”, diz Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos.

O perfil demográfico da população brasileira tem mudado rapidamente na esteira do aumento da longevidade e da desaceleração da natalidade.

A alta no número de aposentados em um contexto de ingresso mais lento de jovens no mercado de trabalho contribui para o déficit da seguridade social. A crise na oferta de empregos -com alta do desemprego e da informalidade- pioraram a situação.

Ainda que divirjam sobre a melhor forma de resolver o rombo galopante, a maior parte dos postulantes à presidência defende algum tipo de mudança. “A elite da classe política já entendeu que não há como não ter uma reforma da Previdência”, diz Zeina.

Outro sinal de amadurecimento do debate público, segundo especialistas, é o reconhecimento da necessidade de reforma do intrincado regime tributário brasileiro.

Embora todos os aspectos do ambiente de negócios do país apresentem sérios problemas, em decorrência da burocracia, o quesito em que o Brasil aparece pior colocado em um ranking do Banco Mundial é o tributário, na 184ª posição entre 190 países.

Mudanças para simplificar o regime brasileiro são defendidas por alguns economistas há muito tempo e já foram alvo de tentativas fracassadas de reforma. Mas a atual campanha deu pela primeira vez um tom de urgência ao tema. Há consenso em torno de temas como a criação de único tributo nacional sobre o valor agregado a cada etapa de produção ou comercialização.

Para o economista Mauro Boianovsky, o pano de fundo da convergência é a constatação de que o país precisa criar condições para crescer.

“O debate atual sobre os limites da capacidade de gasto público e as dificuldades para a retomada do investimento privado tem se dado no contexto do crescimento de longo prazo. Isso é positivo”, diz o pesquisador de história do pensamento econômico da Universidade de Brasília.

O problema, segundo economistas, é que ainda faltam clareza e realismo a muitas propostas, o que cria incertezas em relação à estabilidade e à retomada do crescimento.

“O que preocupa é que todos estão no palanque. Algumas propostas são só metas, outras são ingênuas. O diabo mora nos detalhes”, diz Zeina.

Entre os líderes das pesquisas, Jair Bolsonaro (PSL), Ciro Gomes (PDT) e Geraldo Alckmin (PSDB) afirmam –ainda que com propostas diferentes– que irão eliminar o déficit fiscal em um ou dois anos , prazo considerado pouco factível já que muitas das medidas dependem de mudanças na lei e amplo apoio político.

O programa do PT de Fernando Haddad é vago ao reconhecer a existência do problema fiscal, e propor –sem maiores detalhes– um novo modelo para garantir o equilíbrio das contas públicas e retomar o crescimento.

Especialistas acreditam que a forte polarização política que marca a campanha pode estar impedindo que as propostas avancem além do debate genérico. Mas ressaltam que o início do próximo do governo –seja quem for o eleito– precisará ser marcado pelo anúncio rápido de medidas reformistas.

“Não existem milagres em economia. É uma fantasia achar que você vai conseguir manter a inflação baixa sem sinalizar com clareza como vai tratar a tendência explosiva da dívida pública”, diz Otaviano Canuto, diretor-executivo do Banco Mundial.

Para o economista, o setor privado não elevará os investimentos no Brasil se não houver a apresentação de um ajuste fiscal detalhado e crível. “Nosso potencial de crescimento no futuro imediato é reduzido pela anemia da produtividade”, afirma Canuto.

Desde a década de 1980, a eficiência da economia brasileira cresce a um ritmo pífio. Segundo dados da organização The Conference Board, a produtividade do trabalho no país ficou praticamente estagnada nos últimos 40 anos. Nesse período, o indicador cresceu em média 2% ao ano no Chile, 4% na Coreia e 1% na Austrália.

“Os países que saíram do nível de renda média e se tornaram ricos foram os que reduziram o hiato de produtividade com os Estados Unidos, que é, em média, o país mais produtivo”, diz o economista José Alexandre Scheinkman, da Universidade Columbia.

Parte da receita desse processo de convergência nem entrou para valer no debate eleitoral. Ela passaria, segundo especialistas, por uma maior abertura comercial e a adoção de medidas para recuperar a defasada infraestrutura, sofisticar a pauta de exportações e estimular a inovação.

A ausência dessa agenda local é simbolicamente ilustrada pela baixa presença brasileira em reuniões internacionais como a que acaba de ocorrer na China, o Encontro Anual dos Novos Campeões.

“Por mais relevante que seja a questão fiscal, quando acompanhamos os debates em fóruns como esse, fica claro que estamos discutindo, ainda muito mal, a agenda do passado”, diz Jorge Arbache, secretário de relações internacionais do Ministério do Planejamento e único palestrante brasileiro no recente do Fórum Econômico Mundial.

“Vivemos numa economia global de altíssima interdependência, mais complexa do que em qualquer outra era. O sucesso depende da combinação entre políticas públicas e privadas”, diz Arbache.