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Depois de oito anos sem disco e com três filhos, Alanis Morissette acertou as contas com os fãs que estavam ansiosos por material novo. “Such Pretty Forks In The Road”, oitavo disco de estúdio da cantora canadense, chegou em todos as plataformas digitais, na sexta-feira, 31 de julho. E o acerto de contas veio pesado.

O piano aparentemente descontraído de “Reasons I Drink”, single lançado ainda em dezembro de 2019, anunciava um álbum denso, com temas como o alcoolismo, depressão e crises existenciais, acompanhada de uma voz trovoando. Não com a raiva presente em “Jagged Little Pil”, álbum lançado há 25 anos que apresentou a cantora ao mundo, mas uma voz rasgada, pedindo socorro, que com certeza é a protagonista do novo disco. Aliás, que voz!

Em “Smiling”, faixa que abre o registro, Alanis põe o rock a prova e como diz o refrão: “Essa é a minha primeira levantada de bandeira branca”. Bandeira que segue hasteada, porém, muda de cor conforme as 11 faixas vão sendo ouvidas. “Smiling” foi escrita inicialmente para compor o musical “Jagged Little Pil”, que estreou na broadway em dezembro de 2019, com diversos artistas, mas que teve as apresentações interrompidas por conta da pandemia do coronavírus.

Alanis fala para os filhos e emociona pela sinceridade da letra em “Ablaze”. Essa música é muito linda, um amorzinho. “Minha missão é manter a luz dos seus olhos acesa”, diz a letra com violões e guitarras, que seguem em “Sandbox Love”, canção com uma pegada mais rápida, letra ácida e voz marcante. Somente pelas “esticadas” que a cantora dá nas palavras, no final das estrofes de “Sandbox”, já valeria a pena ouvir. São duas das melhores músicas do “Such…”. A esquecida “gaita de boca” caberia perfeitamente em uma dessas músicas. Ou nas duas.

Nunca te pedimos nada Alanis!
A gaita de boca é uma das marcas registradas da Alanis, que sumiu das composições depois do “Supposed Former Infatuation Junk” segundo álbum laçado em 1998 – que também mostra uma Alanis sombria – mas de outro aspecto e os fãs amam esse disco. Vale a pena ouvir.

Voltado ao “Such Pretty…”, Alanis já havia anunciado em entrevistas que teria forte influência do piano, o que de fato aconteceu. Na melancólica “Diagnosis”, o violino completa o pedido de socorro da cantora. Em “Reckoning” o piano é base para uma direta impiedosa. A construção dessa música é bem particular porque não parece ter um refrão. Ela vai descarregando a mágoa sem dó.

O piano continua em “Missing the miracle”, onde ela mostra o quanto é o oposto de alguém. “Você vê a colina e eu vejo o castelo. Nossa frente que estava unida está condenada”, canta no início. Nessa música em especial ela emite alguns agudos que amamos.

Já em “Losing the Plot”, ela escreve sobre as angústias em uma noite de insônia sempre acompanhada do piano. (Ela disse que teria muito piano, lembra?). Não conseguir dormir realmente nos faz perder a noção. Te entendemos Alanis. Alias, as duas canções parecem ter sido uma sobra de “Havoc in the bright lights”, antecessor de “Such Pretty…”, lançado em 2012.

“Her” é aquela música que merece um destaque porque é uma prece para ela mesma. Ao mesmo tempo temos a impressão que está se referindo a alguém próximo, como a filha ou até mesmo a mãe. Enfim, tem piano, e a voz, novamente a voz, mostra uma Alanis muito sincera. É uma das minhas preferidas, com certeza!

“Nêmesis” é tão insana que você chega a perder o fôlego. (Boatos que muita gente gostaria de mais loucuras como essa no disco). É uma briga constante com um inimigo que novamente parece ser ela mesmo. Só ouvindo pra crer. Assim como “Smiling”, “Nêmesis” deve render um final com Alanis quebrando o pescoço ou rodopiando no palco nas apresentações ao vivo. Que essa pandemia passe e esse comentário se concretize. Mesmo com Shows marcados para 2021, o Brasil não está na lista.

Alanis talvez tenha deixado “Pedestal” encerrar o disco porque é tão brilhante quanto a purpurina da capa do disco. É um desabafo que escancara tudo que você deveria saber sobre a Alanis, sobre você mesmo. Derruba todo mundo e ainda quebra o “Pedestal”. Em um momento ela solta uma voz rouca tão linda que não sei se alguém sobrevive a uma apresentação ao vivo depois desse disco. Quando a música termina fica aquela sensação de “Como assim acabou”? “Espero que você tenha gostado do passeio, quem não iria? Quem”? (Essas perguntas são tão “irônicas né”?

A esperança é a promessa de uma versão “Gold” do disco com três faixas bônus; “Rest”, “Legacy” e Predator com previsão de lançamento para 2021. Por enquanto se contentem com as lindas garfadas que encontramos na rua.